Preconceito contra pessoas com mais de 40 anos na hora de contratar se intensificou na pandemia. Especialista em Mercado da Longevidade aponta dados alarmantes e faz recomendações para empresas e profissionais

De acordo com dados da Pesquisa PNAD Contínua do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE) de março deste ano, em 2020 o desemprego entre os profissionais com mais de 40 anos superou os 7% pela primeira vez desde 2012. Stefan Ligocki, consultor e professor de marketing e vendas e especialista em Mercado da Longevidade, afirma que ainda existe muito preconceito em relação a esses profissionais. “Nos últimos 20 anos, as empresas têm passado por um processo de forte ‘juniorização’ dos times, reflexo de uma falsa crença de que somente os jovens seriam habilitados a lidar com as novas tecnologias e ferramentas que surgiram na era digital. Por conta disso, aos poucos quem tinha mais de 40 anos começou a ser substituído. Hoje há cerca de 400 mil desempregados nessa faixa etária no Brasil”, diz.

Com a pandemia, muitos profissionais com mais de 40 anos deixaram seus empregos e precisaram se reinventar. Com a tecnologia, muitas profissões estão desaparecendo e outras surgindo todos os anos. Para Ligocki, hoje em dia é raro encontrar profissionais maduros em posições de gerência. “Exatamente por conta da ‘juniorização’ das empresas que mencionei antes. Há outro fator para ser levado em conta: com o avanço da tecnologia, muitos profissionais estão repensando suas carreiras”, comenta.

Para isso, é preciso correr contra o tempo, estudar e estar atento às mudanças. “Muitas pessoas estão voltando para a universidade, mudando de área profissional ou abrindo negócios. Isso quer dizer que nem todo mundo que tem mais de 40, 50 ou 60 anos quer ‘ser chefe’ ou ‘ganhar super bem’. Esses são dois dos mitos mais comuns do mercado envolvendo profissionais maduros. Eles só querem trabalhar! O cargo ou a remuneração dessas pessoas dependerá do perfil do cargo, não exatamente da idade. Por conta disso, muitos profissionais sêniores também estão optando por abrir suas próprias empresas”, analisa.

Para Ligocki, essa tendência escancara o preconceito de idade, mas tem seu lado positivo. “Com muito conhecimento, experiência de vida e de carreira acumulados, profissionais com mais de 40 anos estão abrindo empresas com mais chances de sucesso. Um levantamento realizado em 2018 pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), organização que é uma das maiores referências em inovação do planeta, revelou que a maioria dos empreendedores que deram certo nos EUA começou seu negócio depois dos 40. Para chegar a essa conclusão que contraria a tese comum de que ‘empreendedores bem-sucedidos geralmente são jovens’, o MIT investigou dados de 2,7 milhões de pessoas que fundaram empresas entre os anos de 2007 e 2014”, relata.

Inclusão

Programas de diversidade e inclusão podem diminuir o etarismo ou ageísmo, como é chamada a discriminação contra pessoas por causa da idade. “Um levantamento recente do site Infojobs revelou que 70% dos profissionais com mais de 40 anos já sofreu com o preconceito de idade e por isso não conseguem se recolocar. É um dado realmente assustador, se considerarmos que a população brasileira está envelhecendo: segundo o IBGE, 50% da população brasileira já tem mais de 40 anos. Em 2040, 57% da população ativa do país terá 45 anos ou mais. Se a população está envelhecendo, como as empresas esperam preencher todas as suas posições dentro de alguns anos?”, relata.
Ligocki comenta que os programas estão focados em questões de raça, gênero, orientação sexual e PCDs, e esquecem das pessoas com mais idade. “É claro que esses temas são muito relevantes e essas ações são muito válidas, mas é importante lembrar que o etarismo pode atingir qualquer profissional, seja qual for sua raça, gênero, orientação sexual ou condição física”, lembra. “Foi exatamente essa falta de consciência sobre o problema que me levou a criar o projeto ‘Mais 40+’, de combate ao preconceito de idade e valorização do profissional sênior no LinkedIn. Toda semana recebo pelo menos um relato de etarismo por mensagem privada. Eu mesmo, antes de abrir a minha própria empresa em 2017, passei por duas situações de preconceito de idade em entrevistas de emprego”, afirma.

Preconceito sentido na pele

Cristina Salomão, 51 anos, consultora de vendas, tem vasta experiência na área comercial e relatou à equipe do Jornal Semanário já ter sofrido preconceito enquanto buscava emprego. “Fui chamada para uma entrevista em uma grande empresa, passei na primeira fase, inclusive a profissional do RH gostou muito de mim e da minha experiência, pois eu já sabia o que precisava ser feito. Me passaram para a segunda fase, e um gerente bem jovem conversou comigo numa boa, eu estava animada e ele também, até ele olhar no meu currículo e ver a minha idade. Com ar de espanto e desdém, perguntou: Mas com essa idade, você espera mais o que da vida e do futuro? Respondi que não estava morta e pretendia fazer muitas coisas, além de continuar estudando. Ali a conversa já não foi mais a mesma, vi que não ia dar em nada, por causa da minha idade. O salário é menor, mas hoje estou nas mãos das pequenas empresas, são essas que dão oportunidades”, relata.

Para gestores, Ligocki recomenda que busquem conhecimento sobre o assunto e criem ações concretas. “Com uma população mais velha como maioria nos próximos anos, em breve as empresas que não contarem com profissionais maduros em seus times não saberão nem como se relacionar com seus clientes, o que resultará em queda nas suas vendas. Isso não é só um problema de RH, é um problema de gestão empresarial”. Já para pessoas com mais de 40 anos, Ligocki diz que o mais importante é estar sempre bem informado. “Se mantenha sempre atualizado em relação às novas tecnologias e o conhecimento em geral. Leia, estude, faça cursos de curta duração. Tenha um perfil atualizado no LinkedIn e invista muito em networking. E se você está desempregado há mais de seis meses, avalie a possibilidade de empreender, de gerar a própria renda. Você pode vender produto, serviço, ou seja, seu conhecimento e experiência, atuando como consultor ou mentor de jovens profissionais, por exemplo. Entenda que CLT não é a única forma de atuar no mercado atualmente”, finaliza.