O valor difere apenas dois centavos da última safra, que era R$ 1,08. Viticultores passam por dificuldades para manter as atividades

Com boa expectativa para a safra, os produtores se preparam para vender o produto que cultivaram com esmero durante o ano. Entretanto, o preço definido pelo Governo Federal não satisfaz o viticultor. Pelo contrário, desanima até o mais dedicado profissional do campo.

Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bento Gonçalves (STR), Cedenir Postal, o preço é praticamente igual à safra 2019/20, R$ 1,08. “O que o governo fez foi uma vergonha, é um desrespeito com todos os agricultores. É uma falta de consideração, pois vai fazer com que o jovem abandone a atividade, que o produtor desista, porque essa definição do valor mínimo é uma afronta e um desrespeito com os agricultores”, lamenta.

Postal ainda acredita que a correção do preço é insignificante. “O custo de produção, em alguns casos, até dobrou de preço nos insumos, os adubos e defensivos. Na prática, não teve reajuste algum. É lamentável, fizemos todos os questionamentos, todas as ponderações, mas não teve argumento que fizesse com que mudassem isso”, pondera.

Além disso, não foi possível que o Sindicato partipasse das decisões tomadas durante o processo de definição do valor. “Esse ano anteciparam todas as reuniões, quando nós ficamos sabendo, já havia acontecido. Geralmente eles fazem no final de novembro, mas este ano, na metade de outubro já estava praticamente definido, em Brasília”, ressalta.

De acordo o presidente do Sindicato Rural da Serra Gaúcha (SRSG), Elson Schneider, é necessário ajustar o preço, pois há um contrapasso com realidade do campo. “Percebemos que é muito mais que os dois centavos. Existe um descompasso entre a indústria, governo e o viticultor. Isso traz uma insegurança muito grande para o setor”, afirma.

Valor cobrado não cobre custos com insumos

Schneider reitera ainda que a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) fez o preço de R$ 1,11, mas o governo, ainda assim, tabelou em R$ 1,10. “Existia uma pressão muito grande por parte da indústria, acredito eu. Acho que não se balizou em cima da inflação, porque nós, da viticultura, na nossa região, tivemos um insumo muito mais caro este ano”, garante.
Ele ainda acrescenta que “os produtos subiram em média 15%, o gasto dos insumos. Mas teve produtos que aumentaram muito mais, como o sulfato e outros que subiram de 50 a 70% e a mão de obra. Isso é um desaforo para o setor, para o viticultor. Esse um centavo a menos, sempre trato para todo mundo que é o do desaforo”, opina.

A cada ano, a definição é feita baseada apenas a partir de um levantamento dos custos variáveis, o que causa discordância. “Por exemplo, se eu arrendar a minha terra, isso é um custo fixo, de 10 a 20% e não é calculado no valor. É como uma empresa, por isso está totalmente equivocado esse custo de produção”, explica.

Em 2017, foi feito um levantamento, por meio da Confederação Nacional da Agricultura, que demonstrou que a uva com grau 13 deveria custar R$ 1,58. “É uma grande diferença que estamos enfrentando, o produtor está fazendo cálculo dos custos variáveis, que são o adubo, mão de obra, luz, água, combustível manutenção da máquina. Mas e a respeito do capital, os juros e os encargos sociais? Nada disso é levado em consideração no preço”, destaca.

Tendo em vista tais aspectos, Schneider salienta que há uma defasagem grande. “A gente tem que lutar para que isso mude. Além disso, trazer a liberdade de comercialização. Também é um processo, mas nesse momento não estamos em plenas condições, porque a indústria não dá o devido valor ao produtor”, pensa.

O sistema que faz um balanço do custo de produção, pode ser falho. “Já tem 40 anos e precisa ser modernizado. No passado, era mão de obra familiar, não existia carteira assinada, na sua maioria, não tinham encargos sociais, arrendamentos. Hoje, se tem um imposto muito alto”, finaliza.

Produtores estão desmotivados

O produtor Fabiano Orsato também não está satisfeito com o que foi definido. “É humilhante. Com todo os aumentos que teve nos adubos, mão de obra e diesel, dois centavos não compensam em nada. Não tem como continuarmos todos os investimentos que fazemos, pois são caros”, frisa.

O mínimo que deveria ser cobrado, segundo pensa Orsato, é R$ 1,15. “Não seria também o exato, mas o mínimo. Como produtor, me sinto desmotivado. Na verdade, eles não pensaram no lado do produtor. Se pararmos para ver, todas as empresas venderam todo o produto, estão com as cantinas secas. Acho que a Ministra não teve um olhar atencioso, com carinho, em quem está de sol a sol trabalhando. O produtor não quer ficar rico, ele quer ganhar o que é justo para poder viver e fazer os seus investimentos.”, aponta Orsato.