Fenômeno natural, La Niña, pode reduzir em até 75% o volume das chuvas, na Serra Gaúcha, principalmente entre novembro e dezembro

O chamado efeito La Niña já está começando a agir no Estado. Caracterizado por provocar redução no volume das chuvas, dependendo da intensidade, o fenômeno pode causar impactos na próxima safra. Por isso, agricultores da região, já estão em alerta com as previsões.

Para a Serra Gaúcha, a projeção é que a baixa nas precipitações ocorra principalmente entre os meses de novembro e dezembro, segundo o meteorologista da Secretaria de Agricultura do Rio Grande do Sul, Flávio Varone. “Para esses meses, temos diminuição maior dessa condição. Então, a situação realmente está mais prejudicial nesse período”, avalia.

Em condições climáticas normais, a média história de chuvas na região, referente ao período entre 1981 e 2010, para o mês de novembro, varia entre 150 a 180 milímetros de água. Já em dezembro, o esperado é entre 125 a 150 milímetros. Entretanto, devido ao fenômeno, a tendência é que esses números reduzam esse ano. “Em algumas regiões, a anomalia para novembro é abaixo dessa média, em torno da metade para esse mês. Para dezembro, em algumas áreas da Serra, pode diminuir em até 75% da média”, alerta.

Já para 2021, as expectativas são melhores. Nos meses iniciais do próximo ano, segundo Varone, o Estado não deve enfrentar grande estiagem. “Estamos trabalhando com a ideia de que a maior influência do La Niña realmente se dê nesses meses finais. Para janeiro e fevereiro, a Serra principalmente não deve ter problemas”, acredita.

Impactos para a uva

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bento Gonçalves, Cedenir Postal, afirma que se a estiagem começar agora, preocupa. “É uma época que precisa, não em excesso, mas necessita de chuva, sim”, admite.

Entretanto, Postal relembra que ano passado, quando a região também sofreu com a falta de água, a uva não foi impactada de forma negativa. “Em qualidade, até melhorou”, comenta.

O chefe do escritório da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) de Bento Gonçalves, Thompson Benhur Didoné, afirma que a uva precisa de água no início da brotação, período que já passou e no momento do desenvolvimento vegetativo, que está acontecendo agora.

Didoné destaca que se a redução da quantidade de água ocorrer em dezembro, pode ser até favorável para a fruta. “Um período de leve estiagem favorece a maturação, o teor do açúcar”, avalia.

Já o secretário do Desenvolvimento da Agricultura de Bento Gonçalves, Dorval Brandeli, define o atual quadro da fruta como de normalidade e até de otimismo. “Pela qualidade e exuberância desse período de brotação e floração da uva, estimando em quantidades, volumes acima da média histórica, pela entrada da produção de novos parreirais e pelo aumento da produtividade, pois até agora, não tem faltado umidade no solo”, assegura.

Dorval acrescenta que devido a diversos fatores, o uso de irrigação já é uma realidade. “Em função da variação climática, da capacidade econômica de alguns produtores, dos recursos de financiamento, dos fundos técnicos do bom momento pelo qual a uva passa, principalmente a de ‘mesa’ e de algumas frutas de caroço, pêssego e ameixa, já se encontram práticas de irrigação”, comenta.

O secretário afirma que Bento, em conformidade com dados da Emater e Instituto Brasileiro de Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), conta hoje, com mais de 32 hectares de uvas, 14 hectares de frutas de caroço e seis hectares de hortigranjeiros em sistema de irrigação, cujos resultados são promissores e em expansão”, destaca.

Preocupação com o pêssego

Em Pinto Bandeira, o maior receio é com o pêssego, que pela previsão deve ser mais impactado que as outras frutas. É que segundo o secretário de Agricultura do município, Tailor Rigor, algumas variedades do fruto já estão em fase de maturação.

Porém, ele afirma que em caso de estiagem, todas as culturas devem ser impactadas. Por lá, apenas 45 hectares possuem irrigação, de um total de 2.275 hectares plantados. “A plantação já sofreu uma seca no ano passado. As plantas não conseguiram armazenar 100% de reserva para este ano. Se ocorrer outra, a plantação vai sofrer ainda mais”, avalia.

Até 80% do pêssego é colhido entre os meses de novembro dezembro, segundo o chefe da Emater, Didoné. Ele também alerta que a maior preocupação é relacionada ao tamanho da fruta, que “se tiver algum prejuízo, será no calibre, que pode ser reduzido, mas ainda é prematuro para falar“, finaliza.

Produção de olerícolas

Responsáveis por abastecer feiras e mercados, as olerícolas não causam grandes receios, principalmente se a estiagem que atingir a Serra Gaúcha for considerada moderada. “A grande maioria é irrigada e os açudes estão cheios”, afirma Didoné.

La Niña, o que é?

Na tradução do espanhol para o português, La Niña significa ‘a menina’. O fenômeno é caracterizado pelo resfriamento anormal das águas superficiais do Oceano Pacífico Equatorial. “Isso muda a condição de circulação do ar na atmosfera. Ou seja, altera o regime de como as massas de ar circulam”, explica o meteorologista Flávio Varone.

Ainda de acordo com ele, os efeitos são variáveis. Em alguns locais, aumenta a quantidade de chuvas, enquanto em outros, como é o caso do Rio Grande do Sul, diminui, causando a chamada estiagem, ou seca, como popularmente é chamado.

No Brasil, o aumento de chuvas costuma ocorrer no norte e leste da Amazônia, causando enchentes na região. No Nordeste também é comum ocorrer aumento de precipitações. Já no sudeste e centro-oeste, os efeitos são variados e mais imprevisíveis, podendo ocorrer secas ou inundações.