“Toda mulher tem direito a ser livre de violência, tanto na esfera pública como na esfera privada”. A frase está escrita no artigo 3 do capítulo 2 da Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, datada de 1994. Infelizmente, na prática, não é isso que acontece.

Para tentar proteger e diminuir os casos, a Lei Maria da Penha foi criada em agosto de 2006. Agora, perto de completar 10 anos, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou o Projeto de Lei da Câmara (PLC 07/2016) que prevê alterações na Lei Maria da Penha. No entanto, as mudanças dividiram opiniões entre especialistas, juristas, advogados e integrantes de movimentos sociais.

O ponto de maior polêmica é o artigo 12-B, que dispõe sobre a autorização dos delegados de polícia a apreciar diretamente as medidas protetivas de caráter de urgência. Atualmente, a atribuição é exclusiva do poder judiciário. Hoje, o delegado tem até 48 horas para encaminhar a solicitação ao juiz que, por sua vez, também possui o mesmo prazo para dar o despacho. Para os defensores da medida, isso agiliza os procedimentos. Por outro lado, há quem conteste a legitimidade dos delegados e da efetividade prática da medida. A matéria deve ser votada no Senado ainda no mês de julho.

Pressa e falta de diálogo geram críticas

Um dos principais pontos de divergência apontados por movimentos sociais e pessoas engajadas na luta da violência contra a mulher é de que a medida foi mandada ao Senado sem a discussão necessária, de maneira apressada. Essa também é a opinião do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Gênero e Sexualidade (NEPGS) do Instituto Federal (IF) de Bento Gonçalves.

Segundo o núcleo, a polêmica ocorreu devido às circunstâncias em que foram propostas as alterações. “A Lei Maria da Penha foi construída com amplo debate com a população, e foram necessários anos para a consolidação, enquanto a PLC teve sua confecção em caráter fechado e de imposição verticalizada”, explica a coordenadora do núcleo, Janine Trevisan.

Na opinião do núcleo, os grupos que sempre estiveram à frente e preocupados com o bem estar das mulheres não tiveram voz no pensamento com relação às propostas de mudanças. “Há uma preocupação acerca da existência de uma preparação efetiva do sistema de justiça para lidar com a violência contra a mulher, uma vez que as próprias instituições estão calcadas dentro de uma égide machista, que muitas vezes, culpabiliza a vítima em vez do agressor”, alerta.

Juristas defendem ganho em agilidade

Já para a advogada e desembargadora aposentada, Maria Berenice Dias, que participou da elaboração da lei Maria da Penha, as mudanças propostas pelo Projeto de Lei são singelas, mas de grande eficácia. De acordo com ela, o prazo previsto pela lei atualmente nem sempre é suficiente para tirar a mulher de uma situação de risco. “Dependendo da intensidade das lesões ou ameaças, esse prazo não é efetivo. Muitos juízes sequer cumprem esse prazo”, denuncia.

Segundo a jurista, a demanda da violência domestica é muito superior em relação ao que a justiça está preparada pra atender. “Não são criadas varas especializadas no número em que se deveria, especialmente por falta de vontade política, e esse excesso de volume acaba retardando o andamento dos processos”, prossegue.

Um dos argumentos defendidos por aqueles que são contrários ao Projeto, o de inconstitucionalidade, é rebatido pela advogada, que não vê dessa forma. Segundo ela, a matéria é constitucional, e com legitimidade garantida para as forças policiais para executarem as medidas protetivas. “As mudanças são absolutamente positivas e só trazem vantagens”, resume.

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