Entrar em um presídio pela primeira vez é como conhecer uma nova sociedade, com organização, regras e espaços totalmente diferentes daquilo que estamos acostumados. Para quem visita então, o desafio é grande. Até descobrir com qual roupa pode entrar, quais produtos e alimentos são proibidos, pode render diversas idas e vindas frustradas. Mas em Bento Gonçalves, a Comissão dos Familiares do Cárcere, através do projeto Cidadania e Direito no Cárcere, conseguiu um espaço para acolhimento de quem visita os presos.

Uma mulher que tem o marido e o irmão presos avalia que o serviço é essencial e indispensável. “Há dois anos e meio, quando entrei lá pela primeira vez, eu estava perdida, não sabia o que fazer, qual era o procedimento. Agora não, tem a Comissão para orientar, receber, auxiliar. Sem isso, não dá mais para ficar”, diz. Além disso, ela afirma que, com o grupo, os familiares dos apenados estão tendo voz para fazer suas reivindicações de forma organizada.

Outra esposa que tem seu companheiro detido afirma que o trabalho da Comissão já está apresentando resultados. “Tivemos mudanças, nossas reclamações foram ouvidas, acho que é porque estamos unidas. Agora está evoluindo muito, nos ajuda bastante”, ressalta. O grupo é formado por voluntários que acompanham os familiares nos dias de visita. Após ouvir as reivindicações e ter uma reunião com a direção da Penitenciária Estadual de Bento Gonçalves, eles conquistaram um espaço para prestar o atendimento.

Conforme uma das organizadoras do grupo, Lisiane Pires, a direção foi muito receptiva e, como primeiro passo, cedeu um local na parte externa da penitenciária, que está sendo chamado de Sala dos Familiares. “É uma coisa inédita em Bento.

Devido a grande demanda que há dentro do sistema prisional, não tinha como os agentes acolherem os familiares e egressos. Hoje temos advogados atuando conosco, mas queremos ampliar o número de voluntários e ter mais profissionais, como psicólogos e assistentes sociais”, planeja.
Segundo ela, quando o familiar chega nessa situação, fica vulnerável, fragilizado. O serviço prestado se caracteriza como um espaço de atenção especial, ouvindo as dúvidas, reclamações e dores. Isso pode ser ampliado por meio de voluntários. “Faz com que se sintam fortalecidos, não marginalizados. Precisamos amparar essas pessoas”, pontua.

Para Lisiane, os familiares têm recebido bem a Comissão e a ideia de ter um espaço para acolhimento e esclarecimento das dúvidas. “Dá uma satisfação para a gente em ver que eles estão topando a proposta”, diz. O grupo não presta atendimento jurídico ou fornece advogados, os voluntários oferecem auxílio e dão orientação sobre como o familiar deve proceder ou onde buscar ajuda em diversas situações que geram dúvidas.

“A ressocialização envolve os familiares também”

A advogada Raquel de Carvalho, voluntária da Comissão, diz há muitas dúvidas por parte dos visitantes, principalmente aqueles que estão passando por isso pela primeira vez. “Quase 90% são mulheres, irmãs, mães e esposas. A gente faz esse meio de campo, entre familiares e presídio. Fizemos o mapeamento, até de questões de saúde, quem precisa de atendimento, exames, informamos o presídio”, explica.

A Comissão fez seu primeiro atendimento oficial na quarta-feira, 20. Aos que quiseram participar, foi feito um questionamento, para que haja um mapeamento de quem são os presos e quais suas necessidades. Depois isso será passado para a Superintendência dos Serviços Penitenciários (Susepe). “A adesão tem sido boa, muitas nos procuraram. Buscamos auxiliar elas”, diz.

Raquel salienta que antes elas (as visitantes) não tinham voz, pois era um movimento sem união, onde cada uma entedia de uma forma como proceder. “Ficavam gritando na frente do presídio, até sobre questões que eram relevantes, mas, muitas vezes, não eram ouvidas, porque não era organizado. A ressocialização não é só o preso, envolve os familiares também”, finaliza.

Com a criação do Centro de Acolhimento a Familiares e Egressos do Cárcere, a Comissão tem como objetivo:

Acolher familiares e egressos
Orientar com normas e condutas do sistema
Ajudar com processo de busca e contato com empresas e documentos necessários
Oferecer dinâmicas e Palestras pra fortalecimento e ressignificação de uma nova trajetória

Foto: Arquivo Pessoal