Em 2018, 1475 boletins de ocorrência foram abertos na Delegacia de Atendimento à Mulher de Bento Gonçalves e 1067 inquéritos foram instaurados

Em um período de menos de uma hora, na manhã de quinta-feira, dia 4 de abril, o movimento e o número de cadeiras ocupadas na sala de recepção da Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam) de Bento Gonçalves, dão contornos ao trabalho diário prestado pela Deam, e também a realidade da violência doméstica em nossa cidade. Ao todo, foram pelo menos quatro atendimentos, entre eles uma abertura de ocorrência de uma senhora contra seu ex-marido por perseguição, e uma discussão entre outra mulher e seu ex-companheiro, encaminhada à outra delegacia.

Basta uma pesquisa rápida para encontrar uma dezena de casos de agressões apenas no último mês, em diferentes pontos da cidade. O que chega a imprensa, no entanto, conforme mostram os números da Deam, é apenas uma pequena amostra dos casos. Segundo a delegada titular, Deise Salton Brancher, somente em 2018, foram registrados 1475 boletins de ocorrência, um aumento de 5% em relação a 2017. Da mesma forma, o número de inquéritos policiais abertos também aumentou: foram 1067, 10% a mais que no ano anterior.

Outro número que chama a atenção é o de 58 prisões realizadas pela equipe da Deam, que segundo Deise conta apenas com dois policias. “Essas pessoas foram presas em flagrante ou de forma preventiva, as prisões por condenação dizem respeito ao Judiciário. Então, esse número de prisões feitas por nós é bem alto, ainda mais com o efetivo que contamos”, assinala.

O baixo número de policias, segundo ela, também é um desafio para a conclusão dos inquéritos. Conta, porém, que em quatro anos, o número de processos parados diminuiu pela metade. Hoje, em torno de 700 seguem em passivo. “Um inquérito deveria demorar 30 dias se o réu não está preso e 10 se ele estiver preso. Os presos são prioridade e encaminhamos dentro desse tempo, mas quanto aos outros ,não conseguimos respeitar o prazo, não temos condições e estrutura para isso”, pondera. Deise espera que algum dos novos agentes em processo de formação possa ser encaminhado para a Deam. Em 2018, 1206 inquéritos foram concluídos e encaminhados ao Fórum.

Taxa de tentativas de feminicídio e agressões graves preocupa

Ainda na primeira semana de 2019, Garibaldi virou notícia nacional. A cidade foi a primeira no Rio Grande do Sul a registrar um caso de feminicídio no ano. Jocelaine de Paula Netos, 45 anos, foi atingida três vezes com golpes no tórax e no pescoço por seu companheiro, Geraldo Mariani, 56 anos, após uma discussão na casa onde o casal vivia. No último fim de semana, outro caso chocou a região: Daniela de Freitas Masagão, de 38 anos, foi morta a facadas pelo marido, na frente dos filhos do casal, de 7 e 15 anos.

Em Bento Gonçalves, embora ainda não exista nenhum caso registrado neste ano, já ocorreram duas tentativas. Em 2018, a cidade teve um caso de feminicídio duplo e uma tentativa. “Muitos homens ainda pensam ter poder sobre a mulher e estão acostumados a determinar o que suas companheiras podem ou não fazer. É só ver o número de ocorrências”, exclama Deise.

Vivemos em uma região patriarcal, onde o preconceito de gênero é acentuado. […] Felizmente não temos nenhum femenicídio consumado em Bento. Mas quantas mulheres escaparam por pouco? Quantas mulheres foram agredidas? São mais de 1.400 boletins de ocorrência

Segundo a delegada, embora a quantidade de boletins registrados e inquéritos abertos e finalizados seja preocupante, os números também podem ser lidos de modo positivo. Ela assinala que é um indício de que as mulheres estão cada vez mais seguras em denunciar os parceiros. “Para a mulher é um movimento enorme vir até aqui, e acreditamos que muito disso é fruto do trabalho preventivo que a Deam e o Revivi (Centro de Referência da Mulher que Vivencia Violência) fazem na cidade. A ideia é que ela venha registrar, que comunique o fato o quanto antes, para que, assim, não faça parte das estatísticas do feminicídio e de lesões mais graves”, finaliza.