Viagem de ônibus pode ser tranquila, tediosa ou tumultuada. Esta, excepcionalmente, foi muito engraçada.

As duas mulheres trocavam impressões, receitas e confidências como se fossem velhas amigas. E não eram nem velhas, nem amigas. Apenas pessoas experientes e bem falantes. Isso deve ter mexido com a curiosidade do menininho de três a quatro anos, sentado logo à frente, que não demorou a debruçar-se nas costas da própria poltrona e iniciar um papo cabeça:

– Como é teu nome? E o teu? – perguntou às duas.

Depois de conferir se os nomes eram bonitos ou feios e se fechavam com as características físicas, o pentelhinho ostentou um “troféu”:

– Eu tenho um RA-TO! – disse cantarolando.

– É mesmo? Olha só a coincidência: eu também TE-NHO! – respondeu uma delas no mesmo tom, enfiando a mão na bolsa.

Os dois ratinhos ficaram no ar… por um instante. Assim que o menino descobriu que se tratava de um ratão peludo e com rodinhas, girou a mão e… “zás”, ao mesmo tempo em que deixava cair o ratinho no colo da mulher. E virou pra frente, sinalizando o fim do papo.

– “Cudíune”, comprei ele pro meu gato – resmungou a dona, que não estava a fim de trocar o brinquedo. Afinal, rato que não corre não atrai gato, especialmente o seu Lalau, que é danado como ele só.

Num momento em que o garotinho virou pra trás, a mulher exibiu um sorriso amarelo e disse:

– Olha, quando a gente chegar em Farroupilha, a gente troca, tá?!

Mais do que depressa, o baixinho sentou fundo no assento. Não por muito tempo – criança sadia parece que tem o bicho carpinteiro. E, ao erguer-se pela milionésima vez, o dentucinho abriu a guarda, afrouxou a vigilância, deixando o rato de rodas desguarnecido. Mais do que depressa, a “amiga” da dona, agora cúmplice, apanhou-o, com a desculpa de averiguar se ele tinha dentes. Em seguida, enfiou-o na bolsa da outra. E esta devolveu o ratinho pelado para o pequeno, que, num gesto de raiva, jogou-o para a frente. O bichinho caiu sobre uma passageira distraída, que deu um pulo e um grito de pavor, atraindo todos os olhares do ônibus.

O menino, amuado, não mostrou mais o ar da graça até o fim da viagem. Ao levantar-se para sair, de mão dada com o jovem pai, ele anunciou:

– Eu vou ganhar um rato peludo com roda…

Andou alguns metros e, já no primeiro degrau do ônibus, gritou para a dupla:

– PRE-TO!

E saiu vingado.