Março se aproxima do fim e já traz um índice preocupante para as autoridades da área de segurança pública. Foram sete casos de homicídio registrados até agora, uma semana antes do encerramento do mês. É, até o momento, o mês mais violento de 2018. Foram cinco assassinatos em janeiro e três em fevereiro.

O índice também preocupa em relação à marca de crimes violentos do ano passado, até o momento o mais violento da história de Bento Gonçalves. Foram 34 crimes em 2017, o que significa que, neste ano, em três meses, o número é mais de 40% do total registrado em 12 meses.

Conforme as autoridades, boa parte desses crimes está relacionado ao tráfico de drogas. De acordo com o Secretário de Segurança Pública do município, José Paulo Marinho, é uma questão que preocupa as forças do município.
Ainda segundo ele, o trabalho da Brigada Militar (BM) vem sendo desenvolvido para tentar prevenir as duas questões. Ao longo da semana, a BM realizou prisões cujo objetivo era o de coibir tráfico de drogas e as relações com homicídios. “É um trabalho louvável, mas ao mesmo tempo muito difícil de prevenir crimes como esse”, aponta.
Conforme o secretário, preocupa também o deslocamento de pessoas da região metropolitana e outros municípios da Serra para atuar no tráfico de drogas. “Temos tentado monitorar essa questão e evitar novos casos”, finaliza.

Tráfico e ausência do Estado

De acordo com o professor e sociólogo Guilherme Howes, há, em geral, uma relação direta de crimes contra vida com as drogas ou, indiretamente, pela via do que abastece o crime, como as armas por exemplo. Segundo ele, mesmo relacionados ao tráfico e tudo que o abastece, estes são crimes que tornam vítimas toda a sociedade, e repercutem diretamente na segurança pública, nos custos privados e públicos com estes gastos. “Não se pode, portanto, pensar que são uma parte da criminalidade alheia a nós, mas parte essencial da vida social. Banalizar esses crimes é não compreender o quanto eles nos afetam”, explica.

Ainda segundo ele, há uma simplificação do discurso, que ocorre quando a população entende que os homicídios relacionados ao tráfico de drogas não envolvem toda a sociedade, e não apenas aqueles que estão à margem. “Esse tipo de simplificação é um discurso corrente e conservador no trato com as questões sociais”, analisa.

Segundo ele, mesmo que vivêssemos em guetos, não haveria mortes “apenas entre os criminosos”, mas crimes entre aqueles que vivem na margem, nas bordas do centro econômico da sociedade. “Quem compra droga, cuja base está no comércio de armas e nos crimes, são as classes médias e altas. Justamente os que imaginam que hajam um mundo dividido entre ‘nós’ e ‘eles’. Essa divisão desaparece diante de um assalto num sinal de trânsito, no estouro de um caixa eletrônico, num assalto à mão armada, numa bala perdida”, exemplifica.

Em Bento Gonçalves, a totalidade dos 15 crimes violentos registrados no município ocorreram em bairros periféricos da cidade. De acordo com Howes, a questão econômica e o abandono das instituições a esses locais estão diretamente relacionados à violência. Segundo ele, aqueles que vivem no centro (do sistema e das zonas urbanas) pelo poder que lhes confere o poder econômico, conseguem maior pressão frente ao poder público ao exigir segurança. “Resta à periferia, já desabastecida de infra estrutura urbana, educação e saúde, correr os riscos da insegurança e da criminalidade”, salienta.

Há uma relação direta entre o aumento da violência e a desassistência à esses locais, com ausência de questões básicas como falta de luz elétrica, condições adequadas, higiene e limpeza das ruas, entre outras. Conforme Howes, apenas providenciando isso de imediato não se resolverá o problema, mas se proporcionará melhores condições. “A efetiva ação contra a violência estrutural (crime organizado) só é possível a partir de políticas sociais estruturais, de longo alcance, porém lentas em seus efeitos e caras em suas implantações”, finaliza.