Domingo, sete e trinta. A cachorrinha me chama impaciente. Seu relógio biológico está dizendo que já passa da hora do passeio matinal. Putz! Ela só me concedeu trinta minutos de tolerância, e eu, que ainda não me adaptei ao novo horário, vou acumulando mais um pouco de sono e cansaço.
O tempo voa. Se quero tomar um banho de sol na maior comodidade, preciso andar depressa… ou deitar depressa, já que os raios atingiram o centro da minha cama nesta hora da manhã. Obviamente, o retângulo luminoso que entra pela janela aberta só cobre um terço do corpo, mas é o suficiente para ativar a vitamina “D”. Isso é bom, pois estou preservando as regiões que foram tão agredidas pelos raios ultravioletas em outros carnavais, quando não se tinha consciência dos riscos dos excessos.
Não gosto de banho frio, mas encaro uma ducha gelada para fechar os poros que, com este calor, abriram as comportas… E que continuam abertas…. O suor brota e escorre em filetes que vão se juntando nas baixadas e escorrendo ladeira abaixo. Uma tristeza, pois tem festa pela frente, há
meia hora daqui.
Passar pelo Vale dos Vinhedos é colírio para os olhos. Capela à vista! Aterrissamos no campo de futebol, minado de veículos. Da celebração religiosa, nem o cheiro das velas, mas o almoço é sagrado. Chegamos a tempo de disputar os prazeres da mesa entre mais de mil pessoas famintas.
O calor está infernal, aumentado pela aglomeração e pela sopa de capeletti, que se harmoniza com vinho. Ufa! O suor não se aquieta – meu guardanapo até se esfarelou na minha cara. Dou um tempo para a gastronomia e vou à área
vip: o toalete.
Ô… Ô… Manchas rubras e roxas no meu rosto? Estarei no fim do caminho? O que me assusta não é a cor vermelha. Sei que a deficiência da enzima ALDH2, associada ao álcool, intensifica o fluxo sanguíneo, causando um estrago na pele. Essa condição, que atinge 50% da população oriental, pode inclusive estimular o desenvolvimento de câncer da faringe. Bom, não sou de ascendência asiática, mas tenho os olhos meio puxadinhos… e fui premiada com essa reação. Nada demais. Me preocupa mesmo é a tonalidade arroxeada das bochechas, da testa e… Cruz Credo! Também das unhas! E esta dorzinha de cabeça só pode ser anúncio de… Me nego a falar!
Volto à mesa alarmada… Para piorar a situação, estou tendo alucinações: vejo todo mundo com manchas roxas. O suor, que me dera uma trégua, agora esguicha. Abro a bolsa e, por sorte, encontro um lencinho branco, que por ser tão pequenininho, fica logo encharcado e… roxinho. Alguém percebe meu drama e me passa mais um guardanapo roxo… Eu disse “roxo”?
Beleza! Não há como um pouco de anilina pra deixar a gente atordoada.