A prática ilegal de rinhas de galo, denunciada por pelo menos duas oportunidades no Semanário nos últimos dois meses, vem preocupando as autoridades das áreas competentes. Entre as entidades que manifestam frequentemente sua posição sobre o tema é a Secretaria de Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul. As preocupações são diversas, e vão desde a legislação até o risco de transmissão de doenças e zoonoses que interferem diretamente na sanidade ambiental.

Entre as divisões que compõe o órgão, está o Programa Estadual de Sanidade Avícola, que regula as diversas ações de defesa sanitária no que diz respeito a aves. De acordo com a Médica Veterinária e Fiscal Estadual Agropecuária, Flávia Bornancini Borges Fortes, a Secretaria tem conhecimento destas atividades por meio de denúncias e realiza fiscalizações nos locais indicados em conjunto com a Polícia Civil, Brigada Militar, Secretaria de Meio Ambiente e demais entidades que possam estar relacionadas. “Muitas vezes somos demandados pela Polícia Civil para realizar laudos sobre aves existentes em propriedades suspeitas de possuir ou realizar rinhas. Nesse sentido, encontramos muitas aves com lesões sérias, cegas, com as esporas seccionadas, depenadas e em péssimo estado geral”, explica ela.

Sobre o que diz respeito à legislação, Flávia afirma que a secretaria tem informações de que a prática é ilegal nos países vizinhos também, como Uruguai e Argentina, sendo legalizada em somente um estado na Argentina. “Entendemos que tanto as aves que participam destes eventos quanto os locais onde ocorrem configuram alto risco sanitário, visto que reúnem centenas de animais das mais diferentes origens sem nenhum controle sanitário, colocando em risco a sanidade avícola de todo estado, especialmente em regiões de intensa atividade avícola, como a região da serra gaúcha”, destaca.

Por conta dessas questões, as aves utilizadas para rinhas não são consumidas, tendo em vista a grande carga de medicações que recebem devido às lesões ocorridas durante as brigas. As aves são sacrificadas por seus “proprietários” ou acabam morrendo em combate. “Obviamente, não é recomendável consumir a carne destas aves”, frisa. 

Transporte e manutenção dos animais

Mesmo sem que haja diretamente o consumo das carnes desses animais, o risco de doenças existe tanto para aves quanto para seres humanos, tendo em vista que muitas enfermidades que acometem aves também infectam humanos. “Podemos citar as salmonelas, pois as aves são hospedeiros naturais destes agentes e, mediante uma situação que lhe cause stress passam a excretar as bactérias nas suas fezes, sendo que muitas espécies de salmonelas infectam humanos podendo causar sérios quadros de infecções gastrintestinais”, alerta.

Outro exemplo citado pela fiscal é a gripe aviária. Embora não tenha registros desta doença no Brasil, a criação de aves ilegais, bem como a realização de rinhas se caracterizam como um ambiente propício para a disseminação e veiculação de uma doença como esta. “O vírus da gripe aviária possui uma capacidade muito grande de mutação, podendo se transformar em patogênico e matar milhares de aves em questão de horas. Da mesma forma, o vírus patogênico da gripe aviária pode afetar seres humanos e igualmente levar os pacientes à óbito devido a complicações respiratórias”, explica a especialista.


Além disso, o transporte e a manutenção dessa atividade, aliado ao deslocamento dos animais para diferentes cidades, pode eventualmente ampliar o problema e transmitir doenças para outros pontos do Estado. De acordo com ela, por ser uma atividade ilegal, muitos criadores nem sequer tem cadastros junto à secretaria de Agricultura, igualmente criando e transportando suas aves de forma irregular. “A atividade de rinha, por si só, causa imenso stress às aves, o que interfere na imunidade dos animais, diminuindo sua capacidade de responder aos agentes patogênicos, e podendo assim infectar-se com mais facilidade e ser fonte de infecção para outras aves”, explica.