Nunca gostei de dar carona a “ases do volante”. Muita pressão acaba inibindo meus reflexos que normalmente estão bem acordados.

Lembro como se fosse hoje de uma viagem em que tive que bancar a motorista de um Ayrton Senna das estradas (hoje, um Barrichello), num trajeto cheio de rótulas, “próteses” e pardais.

De sua “torre de comando”, ele me monitorava:
-Acelera. Pisa no freio… de leve… Assim tu come as pastilhas (Olha só se eu ia comer pastilhas naquela hora…). Solta. Vai. Não precisa mudar o câmbio… Tem motor (Como se eu não soubesse!). Olha o buraco! Eu não disse pra olhar o buraco? (Bom, eu olhei…).

-Fica à direita. Fim da terceira pista… Dá o sinal pra entrar. Cuidado! Pra que é que serve o espelho retrovisor?
“Pra gente se olhar de todos os ângulos”, pensei em dizer, mas nem deu tempo, porque veio outra ordem, depois contraordem, assim sucessivamente…

-Alivia o pé. Acelera. Faz a quinta. Solta. NÃO FREIA NA CURVA! Tu não sente o motor?
Eu sentia mesmo era a perna direita dormente.

-Motorista precisa ter sensibilidade! Trocar a marcha quando o motor estiver sofrendo…
Mais do que eu estava sofrendo? Impossível!

-Estende os braços… Relaxa…”

Com certeza, eu “relaxava”. O suor me embaçava os olhos, mas eu não ousava tirar as mãos da direção, muito menos estender os braços. Parecia que desaprendera tudo, apesar dos mais de trinta anos de motorista. Na época. E olha que meu currículo não era dos piores. Um só “guinchamento”, causado pela ausência da placa “Não estacione”; uma e outra cutucada na traseira de veículos; algumas achatadas na lateral e nenhum atropelamento – cordões de calçada não contam. Inclusive já havia descido uma escadaria sem estar fugindo da polícia.

Nas retas, ele fazia observações do tipo:
-Por que é que as mulheres têm que ficar grudadas no volante?

Com “mulheres” referia-se a mim e a uma amiga baixinha que praticamente sumia no assento. Depois veio com aquela piada machista dos dois neurônios femininos, Tico e Teco. Então parti para o contraponto:
-Nós até podemos ter um número menor de neurônios, mas eles são bem responsáveis. Já os de vocês, no momento da sacanagem, deixam o posto e vão todos lá, pra baixo. Eta povinho infame! E ainda querem ensinar a gente.

A chegada foi providencial.