Esse será o segundo registro da região; o pioneiro foi conseguido pelo Vale dos Vinhedos, em 2002
O champagne da França, o vinho do Porto em Portugal, os relógios suíços da Suíça. Esses são apenas alguns entre os mais famosos produtos a contar com o registro de Indicação Geográfica (IG), certificação que, mais que visibilidade, atesta a origem e a qualidade, garantindo ainda que o nome não possa ser copiado em nenhum outro lugar no mundo. E é justamente esta a identificação que os espumantes de Pinto Bandeira estão perto de conquistar. Com nota técnica assinada pela Universidade de Caxias do Sul (UCS) e pela Embrapa, na última semana de janeiro deste ano, a solicitação para criação da Denominação de Origem (DO) para o espumante natural “Altos de Pinto Bandeira” deve ser encaminhada pela Associação dos Produtores de Vinho de Pinto Bandeira (Asprovinho) ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) — autarquia federal vinculada ao Ministério da Economia, que concede o registro de IGs, marcas, entre outros.
Ao todo, cerca de 10 mil itens contam com esse tipo de proteção no mundo, em um mercado que movimenta US$50 bilhões de dólares anuais. No Brasil, onde a primeira IG foi aprovada só em 2002 — mais de 70 anos após a criação do Institut National des Appellations d’Origine (INAO) que, instituído pelo governo francês em 1935, começou o processo de valorização de demarcações de origem —, apenas 66 produtos contam com Indicação Geográfica, sendo 55 Indicações de Procedência (IP) e 11 Denominações de Origem. Pioneira a conseguir IG, a Serra Gaúcha conta com seis, todas chanceladas pela parceria da UCS, Embrapa Uva e Vinho, Embrapa Clima Temperado e UFRGS, em conjunto com associações de produtores de uva e vinho e instituições de apoio. Pinto Bandeira que desde 2010 possui o IG homônimo para vinhos tinto, brancos e espumantes, busca agora a DO “Altos de Pinto Bandeira” para espumantes naturais.
Altos de Pinto Bandeira
Conforme explica o pesquisador especialista em zoneamento vitivinícola e desenvolvimento de indicações geográficas da Embrapa Uva e Vinho, Jorge Tonietto, as DOs reconhecem um país, cidade ou região cujo produto possui especificidades únicas incluindo, necessariamente, fatores naturais e humanos. “No caso do vinho, por exemplo, levam-se em conta dados como o solo, o clima, o relevo; e quanto ao fator humano, no caso o viticultor, existem questões históricas que se refletem no processo de produção e cultivo”, explana.
Dessa forma, as delimitações de espaço de DO de espumante natural Altos de Pinto Bandeira abrangem 65 km² de área contínua, em uma altitude entre 520 e 770 metros, com um clima de noite temperada, sendo 76,6% localizada no município de Pinto Bandeira, 19% em Farroupilha e 4,4% em Bento Gonçalves. Quanto ao fator humano, o maior diferencial é a opção pelo método champanoise, também conhecido como método tradicional, que se caracteriza por um processo de produção mais elaborado e demorado, e pela fermentação dentro da própria garrafa. É levado em conta, ainda, um limite para a produção por videira, que a uva utilizada seja chardonnay, pinot noir ou riesling itálico, e que seja produzida 100% no espaço demarcado.
A soma de todas essas delimitações se traduz, assim, num produto único e de grande qualidade. “O potencial da região e das uvas que se colhem nela e também os processos que se aplicam comprovaram, ao longo do tempo, que os produtos dali têm um terroir e uma qualidade que se evidenciam. São espumantes que têm cor, aroma, paladar e que, devido à fermentação na garrafa, possuem um nível de complexidade maior, são mais finos e equilibrados”, destaca Tonietto.
“A denominação de origem atesta que o produto produzido ali com todas suas características e forma de produzir é único, que não existe nenhuma outra região igual a essa, com o saber acumulado por seus produtores”, Jorge Tonietto
A importância da Denominação de Origem
Muito além de passar a fazer parte de um grupo seleto de produtos com identidade protegida, a Denominação de Origem, conforme explica Tonietto, embora por si só não garanta a certeza do sucesso mercadológico, atesta a qualidade e unicidade do produto, o que pode atrair o consumidor. “Isso é a comprovação de que se trata de um espumante diferenciado, o que, obviamente, permite um destaque no mercado. O produto estará associado a um renome que o consumidor passa a ter acesso, e com isso ganha também em valor”, opina.
Tonietto sublinha, ainda, que além do reconhecimento, a possibilidade de ter a aprovação do INPI será uma conquista para os produtores, que desde 2016 trabalham para comprovar as especificidades do espumante da região. Opinião corroborada também pelo presidente da Asprovinho, Marco Antônio Salton. “A denominação de origem será a consolidação de todo um trabalho que a gente vem desenvolvendo há quatro anos, definindo área e todos detalhes produtivos, para chegar em um produto realmente distinto”, exalta.
Salton acredita que, mais que a comprovação da qualidade e a possibilidade de inserção dos espumantes de Pinto Bandeira no mercado nacional e internacional, o renome que pode ser construído a partir disso pode impulsionar outros setores da economia local. “Essa representatividade de origem e qualidade nos dará visibilidade e, junto a esse crescimento, alavancará o turismo e novos investimentos para a região”, prevê.
Indicações Geográficas da Serra Gaúcha
. IP Altos Montes: Desde 2012, os vinhos e espumantes do território de 173,84 km², que abrange as cidades de Flores da Cunha e Nova Pádua, contam com a Indicação de Procedência. As condições topoclimáticas como as altas altitudes que variam entre 550 e 885 metros e as temperaturas amenas são algumas das características que marcam as tipicidades de seus produtos.
. IP Farroupilha: A Indicação de Procedência registrada em 2015 abrange o vinho fino branco moscatel, vinho moscatel espumante, vinho frisante moscatel, vinho licoroso moscatel, mistela simples moscatel, brandy de vinho moscatel, produzidos em um limite de 379,20 km², que abrande integralmente todo o município. Os fatores naturais da região condicionam a fisiologia da videira em seus metabolismos primário e secundário.
. IP Pinto Bandeira: Compreendido entre Bento Gonçalves, os vinhos tinto e branco, além dos espumantes de Pinto Bandeira contam com Indicação de Procedência. Para a produção do vinho está autorizado o cultivo de oito cultivares de Vitisvinifera L. tintas e doze de brancas. Já para o espumante fino, só é permitido o uso do método tradicional de produção. Atualmente, o município está sendo estruturado com base em estudos técnicos, para requerer ao Inpi também o registro de Denominação de Origem.
. IP Monte Belo do Sul: A região delimitada de “Monte Belo” é uma área continua localizada nos municípios de Monte Belo do Sul, Bento Gonçalves e Santa Tereza, totalizando 56,09 km². Os vinhos e espumantes, registrados com Indicação de Procedência desde 2013, distinguem-se dos demais produtos da Serra devido a alta capacidade térmica da região, que garante um maior potencial de açúcares.
. IP Vale dos Vinhedos: Seus vinhos branco e tinto e espumantes são os pioneiros em Indicação de Procedência no Brasil (2002). A região do Vale dos Vinhedos possui uma área total de 81,23Km² distribuída, na sua maior parte, no município de Bento Gonçalves, mas também em Garibaldi e Monte Belo do Sul. Para a produção é autorizado o cultivo de 12 cultivares de Vitis vinifera L. tintas e 11 de uvas brancas, sendo permitido o rendimento máximo de 150 hectolitros por hectare. Os produtos da IP são elaborados com, no mínimo, 85% de uvas produzidas na área delimitada.
. DO Vale dos Vinhedos: Duplamente pioneiro, além de ser o primeiro a conseguir a IP, o Vale dos Vinhedos também foi quem obteve a primeira DO (2012). A área de 72,45km² abarnage Bento Gonçalves, Garibaldi e Monte Bel odo Sul, e está compreendida em uma altitude entre 500 a 700 metros. Permitem-se apenas quatro variedades de uvas para a elaboração de vinhos finos tintos, estabelecendo, ainda, um percentual mínimo da variedade Merlot que apresenta elevado desempenho quanto à composição química e sensorial.
Indicação de Procedência x Denominação de Origem:
As Indicações Geográficas têm como objetivo valorizar os produtos tradicionais. De acordo com regulamentação do Inpi, elas podem ser divididas em dois grupos:
- Indicação de procedência (IP): é o nome geográfico de um país, cidade ou região que se tornou reconhecida como centro de produção de determinado bem;
- Denominação de origem (DO): reconhece um país, cidade ou região cujo produto tem características específicas graças a especificações exclusivas de determinadas áreas geográficas, incluindo fatores naturais e humanos.