Mudanças climáticas dos últimos meses, como intensa chuva, falta de frio e dias de formação de geada, deixam produtores da localidade de Pinto Bandeira preocupados em como será a produção do próximo ano

A Linha Brasil fica localizada no interior de Pinto Bandeira, e é conhecida pelo seu trabalho com a agricultura principalmente por conta das plantações de uva e pêssego. Os residentes da localidade são, em sua maioria, produtores. Esses agricultores estão bastante ansiosos com as perspectivas da safra para o próximo ano, já que por conta das mudanças no clima, como a falta de frio, o excesso de chuvas e a formação de geadas, poderá vir com alguns prejuízos.

“Este ano está sendo complicado”

Daniele da Silva tem 31 anos, era moradora de Bento Gonçalves até se casar e se mudar para a colônia, algo que nunca imaginou antes fazer. “Quando cheguei na Linha Brasil, comecei a exercer a função de agricultora. Gosto de trabalhar com agricultura, fui aprendendo aos pouquinhos, e hoje em dia já sei bastante, peguei gosto pelo serviço”, relata.

Com os anos, foi se apaixonando pela localidade e descobriu ali seu lugar preferido. “A tranquilidade é muito boa, as pessoas são prestativas, me sinto segura e temos o contato da Brigada Militar para o que precisar. Para mim não tem nenhuma parte ruim. Quando vou à Bento visitar minha mãe, já fico com vontade de ir embora, é muito barulho e sinto falta do silêncio daqui, o que é engraçado, porque nunca me vi morando no campo e hoje não troco mais”, destaca.

As preocupações com a safra por conta da instabilidade do tempo vem assolando muitos moradores, Daniela também já notou diferença nas parreiras. “Este ano está complicado, não fez frio na hora certa e veio muita chuva. Na floração vamos ver os resultados deste clima, a parreira precisa de muito frio, e notamos a falta dele no desenvolvimento da fruta “, expõe.

Ivone Marini sempre trabalhou com agricultura, ofício que herdou do pai, tendo a Linha Brasil como sua morada durante toda a vida. Ela conta que gosta bastante da função, apesar de ser uma função que exige muito da força braçal e das condições do tempo. “A Linha Brasil é uma comunidade muita unida, de gente trabalhadora, todos pensam muito em trabalho, ao mesmo tempo que é um lugar tranquilo e um pouco afastado. A melhor parte tem sido a tranquilidade, e não sei por quanto tempo será mantida essa calmaria”, relata.

Ivone Marini percebe que em sua parreira há uvas com brotação precoce

la acredita que os resultados destas mudanças climáticas já estão aparecendo, e conta o que espera para a hora da colheita. “Uma safra menor em decorrer do clima, tivemos chuva de pedra, não houveram estragos, mas a gente enxerga as diferenças. A brotação da uva não está parelha, agora quando está mais comprida não se nota tanto, mas no início dava para ver. Isso acontece por conta do clima, não fez o frio que deveria fazer e acaba desregulando o ciclo da planta”, prevê.

Além dos consumidores finais que vão sentir o resultado no bolso, mais pessoas serão afetadas por estas condições. “O produtor vai sentir, porque vai ganhar menos e terá que investir mais. O clima realmente foi um problema, mas não temos como controlá-lo. Talvez algumas pessoas não estejam sentindo tanto quanto nós, porque depende até mesmo do lugar onde estão as plantações. Com certeza será uma safra com menos uvas, talvez até tenham mais qualidade, mas o produtor precisará salvar seus produtos”, aconselha.

Valdir Arcari também se preocupa com a safra deste ano. Ele nasceu e vive na Linha Brasil trabalhando com a agricultura, e claro, já passou por muitas fases difíceis com questões da safra, e afirma que este momento é um desses. “Está sendo ruim plantar e o tempo levar, é complicado trabalhar assim. Meus pêssegos estão fracos, não teve frio suficiente, deu uma geada que secou muitos galhos, não teve a floração que tinha que ter. A fruta por conta disso cai, não fica no pé, floresce, mas não tem nada na flor, e aí ficamos sem produção”, lamenta.

Valdir Arcari lamenta a instabilidade do clima, mas elogia o poder público de Pinto Bandeira

Apesar disso, ele fica feliz em ter suas terras em Pinto Bandeira, pois, segundo ele, além da comunidade ser companheira, a prefeitura também é. “É um lugar maravilhoso de morar, tranquilo, não tem problema algum, acho bom viver aqui. O poder público está sendo um grande parceiro nosso, a prefeitura nos empresta máquinas quando precisamos. Eles se preocupam com os produtores e isso nos da mais estímulo para seguirmos”, salienta.

“Um lugar bom de morar”

Aos 21 anos, Renata De Toni se casou e foi viver na localidade da Linha Brasil, e logo que chegou, se encantou por lá. Hoje, nutre um amor muito grande pela região e não mede os elogios. “É um lugar bom de morar, os vizinhos são bons, as amizades, me sinto segura aqui. E estou feliz como está, veio o asfalto recentemente. A vida mudou depois dele, tinha muita poeira, prejudicava muitos as colheitas perto da estrada. Nossa casa sempre cheia de poeira e principalmente para a nossa filha que tem asma fazia muito mal, ela está muito melhor desde então”, menciona.

Desde muito cedo começou a trabalhar com agricultura, e atualmente, planta pêssego e uva, já até trabalhou com caqui, mas achou que não valia a pena. “Planto uva e pêssego, trabalhei com plantação de caqui uma época, era muito pouquinho e não compensava. Desde jovem trabalho com agricultura, ela evoluiu muito, em termos de máquina. Naquela época era tudo muito braçal, hoje em dia as máquinas facilitam muito. Minha expectativa para a safra é mediana, nossas uvas não brotaram bem. Não fez frio suficiente, essas chuvas prejudicaram muito. Ela brotou no tempo certo, mas não brotou bem. Felizmente os pêssegos estão normais”, afirma.

O asfalto ainda não chegou na localidade toda, mas há previsão. Em alguns locais, ele já foi implementado e os moradores reconhecem a melhora. “O que faltava era o asfalto, e quando ele veio a vida facilitou. Porque antes, passavam os caminhões e era poeira demais. Fora isso, o lugar é tranquilo. Não consigo ver nada de ruim, nasci e me criei aqui, meu pai também e foi ele que me ensinou o que sei hoje”, cita o agricultor, Leonel Arcari.

Leonel Arcari nasceu e vive até hoje na localidade e conta que após a chegada do asfalto, sua vida mudou para melhor

Ele relembra o início de sua trajetória na roça, da dificuldade que existia em manejar as terras, situação que foi melhorando após a criação de tratores e máquinas que facilitavam o plantio, o cuidado e a colheita. “O desenvolvimento na agricultura foi muito bom para nós, e parece que a cada ano melhora. Antigamente, por exemplo, recolhíamos as uvas com caixas, agora quem faz a força são os tratores e não nós, facilitou muito”, esclarece.

Nota também que diferente de outras regiões, o interior de Pinto Bandeira consegue manter seus jovens na agricultura, uma preocupação que deixava muitos agricultores apreensivos. “Muitos jovens estão ficando, alguns vão para a cidade estudar, mas eles voltam depois. Sinto que aqui em Pinto Bandeira é onde os jovens mais tem permanecido, nossas terras são férteis e nosso povo é muito trabalhador, acredito que esses sejam os motivos”, enaltece.

Mudanças no decorrer dos anos

Olga Pegoraro se lembra de como era a Linha Brasil quando chegou. Na época, ela saiu de Pinto Bandeira, onde tinha o básico, se surpreendeu ao chegar na localidade e descobrir que sequer poderia tomar um banho quente. “Quando cheguei não tinha luz, não tinha água. Sofri muito na época, as meninas que encontrava para trabalhar comigo não ficavam, tinham medo. E acabava sozinha fazendo essas funções. Tínhamos que pegar água da gruta para tomar banho, lavar as roupas, limpar a casa, era uma seca enorme. Isso há uns 40 anos. Tínhamos que usar velas e eu tinha um rádio que funcionava quando queria”, lembra.

Apesar de ter sofrido na roça, ela gostava de seu trabalho. Olga também lembra quando amarrava as parreiras junto do marido, e percebe que este amor pelo interior foi repassado para as outras gerações. “Meu neto quer ficar na colônia, não quis estudar. Ele tem muito amor pelo lugar, acorda às 5 horas da manhã, pega o trator, chega na hora do almoço, e depois volta. Todos os amigos deles quiseram ficar no interior. É aquela história, é trabalhoso, mas dá um dinheirinho. Eles têm carro, podem passear, não é como se fosse na nossa época. Eles gostam do serviço, meu neto desde criança queria ficar na volta das plantações”, resume.

Mas muitas das dificuldades que enfrentava em sua época, são enfrentadas pelo neto também, já que não é possível controlar o clima. “Esse ano o tempo não trabalhou bem para nós. Toda essa chuva que está por vir ainda preocupa, mas felizmente aqui não tivemos chuva de pedra, o estrago seria maior se tivesse acontecido. Mas esperamos o melhor, e que ano que vem o tempo se estabilize um pouco mais”, sintetiza.

Teresa Francischini gosta da Linha Brasil, pois é onde vive há 80 anos, sempre trabalhando como agricultora. “Desde que me lembro sou agricultura, aprendi tudo com o meu pai.
Atualmente, quem assumiu as terras foi o meu filho. A localidade é muito boa, a comunidade é muito unida, aqui é calmo e seguro”, declara.

Entretanto, a falta do asfalto e a rota dos caminhões faz com que diariamente, muita poeira seja respirada por ela. “Falta asfalto aqui próximo de casa, tem muita poeira. A minha casa fica bem na beirada então imagina a sujeira que fica. Fora ela, a saúde também é muito prejudicada, o bom para nós seria que colocassem logo o asfalto nesta rua”, destaca.

Mas muitas das dificuldades que enfrentava em sua época, são enfrentadas pelo neto também, já que não é possível controlar o clima. “Esse ano o tempo não trabalhou bem para nós. Toda essa chuva que está por vir ainda preocupa, mas felizmente aqui não tivemos chuva de pedra, o estrago seria maior se tivesse acontecido. Mas esperamos o melhor, e que ano que vem o tempo se estabilize um pouco mais”, sintetiza.

“Os jovens vão permanecer cada vez mais”

Joseane Manara vive há quatro anos na Linha, se mudou de Guaporé após se casar com um agricultor que morava no local. Para ela, tudo era diferente no início, já que não era acostumada a viver no interior e enumera alguns defeitos que vem notado. “Me adaptei aqui na Linha, mas Pinto Bandeira apesar de ser pequena, é muito desenvolvida. Aqui é tranquilo e as pessoas são amigáveis. A parte ruim é que moramos na frente da estrada, e como não temos asfalto, entra muita poeira dentro da nossa casa, e também os caminhões passam muito rápido, às vezes temos medo de que aconteça um acidente”, alerta.
Ela nota que a juventude não tem demonstrado ir embora, muito pelo contrário. Além disso, entende os motivos deles quererem ficar, já que a remuneração para os jovens não é ruim. “Vejo a juventude ficando, e acho que vão ficar cada vez mais. O valor monetário vale a pena para eles, e fora a liberdade, já que é trabalhoso, mas tem mais rentabilidade. É difícil uma empresa pagar alguém tão novo o que a agricultura paga”, calcula.

Assim como todos, a preocupação com os resultados da produção na hora da colheita tem lhe deixado menos tranquila. Entretanto, ela acredita que poderia ter sido pior, e felizmente, a chuva de pedra não chegou até lá, portanto, não houveram grandes estragos. “Esperamos que seja uma safra boa, somos dependentes do tempo, então está nas mãos dele agora. É o que chamamos de empresa a céu aberto, é sempre uma surpresa, mas temos que ter fé. Felizmente nossas produções não vieram fora do tempo, está tudo no ciclo certo”, reconhece.

Rogério Marini trabalha nas propriedades que herdou da família, as quais já estão há mais de 150 anos passando de geração para geração. Por conta disso, Marini sempre viveu no interior da Pinto Bandeira e vê muitas qualidades na região. “A Linha Brasil, em um contexto geral, tem paisagens bonitas por toda a parte, são pessoas muito trabalhadoras e dispostas, então, são bons vizinhos e uma boa comunidade. Vejo que os jovens precisam de mais incentivo, senão eles vão procurar serviços em outros lugares”, realça.

Ele vê muitas mudanças em questão de maquinário que facilitam a produção, mas se preocupa com as mudanças que andam ocorrendo com o clima. “Acho que a agricultura está se desenvolvendo bem. Mas precisamos pensar no que vamos fazer com os fatores climáticos que estão sendo um problema. Não é culpa de ninguém, é natureza. Um ano é seca, outro ano é chuva, e anualmente, ocorre um porém climático”, frisa.

Assim como outros agricultores, ele não nega que está preocupado com os resultados das plantações, e acredita que não será igual ao do ano passado. “Estamos apreensivos com esta safra, pegamos chuva de pedra faz um mês e meio e foi bastante atingida a nossa plantação de pêssego. Fora que eles brotaram no mínimo 15 dias antes do esperado. Isso prejudica bastante a planta, lugares que não sofreram assim estão com a safra cheia, e nós sabemos dos riscos da nossa”, finaliza.

Escola Multisseriada

A Escola Municipal de Ensino Fundamental Emilio Meyer está localizada no pequeno Centro da Linha Brasil. A instituição existe desde 1946 e teve seu prédio ampliado em 1973. Atualmente, 15 crianças que frequentam o colégio que é multisseriado, ou seja, as salas de aula comportam alunos de mais de uma série. “Estamos sentindo um bom desenvolvimento de nossos estudantes. Depois de uma pandemia, que foi um período difícil, eles estão dando uma recuperada, e tendo mais avanços. O pós-pandemia não foi fácil, principalmente por conta da alfabetização e pela falta do pré que é fundamental para as crianças do primeiro ano”, expressa a Professora, Merielem Bettoni.

Apesar do educandário já ter 82 anos, a estrutura do colégio está sendo mantida através de melhorias. “É uma escola antiga, mas bem conservada, solicitamos as manutenções e elas são feitas. Estamos pintando agora o parquinho e os pais colaboram muito, eles vêm durante o sábado e ajudam, assim como a horta que eles participam”, declara a diretora da Escola, Serita Winck.

Além dos pais ajudarem nas reformas da escola, eles se fazem presentes como um todo durante a vida escolar das crianças. “A comunidade é muito presente, é só chamar que eles aparecem. Montamos um convite, mandamos e eles vem. Entrega de pareceres, reuniões, é só comunicar que eles aparecem e isso é muito importante, e não há exceções, todos são participativos”, ressalta a professora de turmas iniciais, Liana Marini.