Agora, com o fim de ano chegando, é tempo de faxina.

Quase todo mundo inventa para si a desculpa de que “É melhor guardar isso, pois nunca se sabe o dia de amanhã. Talvez venha a precisar disso.” Com isso, as tralhas vão se acumulando em todo canto, dificultando a circulação pela casa, com portas abrindo até a metade, já que atrás delas começam as estantes abarrotadas de cacarecos.

O processo da faxina geralmente é feito de coragem, desapego e esperança.

Você deve concordar que grande parte do que guardamos é tralha sem serventia.

Mas livrar-se de coisas que fizeram parte da nossa história, muitas vezes pode doer um pouco. É claro que dói um pouco mais em quem é sentimental.

Amigo meu de longa data guarda tanta velharia que demanda vários conteineres. Confesso que não canso de me espantar com tanta tranqueira: vários aparelhos de som (nenhum que funciona), TVs de tubo, centenas de discos de vinil, caixas de revistas Seleções, dezenas de pares de tênis que já viram dias melhores, roupas que não usa mais há anos, violão com o braço quebrado, filmadora antiga e máquina fotográfica à manivela.

Meu amigo guarda canhotos de talões de cheque do século passado, caixas de som, uma coleção de calendários de borracharia, lâmpadas queimadas, guias telefônicos vencidos e muito mais.

Toda vez que vou à casa de meu amigo, sempre procuro prestar muita atenção a cada passo para não esbarrar numa pilha de caixas ou objetos contundentes. A esposa do meu amigo admite, bem-humorada, que se as coisas continuarem da indo forma em que estão, em breve precisarão mudar para a garagem.

Também tenho uma colega que junta sacolas de peças de roupas para quando ela conseguir emagrecer.

Já uma outra, toda a semana retira um monte de caixas que acondicioanam memórias para serem limpas e devolvidas aos armários. A mania de guardar vence a filosofia do feng shui do desfazer-se.

O problema é que às tralhas que um dia compramos e mais tarde guardamos, normamente juntam-se as coisas que herdamos dos nossos pais e avós, como móveis e toda sorte de badulaque. A estante enorme que ocupa o corredor inteiro da casa, a cadeira de balanço que range ao balançar, a mesa comprida como a da Santa Ceia, as toalhas de mesa bordadas por traças habilidosas, tapetes desfiados, louça trincada, objetos de decoração, quadros parados no tempo e assim até tornar a casa um lugar praticamente desabitável.

É fácil entender porque acumulamos tantas coisas. No fundo, somos como as formigas que estão sempre se precavendo contra o inverno rigoroso. Acreditamos na suposta utilidade e uso no futuro, por mais quebradas que estejam as coisas. Além disso, temos a sensação de que um pedaço de nós vive nas tralhas que guardamos.

Não sei se é o seu caso, mas muitas pessoas ficam com dó de jogar fora as coisas das quais querem se livrar, em razão disso passam-nas adiante. Minha esposa tem essa mania de “passar adiante”. Ela aproveita quando eu estou no trabalho para encher sacolas e passar meus “preciosos” pertences para os outros, como se os outros fossem “depósitos”.

Apesar de tudo, é saudável, de vez em quando, fazer uma faxina geral e livrar-se do passado. É bom descartar as coisas desnecessárias que servem apenas para juntar pó e teias de aranha.

De mais a mais, nessa viagem da vida, a única bagagem que verdadeiramente levamos é a roupa do corpo.