Uma decisão da administração do Presídio Estadual de Bento Gonçalves (PEBG) tem gerado polêmica e causado divergências entre a direção, servidores e detentos da Casa. Uma separação, feita por solicitação dos presos, é instalada nos dias de visita, isolando detentos que recebem visitas daqueles que não recebem. Para tentar entender o cenário, o Semanário ouviu diferentes fontes sobre o assunto.

Conforme as imagens às quais a reportagem teve acesso, a divisão é feita de maneira improvisada. Alguns cobertores e panos são presos a uma espécie de varal, que é fixado nas extremidades das muretas do pátio.
Na opinião de uma fonte próxima ao serviço dos agentes penitenciários, e que preferiu não se identificar, o cerco ocorre contra a vontade da equipe de guardas. “Eles dividem o pátio entre os que recebem visitas e os que não recebem”, explica.

As imagens utilizadas na reportagem são de um dia de visita. De acordo com a mesma fonte, na data do fato, o Presídio de Bento Gonçalves recebeu 115 visitas, dos mais de 300 presos que compõem a população carcerária da Capital do Vinho. Ainda segundo o agente, os mais de 100 presos restantes ficaram confinados no espaço restrito. “Eles podem fazer qualquer coisa ali. Na nossa avaliação não é seguro”, afirma.

Direção não vê problemas

Procurado pela reportagem para esclarecer os pontos, a administração do Presídio Estadual de Bento Gonçalves afirmou ter conhecimento dos fatos. Conforme o diretor da Casa, José Marcio da Rosa Oliveira, a solicitação para a instalação da divisória partiu dos próprios presos, para que o pátio fosse dividido. “A administração não viu problema, até porque a divisão é bem coerente”, afirma.

Segundo a diretoria, a divisão ocorre exatamente conforme descrita pela fonte ao Semanário: presos que recebem visitas ficam fora do cercado, e presos que não recebem ficam reclusos no espaço menor. De acordo com Oliveira, os argumentos foram diversos. “Dentro do Presídio, os sentimentos são ‘aflorados’. O que acontece na rua é diferente, e qualquer coisa pode ser motivo para gerar uma ocorrência mais grave”, destaca.

Diante disso, a direção julgou que o fato não influenciaria no aspecto da segurança da Casa. “A análise foi feita tanto pela administração quanto pelo chefe de segurança, e constatamos que não havia problemas”, pontua.
Ainda segundo ele, foi feita uma solicitação para que os responsáveis pela obra do Presídio conseguissem instalar ganchos para adequar a estrutura corretamente. A colocação de uma lona complementará a divisória. “Talvez as pessoas vejam como um benefício, mas eu vejo como uma forma de manter a cadeia em ordem”, finaliza.

Outro problema apontado pela fonte ouvida pelo Semanário diz respeito ao descompasso entre o número de servidores atuando como agentes penitenciários. Questionado sobre isso, o diretor afirmou que, há alguns meses, esteve reunido com membros do Departamento de Segurança e Execuções Penais (DSEP) da Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe), responsável pela distribuição dos agentes penitenciários.

De acordo com ele, a 7ª Delegacia Penitenciária Regional (DPR) está na lista de prioridades da Susepe para receber novos servidores. No entanto, o último concurso foi direcionado para o novo Presídio de Canoas, que deverá receber a maioria dos agentes. Além disso, conforme comunicado pela própria Susepe em setembro, não há prazo para que os novos agentes, aprovados no concurso de abril, sejam chamados.

“Soluções devem obedecer aos direitos humanos”

Na avaliação do professor do Programa de Pós-Graduação em Direito da Uniritter, e autor de um artigo sobre direitos humanos no Presídio Central de Porto Alegre, Dani Rudnicki, o sistema penitenciário, no Rio Grande do Sul e no Brasil, enfrenta dois grandes problemas: a morosidade da justiça e a superlotação dos estabelecimentos prisionais.

De acordo com ele, o bom funcionamento de um presídio passa pelo respeito mútuo entre os que convivem naquele espaço – isso inclui administração, presos, agentes penitenciários e servidores em geral. “A lógica funciona como um grupo social qualquer, mas com relações bem mais complexas”, explica.

Na avaliação dele, esse tipo de solicitação ocorre porque há muita gente no mesmo espaço e, justamente pela complexidade das relações, isso pode gerar problemas e divergências de diversas ordens. Ele pontua, no entanto, que não é a melhor solução no aspecto do respeito aos direitos humanos. “Claro que em dia de visitas o funcionamento adequado tende a ser mais respeitado. É um dia ‘sagrado’. Mas nem sempre é assim”, afirma.

Apesar disso, Rudnicki não acredita que a medida desrespeite nenhum ponto da Lei de Execução Penal (LEP), que dispõe sobre os presos e as penitenciárias. “A Lei não é tão determinante. Definições como essa podem ser feitas pela direção da Casa”, explica.

Ainda segundo ele, é preciso buscar o princípio da razoabilidade para que haja um bom funcionamento. “Em qualquer estado democrático de direito, é necessário respeitar as leis. Nesse caso, a Lei de Execução Penal. Desde que isso ocorra, pode-se adequar os espaços e aceitar a decisão”, afirma.

O administrador do Presídio reconhece que a superlotação é uma das principais causas de insatisfação entre os detentos, e que o problema influenciou no princípio de confusão registrado na Casa na semana passada. De acordo com ele, foram encaminhados ofícios para todas as prisões do Estado, para que a direção possa cumprir a determinação judicial de remover presos até atingir o número máximo de 192 detentos. No entanto, não houve sucesso. “Todo mundo sabe a situação em que se encontra o sistema prisional do Rio Grande do Sul: estão superlotados. A gente não consegue vagas em outros estabelecimentos”, lamenta.