Embora citações internacionais já não sejam novidade em seu currículo, o nome da bento-gonçalvense Natalia Borges Polesso, 38 anos, voltou a estampar publicações no exterior. Na última semana de maio, uma resenha do seu livro de contos “Amora” ganhou as páginas do The Guardian, um dos jornais mais lidos e influentes de todo o mundo. Dias antes, a mesma obra já havia ganhado destaque em outra conceituada publicação do Reino Unido, a revista literária Granta, a qual publicou Thick-legs (pernas Grossas), um dos contos que integram a coletânea.

Residente de Caxias do Sul, onde se dedica atualmente a uma pesquisa de pós-doutorado em Letras e Cultura pela Universidade de Caxias do Sul (UCS), Natalia iniciou sua relação com a literatura bem cedo, embora sua primeira obra date de 2013. As primeiras histórias que relembra vieram da oralidade e não da escrita. “Aos seis anos, morei um tempo com minha avó que tinha o hábito de contar causos à noite, e eu sempre esperava para ouvir essas histórias. Depois disso me empolguei e comecei as escrever as minhas”, resume.

Desde então, a ligação com o mundo das letras foi se tornando cada vez mais próxima. Tornando a escrita em hábito, inicialmente, passou a preencher cadernos com frases e poemas, até começar a se dedicar aos blogs. O primeiro reconhecimento viria ao ganhar o Concurso Anual de Literatura de Caxias do Sul. Tempo depois, em 2013, com financiamento do Financiarte, recompilou alguns de seus melhores textos para dar vida a “Recortes para álbum de fotografia sem gente”. Com esse livro venceu o prêmio Açorianos de contos, dando uma amostra do sucesso que viria no futuro.

Com sete livros lançados, entre outros reconhecimentos, Natalia faz parte da Bogotá-39, seleção dos melhores autores da América Latina com menos de 40 anos; ganhou o Jabuti e Açorianos com Amora; a obra, também foi incluída em 2020, na lista de 44 livros que estão mudando o cenário LGBT+ nos Estados Unidos, segundo a Oprah Magazine, publicação criada pela apresentadora Oprah Winfrey. Apesar de todo o sucesso, Natalia ainda diz se surpreender com cada nova indicação e com o carinho recebido. “Reconhecimento é sempre bom, seja de prêmios ou resenhas em publicações, como as das últimas semanas, e também e leitores. Todos os dias alguém vem me comentar alguma coisa sobre meus livros, dizendo que gostou e ou que se identificou. Saber que meus textos estão alcançando as pessoas é muito gratificante. Guardo cada comentário com carinho”, exclama.

Literatura representativa

Se é possível, em grande parte, perceber características que permeiam a bibliografia de grandes autores, nas obras de Natalia isso não é diferente e, tampouco, é casual. Para além dos 33 contos de amor entre mulheres de Amora, todas as demais obras da autora também são protagonizadas por personagens lésbicas. A iniciativa, conta, surgiu da percepção da ausência desse tipo de personagem na literatura brasileira. “Tudo foi, de certo modo, produto da dificuldade que eu tinha de encontrar mulheres lésbicas na literatura que não fossem fetichizadas ou que não estivessem gravitando em torno de sua sexualidade”, aponta.

Apesar de contar com protagonistas lésbicas ou gays em todas suas histórias, Natalia diz que seu foco não é direcionado a sexualidade dos personagens. A representatividade se apresenta, em suas palavras, como “dado”. “Não é uma questão temática. As histórias podem ser sobre qualquer coisa. No Amora, por exemplo, fiz um mosaico de mulheres completamente distintas, com idades e backgrounds sociais diferentes, o fato de serem lésbicas é só um dado, elas apenas existem, e a histórias se desenrola com elas fazendo qualquer outra coisa”, finaliza.