Assim como a Covid-19,  o novo agente infeccioso também é da família dos coronavírus

Recentemente, pesquisadores chineses identificaram um novo vírus, o HKU5-CoV-2, presente em morcegos na região central da China. Por enquanto, o risco é apenas potencial, pois até o momento está restrito aos morcegos, mas não pode ser ignorado. O HKU5-CoV-2 utiliza o mesmo receptor celular do SARS-CoV-2, o que significa que, em teoria, ele tem a capacidade de infectar células humanas da mesma maneira.

O vírus SARS-CoV-2, causador da Covid-19, também surgiu através de morcegos, passando para um hospedeiro intermediário antes de atingir os humanos. Por isso, a fiscalização nos mercados chineses foi intensificada, e o novo patógeno está sendo acompanhado de perto.

 Fernando Spilki, virologista da Universidade Feevale e coordenador da Rede Corona-Ômica do MCTI

O virologista da Universidade Feevale e coordenador da Rede Corona-Ômica do MCTI, Fernando Spilki, explica que a passagem desses vírus na natureza, de espécie a espécie, ocorre pelo contato próximo, seja por secreções ou pelas próprias vias aéreas. A infecção pode passar para os humanos da mesma forma: pelo contato com esses animais ou pelo consumo deles no preparo de alimentos.

A infecção ocorre através da ligação celular, por meio de um receptor presente nos mamíferos. “A ligação ocorre através do receptor celular ACE2, importante para os seres humanos, que tem a função de regulação da pressão sanguínea e arterial. Por isso, na Covid-19, vemos tantos distúrbios circulatórios, justamente porque o receptor que o vírus usa para entrar na célula, e que é o mesmo do novo vírus, é o regulador da pressão arterial”, explica Spilki.

O HKU5-CoV-2 não é uma variante do coronavírus que causou a pandemia de 2020, mas um vírus distinto. Dessa forma, no caso de uma infecção em humanos, seria necessária uma nova vacina.

O virologista explica que essa nova descoberta aponta justamente o que é necessário para prever novas pandemias: monitorar frequentemente a fauna silvestre em busca de vírus que tenham potencial para infectar o ser humano. “Antes disso, precisamos, sem dúvidas, proteger as espécies em seu habitat, permitindo que elas tenham uma resposta adequada para controlar os agentes que circulam entre elas. Então, a preservação dos ecossistemas é muito importante”, aponta Spilki.

Com o monitoramento dessas espécies, é possível passar a estudar esses agentes, buscando a elaboração de possíveis vacinas e ferramentas de diagnóstico adequadas, para que, em uma eventual introdução em humanos, seja possível atuar rapidamente. “Então, essa descoberta é uma boa notícia, porque significa que estamos monitorando e tomando essas medidas mais necessárias. Mas, claro, a questão da conservação ambiental e um uso mais responsável dos recursos do planeta seriam muito importantes”, acrescenta o virologista.

Spilki explica ainda que um grande legado da Covid-19 é a possibilidade de testar diferentes plataformas vacinais para a geração de vacinas de forma rápida e bem-sucedida. Com a pesquisa desses patógenos e o conhecimento vacinal que temos hoje, é possível antever problemas e gerar soluções de forma mais rápida.

O risco potencial de infecção em humanos desse novo patógeno precisa ainda ser mais profundamente analisado, segundo o virologista, primeiramente em um modelo animal. Devido à similaridade com o SARS-CoV-2, é possível teorizar que ele teria potencial infeccioso, mas ainda precisa ser melhor estudado.

Há duas implicações nessa nova descoberta. Pelo lado positivo, há um monitoramento ativo das espécies e seus patógenos, e este não é o primeiro vírus — há muitos vírus emergentes, principalmente em ambientes naturais muito afetados por impactos ambientais. “Então, o lado bom é que o nosso monitoramento está fazendo sentido e podemos nos prevenir de maneira mais adequada”, afirma o virologista.

Por outro lado, é preocupante, porque, à medida que ampliamos o monitoramento, encontramos mais vírus, devido aos impactos ambientais que as espécies estão sofrendo. “Elas não conseguem mais ter uma resposta imune adequada, sua capacidade de manter suas espécies nutridas, com acasalamento adequado e diversidade genética preservada, está diminuindo. Então, a gente vai vendo que os vírus estão lá, presentes, ganhando atividade e sendo transmitidos para as espécies impactadas. E isso também é um alerta, que sempre estamos muito expostos neste planeta em mudanças que temos no século XXI”, finaliza Spilki.