No início de 2020, a cidade contabilizava 691 famílias com baixa renda cadastradas no sistema da prefeitura. A maioria emigra do Haiti e Venezuela

Desde a chegada dos primeiros haitianos, senegaleses e, por último, os venezuelanos, já são 984, só em Bento Gonçalves – aqueles cadastrados em serviços sociais da cidade –, correspondendo a quase 1% da população. A quantidade é a maior dos últimos cinco anos, perdendo apenas para 2017 – ano de publicação da nova Lei de Migrações no Brasil, que garantiu a eles mais direitos –, quando registrou 921 estrangeiros

Entre as origens predominantes, as famílias emigram do Haiti (855), Venezuela (87), Paraguai (9), República Dominicana (8), Cuba (8) e outras 17 pessoas nascidas na Argentina, Uruguai, Peru, Guiana Francesa, Honduras, Guiné, Senegal, Tunísia e Itália. A Secretaria de Esportes e Desenvolvimento Social (Sedes) sublinha que em relação aos imigrantes da República do Haiti, o número é ainda maior, considerando que os descendentes já nascidos em território nacional não estão identificados nesse total de 855.

Senegaleses alegam que vendas diminuíram na pandemia. Foto: Franciele Zanon

Ainda segundo a Sedes, o número aumentou 42,4%, desde o início de 2020, quando eram 691 imigrantes. “Trabalhamos com indicadores oficiais do Cadastro Único para Programas Sociais, que correspondem ao público-alvo de atendimento da assistência social. Esses referem-se ao cadastramento de famílias de baixa renda, quais sejam, famílias com ganho mensal até três salários mínimos ou familiar per capita de até 1/2 salário mínimo”, esclarece o secretário Wagner Dalla Valle.

Durante a pandemia, as dificuldades apareceram ainda mais. Muitas pessoas perderam emprego e deixaram de ter um provento que suprisse as necessidades familiares. De março até agora, a Secretaria concedeu um total de 6.434 cestas básicas. Dessas, 549 foram destinadas às famílias de imigrantes. Dalla Valle salienta que “nos últimos meses, a demanda por esse benefício aumentou consideravelmente, devido à pandemia. O mês de abril foi o de maior procura”, pontua.

A fim de minimizar as consequências, a Secretaria atua “com um forte trabalho de orientação, encaminhamentos e concessão do benefício eventual – cesta de alimentos. Em um contexto geral, a pandemia tem afetado toda população menos favorecida, incluindo os imigrantes que residem no nosso município”, finaliza o gestor.

Desafios da pandemia

O pastor Gerald Destina está em Bento Gonçalves há seis anos, e há quatro sua família também saiu do Haiti para recomeçar a vida. A pandemia acabou afetando seu emprego. Pedreiro em uma empresa de construção, conta que “a direção precisou mandar pessoas embora e fui uma delas. Abri o seguro desemprego”, relata.

Destina relembra que após quatro meses na cidade, já encontrou emprego e abriu uma igreja, de denominação Assembleia de Deus para a Comunidade Haitiana. “Não havia igreja aqui. No Haiti costumávamos servir a Deus e Ele falou no meu coração. Hoje, somos em cerca de 250 haitianos membros na igreja”, sublinha. “Gostamos de morar aqui, não tem como sair mais do Brasil, estamos criando raízes”, valoriza.

O senegalês Baidu, 32 anos, mora há quatro anos na cidade. Vendedor, diz que as vendas estão fracas e, com a pandemia, caíram mais ainda. “O que ganho, envio para minha família e pago o aluguel da casa onde moro aqui”, conta e acrescenta que as pessoas têm muito preconceito com o estrangeiro.

Já o haitiano Anel Jean, 34, está com a esposa Amal Can, 24, há quatro anos em Bento. Foi na cidade que nasceu o pequeno filho deles. Jean relata que trabalha como gari e que não tem do que se queixar. “Está tudo perfeito, tudo muito bom. Não tivemos dificuldades ao chegar aqui e nem para conseguir emprego”, expõe.

A empresa terceirizada de coleta de resíduos RN Freitas é uma das que empregam imigrantes. São 22 haitianos de um total de 80 funcionários. Segundo o gerente Everton Fraga, há ainda 30 esperando por uma vaga de emprego. “São pessoas muito boas, educadas, nunca se atrasam e estão sempre de bom humor. Quando contratamos eles, foi um alívio, pois muitos funcionários brasileiros não tinham tanto compromisso com o trabalho, devido ao grande índice de emprego no município. Começamos a contratar haitianos e deu certo. Estamos muito contentes com nossos funcionários. Sou muito grato a Deus por ter colocado eles em nossa empresa. Um povo sofrido, que aos poucos estão se recuperando. A gente conversa com eles e são muitos gratos a empresa, cidade e Brasil por acolher eles”, reconhece Fraga.

Foto capa: Franciele Zanon