Apesar da sucessão de casos positivados em Bento Gonçalves, profissionais da saúde se levantam com coragem em prol do bem comum

No início da crise de saúde mundial da Covid-19, a incerteza e o medo de enfrentar um inimigo invisível eram notáveis na rotina dos profissionais. Pouco se sabia sobre o vírus que levaria o mundo todo a uma pandemia e, consequentemente, a muitos efeitos negativos.

Ao mesmo tempo em que surgia a nova doença, outras enfermidades continuavam espalhadas. Heróis anônimos despontam a todo momento em hospitais, laboratórios, prontos-socorros e centros de pesquisa. Em continuidade à série Heróis da Pandemia, o Jornal Semanário traz um pouco da rotina de dois técnicos de enfermagem que atuam em frentes diferentes.

Quando há necessidade de intervenção especializada imediata e resgate de pacientes é hora do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) entrar em ação. Em uma das equipes está a técnica de enfermagem Cauana Correa, 26 anos.

O dia começa cedo, por volta das 5h30min. Ao chegar na unidade, é feito um check list para conferir todos os equipamentos e aguardar os chamados. “Quando saímos para atender um paciente confirmado ou suspeito para Covid-19, é retirado tudo o que tem dentro, porque precisamos higienizar toda ambulância”, comenta.

Além do Samu, Cauana atuava também no Hospital Tacchini. “A pressão para mim foi muito grande e desafiadora. Por mais que sejam duas coisas diferentes, elas se completam entre si. Conviver com a Covid, quase que 24 horas por dia, foi desgastante, então optei por ficar em um só ”, explica.

No dia desta entrevista, os profissionais tinham “perdido” dois pacientes em decorrência de complicações da doença, que precisaram ser levados ao hospital. “A gente sente bastante. É uma mistura de gratidão por aqueles que conseguiram vencer e de tristeza para aqueles que não. Não temos muito retorno de como está a pessoa, mas procuramos saber, nos apegamos à história dela”, comenta Cauana.

Quando a gente acha que melhora, vem uma avalanche por cima de nós.

Cícero Loureiro, técnico de enfermagem

Para ela, o maior desafio foi trabalhar com a incerteza. “Qualquer sintoma era suspeita de Covid. Hoje, com o passar do tempo, os médicos que realizam a triagem conseguem distinguir melhor. Apesar da pandemia, outros atendimentos não pararam. Ainda continua tendo muito acidente, infarto, AVC, por exemplo. Isso pesa e bastante”, sublinha.

Na outra ponta da mesma corda, está o técnico Cícero Loureiro, 44 anos. Na Unidade de Terapia Intensiva (UPA), passou a viver em um cenário diferente do que estava acostumado a trabalhar. O momento exibiu reinvenções e buscas por alternativas para um melhor acesso ao paciente.

A fé e a persistência o fizeram seguir e enfrentar a batalha. “Queríamos descobrir algo que pudesse vencer o vírus, que chegou e se propagou rapidamente, nos pegando de surpresa. A gente trabalhou muito, foi exaustivo. Estamos aqui pelos enfermos, que chegam buscando em nós um amparo”, destaca Loureiro.

Os números em Bento Gonçalves têm aumentado gradativamente e preocupado as equipes de saúde. “O que mais me frusta é o momento em que o paciente vai ser intubado, é onde tem o último contato com a família. Isso é muito forte, nos traz uma sensação — faz uma breve pausa, emocionado — sem palavras”, continua. “Eles depositam em nós a vida e muitas vezes não conseguimos vencer. Quando a gente acha que melhora, vem uma avalanche por cima de nós. Pedimos que todos não aglomerem e sigam as regras de distanciamento. É um vírus muito letal que vai levar muita gente ainda”, reitera.