Então descemos pelo cano da bota até chegarmos próximo ao pé, lá onde fica a cidade que viveu uma das maiores tragédias da sua história: Pompeia. Não sem alguns contratempos… Estávamos num trem que anda a 300 km por hora e que serve lanchinho, suco de laranja vermelha – uma delícia -, mas, por alguma razão que nem Freud explica, saltamos em Pistoia. E Pistoia, por maior que fosse o vínculo com o Brasil (lá foram enterrados os soldados brasileiros da FEB), não era o nosso destino. Assim nos obrigamos a pegar (e pagar) outro trem, agora de segunda, abarrotado de gente, onde ficamos o tempo todo de pé e de olho em nossa bagagem. Suei para não repetir o evento de alguns anos atrás, quando fraturei várias costelas num ônibus urbano daqui.

Além dessa problemática, havia outra: um grupinho de mal-encarados falava assustadoramente alto e repetidamente ao celular, numa língua totalmente estranha. Calejada pelo cotidiano brasileiro, logo sintonizei na estação deles: planejando nos assaltar, contatavam os comparsas em alto e bom som.

Mantivemos-nos em permanente estado de alerta. Na parada de Pompeia Scavi, nos jogamos para fora tão rápido com nossas malas e nossos medos que despistamos os malandros.

De imediato, captei uma onda de energia meio sufocante envolvendo a região. E no passeio noturno pela cidade, senti estar sendo observada. No dia, seguinte, a sensação continuava… A razão me dizia: “É óbvio! São quilômetros de história soterrada por 1.700 anos, que, agora (desde 1.748), se escancara, liberando sua dor e seus corpos petrificados”. Mas o coração retrucava: “Há algo mais sinistro, ameaçador, um olho gigante espionando tudo…”

E havia. Era ele, o terrível, o gigantesco, o devastador Vesúvio, aquele que cobriu de chamas, cinzas e gases a região de Pompeia e Herculano em 79 dC. Mas como não sou de fugir da raia, encarei o dissimulado e o escalei através da passarela em espiral que dá direto na sua bocarra, lá perto das nuvens… Mil e cem metros de subida… com paradas regulares a cada dez metros.

Confirmadas as minhas suspeitas. Ao lado direito de quem chega até a cratera, continua saindo uma fumacinha desafiadora, provando que o monstro está vivo. Ele apenas dorme, mas pode acordar a qualquer momento…

Admirávamos, estarrecidos, a imensa paisagem que se descortinava, feita de vales e montanhas cinzentas, onde o verde ainda não conseguira romper a camada de lava, quando uma neblina espessa começou a nos cercar. Dizem que descer todos os santos ajudam, e é verdade! Logo estávamos ao pé do monte. Não via a hora de picar a mula.

Naquele mesmo dia, pegamos um táxi até Nápoli e depois um trem – aquele dos sonhos, que anda a 300km por hora, que serve lanchinho, suco de laranja vermelha, etecetera e tal, direto para Veneza.

“O, Venezia, Che Sei La Più Bella!”

“… il grande sogno che si acorda più”.