O recorde histórico do valor nominal da moeda estadunidense, que chegou a atingir R$ 4,27 durante a semana, deve impactar antagonicamente setores que vão do turismo à indústria

Por três vezes consecutivas, entre a segunda-feira, 25, e a quarta-feira, 27, o valor nominal do dólar apresentou recordes históricos sucessivos, chegando a bater R$4,27, o maior valor registrado no Plano Real.
Embora, após o leilão extraordinário de venda de dólares promovido pelo Banco Central (BC), essa escalada tenha retrocedido do meio da semana em diante, chegando a R$4,21. Se comparado ao mesmo período do ano passado, a alta é de mais de 9%. Para se ter ideia, o mês de novembro de 2018, fechou com R$3,85.

Esse cenário tem influenciado de formas distintas os mais diversos setores econômicos de Bento Gonçalves, sendo visto com bons olhos, por exemplo, pelas grandes empresas exportadoras, e com preocupação para quem estava se programando para viajar ao exterior.

Os motivos para a alta

Movido essencialmente pela relação de oferta (entrada de moeda) e demanda (saída), as variações do dólar no mercado de câmbio são suscetíveis aos fatores internos e externos que impactam a economia brasileira. Dessa forma, conforme explica a coordenadora do curso de Ciências Econômicas da UCS, Jacqueline Maria Corá, a alta histórica do dólar registrada na semana pode ser explicada por um conjunto de fatores que vão desde a falta de investimentos estrangeiros no país, até a guerra comercial entre China e Estados Unidos. “No caso atual, a balança comercial estava registrando déficit, ou seja, aumento na saída de dólares para pagar as importações, mas o BC já corrigiu a situação. Temos também as incertezas em relação as negociações entre China e EUA que afetam as negociações internacionais e, por consequência, o mercado cambial”, explica.


Apontada por diferentes economistas como um dos motivos para a alta na semana, a fala do ministro da Economia, Paulo Guedes, na noite de segunda-feira, 25, em Washington, também é destacado pela economista da UCS. Guedes sugeriu que era “bom se acostumar com o câmbio mais alto e o juro mais baixo por um tempo”. A afirmação é vista com pessimismo pelos investidores. “A política monetária do país que vem reduzindo a taxa de juros básica (Selic 5% com tendência de baixa), deixa de ser atrativa aos investidores internacionais que, diante do cenário de incertezas da América Latina, acabam buscando países que oferecem menos risco para seus investimentos. Vale lembrar que quanto maior o risco, maior deverá ser o prêmio, nesse caso, a taxa de juros”, explica.

Ainda, segundo ela, embora a expectativa é de que o dólar recue um pouco, a situação, no geral, não de mudar tão logo. “Segundo alguns analistas, a expectativa é que chegue na casa dos R$4,10 – R$4,20. Mas pela indicação do Banco Central não teremos uma taxa de câmbio abaixo de R$ 4,00”, finaliza.

Impactos positivos e negativos

Setor Moveleiro: Responsável sozinho, por 53% de toda a exportação da Capital do Vinho, segundo o “Panorama Socioeconômico 2019”, o setor moveleiro é um dos poucos que pode ser beneficiado com a escalada da dólar. “Em um primeiro momento, é algo positivo para as empresas estruturadas, que trabalham com o mercado internacional. Para as exportações, esse câmbio é muito favorável, pois as empresas costumam fechar contratos fechados em valor específico em dólar, logo o resultado será mais vantajoso”, assinala o presidente da Associação das Indústrias de Móveis do Rio Grande do Sul (Movergs), Rogério Francio.


Ele destaca, porém, a importância das empresas menores estarem atentas a essas variações. “Tem que estar atento em ter o equilíbrio do que se está exportando e o que se vai importar, pois isso pode gerar impactos negativos”, aconselha.

Metalmecânico: Ainda bastante dependente de matéria-prima e maquinário estrangeiros, o sentimento do setor metalmecânico é de precaução, segundo o presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Bento Gonçalves, Juarez José Piva. Embora tenha sido o segundo setor com maior número de exportações, o metalmecânico foi o que mais importou, com cerca de 24% de todo os US$43 milhões importados na cidade. “Muitas matérias-primas são importadas e, com isso, o Custo Brasil vai ficar muito alto, principalmente para o mercado interno. Isso vai nos impossibilitar de fazer novos investimentos”, lamenta.

Ele assinala, ainda, a dependência do mercado nacional por máquinas estrangeiros. “Normalmente nosso maquinário não se iguala às dos Estados Unidos ou Europa, por falta de inovação e tecnologia”, conclui.

Turismo e outros: Para além do mundo corporativo, as consequências da alta do dólar já começam a ser sentidas, sobretudo, nas bombas de gasolina e nas passagens aéreas. Em consequência da elevação do combustível no mercado internacional, a Petrobras anunciou um aumento de 4% nas refinarias. Embora isso não signifique que os reajustes cheguem aos postos, uma vez que eles são livres para aplicar ou não o aumento, as bombas de Bento já registram R$0,16 a mais que no último mês.

Já no turismo, a percepção de precaução por parte da população, conforme afirma Sidriana Marina, da Bento Transportes. “No geral, as pessoas estão se segurando para ver se vai dar uma estabilizada no dólar e no euro. Estão buscando mais destinos no Brasil”, destaca. Da mesma forma, a compra da moeda também tem sido afetada. Na agência CTR, caiu em mais de 30% nas últimas duas semanas.