Considerados essenciais no cotidiano, porém, nem sempre valorizados como deveriam. Esse é um dos motivos pelo qual, há mais de nove décadas, o dia 22 de julho é marcado no mundo inteiro, como o Dia Internacional do Trabalhador Doméstico.

Quem bem sabe o valor desse trabalho e da importância de ter uma data como forma de homenagem, é a Raquel de Melo Severo, 43 anos. Por necessidade e porque a mãe já trabalhava como doméstica, decidiu tentar a profissão. Começou nova, aos 18 anos e pegou gosto.

Quando fala do que faz, demonstra alegria e satisfação. Tanto que, quando questionada sobre o lado negativo do trabalho, diz que é difícil encontrar algum. Raquel até já tentou trabalhar em outras áreas, mas voltou a fazer o que realmente gosta. “Trabalhei em uma lavanderia, mas voltei para a limpeza, porque não tem nada melhor”, afirma.

Raquel trabalha como doméstica desde os 18 anos

Dentre os motivos que fazem com que ela tenha tanto gosto pelo trabalho, o principal é a mudança constante de rotina. “Todos os dias estou mudando de cenário e de pessoas. Hoje estou em uma casa, que é decorada de um jeito, depois vou para outra, de outro. Tem pessoas que gostam do serviço de uma forma e outras gostam de outro.  Então, se torna divertido e bom”, alega.

Diariamente: aqui e ali

Antes da pandemia do coronavírus, Raquel admite que o dia a dia dela era bastante puxado. Durante a semana, trabalhava em duas casas, quase todos os dias: uma no turno da manhã e outra na parte da tarde. Com isso, muitas vezes, trabalhava mais de oito horas/dia. “Agora, dependo dos dias em que as pessoas me ligam e pedem o serviço”, acrescenta.

Embora esteja sentindo a redução de trabalho, Raquel conta que também foi preciso adaptação por parte dela e dos clientes. “Tem famílias que trabalham de casa ou tem crianças, então a gente combina dias e horários em que eles tiram os filhos de casa, vão para outro local, para não ter exposição e risco, para eles e para mim”, afirma.

Consciente, Raquel assume que nesse período os cuidados estão sendo dobrados. “Meus clientes têm que ter confiança de que estou me cuidando, assim como eu tenho que ter essa garantia de que eles também estão. É um risco grande para todos, por isso diminuiu o serviço”, aponta.

Sobre a data, comemorada hoje, Raquel afirma que é uma boa lembrança para todos que trabalham na área. “É uma data que parece não fazer muita diferença, mas para quem é lembrado faz sim”, afirma.

Raquel afirma que se sente valorizada como profissional pelos clientes para os quais trabalha. “Creio que eles também se sentem preenchidos com meu trabalho. Estou sempre tentando renovar, perguntando se tenho que melhorar em algo. Se faço algo de errado tento corrigir para não deixar ninguém mal”, afirma.

Além disso, ela também gosta de ajudar quem está começando e quando pode, ensina dando dicas. “Acho que devo ter muitas amigas por isso: quero ensinar todo mundo. Se eu puder, ajudo”, afirma.

Mais direitos garantidos

No Brasil, até o final de 2019, o trabalho doméstico chegou a ser exercido por 6,3 milhões de pessoas. Os dados são da Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, que revela também que o número foi superior ao de 2018, quando os postos de trabalho da categoria eram de 6,2 milhões.

Outra pesquisa, da Oxfam, aponta que a média salarial de quem têm registro em carteira é de R$1.269 por mês. Já para quem está trabalhando na informalidade, a remuneração mensal fica na faixa de R$755.

Para ampliar e garantir que a categoria tenha os direitos assegurados, em 2015 passou a vigorar a chamada “PEC das Domésticas”. O Advogado, Guilherme Schramm, afirma que essa Lei Complementar, de nº 150/2015, foi um marco histórico. “Estabeleceu para os empregados domésticos os mesmos direitos dos demais empregados”, afirma.

O advogado menciona quais foram os principais direitos conquistados: “recolhimento do FGTS, que se tornou obrigatório pelos empregadores, seguro-desemprego, seguro contra acidente de trabalho e indenização em casos de dispensa sem justa causa. Ainda, importante citar a jornada de trabalho de 44h semanais, além do pagamento de horas extras”, frisa.

De acordo com Schramm, o cenário anterior à PEC era de trabalhadores ausentes de direitos trabalhistas. “Sem previsão de jornada de trabalho, intervalo intrajornadas e interjornadas, férias, 13º salário, FGTS, horas extras. Sendo que essas, dentre outras conquistas, passaram a fazer parte do vocabulário destes trabalhadores”, destaca.

É obrigatório assinar carteira?

Schramm explica que, com base no artigo 1º da Lei Complementar n°150/2015, entende-se por empregado doméstico aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de dois dias por semana. “Preenchido os requisitos mencionados, os patrões têm obrigação legal de registrar seus empregados desde o primeiro dia de trabalho”, esclarece.

Quando não há registro na carteira, o advogado deixa uma sugestão. “Que o empregador possa providenciar um contrato de trabalho e que, seja assinado por ambas as partes, no primeiro dia de trabalho. Isso porque, este documento é aconselhável para que fique tudo às claras entre empregador e empregado no momento da admissão”, aconselha.

Schramm acredita que para quem está inserido nesse meio, ainda falta muito para a Lei se fazer cumprir integralmente. “A educação é uma alternativa positiva e necessária para instalar o apreço desta profissão na sociedade”, conclui.