Contraditoriamente, quando se paga mais pela conta da luz, menos luz se vislumbra no final do túnel. Soa a clichê, mas não há como dizer de outra forma: o sistema está viciado e corrompido. A cada novo dia, novas revelações de má gestão, propinas, desvios de dinheiro público, escândalos sobre escândalos. É um tsunami diário, carregado de promiscuidade política e privada, que se expande em todas as esferas e níveis, cuja notícia chega até nós, junto ao café da manhã. No mais tardar, até o almoço. Nem digerir sossegados o feijão nosso de cada dia a gente pode. Falei em sossego? Como se isto fosse possível. A ameaça ronda nossos passos. O medo é nossa sombra.

Mas, dia destes, ouvindo conversa sobre contato de pessoa ligada às Letras com crianças de periferia, captei algo significativo que talvez sinalize mudanças nascendo no horizonte…

Vamos à história:

Então essa figura ilustre foi recepcionada pelos pequenos em encontro onde a tônica era a troca de idéias. Antes disso, os aluninhos passaram por uma peneira, e alguns selecionados em virtude da desinibição, ou da dicção, ou por ambos os motivos, receberam a incumbência de fazer as perguntas, previamente preparadas. Tipo uma prevenção no caso de se instalar um profundo e embaraçoso silêncio, ou de surgirem interrogações capazes de promover alguma “saia-justa”, especialmente diante de bacana, que falava chiado, coisa e tal. Enfim, tudo estava dando certo, com respostas ao nível das questões formuladas… E aí, já no final da conversação, uma mãozinha se destacou por cima do oceano de cabeças… ou de uma lagoinha de cabeças. Seguindo o rumo do braço, um par de olhos irrequietos foi encontrado. Era um baixinho que sapateava na platéia porque estava com a pergunta – sua mesmo – na ponta da língua. Visto, finalmente, ele então questionou:

– O que é que a senhora está fazendo para melhorar o mundo?

A cidadã teve dificuldades em responder. Puxa daqui, puxa dali, e o fio não soltava, como se as idéias estivessem presas a um emaranhado de coisa alguma.

A reação até não surpreende. Afinal, todos nós queremos melhorar o mundo, mas não sabemos de que forma, já que geralmente exercitamos apenas o trivial, como separar o lixo e fechar as torneiras. Ah! E secar a água dos vasos por causa da dengue. É pouco. Temos capacidade para muito mais. Correndo o risco de me repetir, cito Mendes Ribeiro (falecido), que costumava dizer que o povo é que nem elefante: tem força para virar o circo de pernas para o ar, mas não sabe disso.

E então o tal ponto de luz… Há cabecinhas pensantes começando a percorrer os caminhos traçados pelos adultos. O grande desafio é permitir que cresçam com a sua integridade preservada. Que não aprendam jeitinhos e contrapartidas que geram corrupção, desrespeito e abuso de poder. E que possam, enfim, virar o circo.

Bom, enquanto se espera que as operações como a “Lava a Jato” lave o Brasil, um bom começo é deixar que os pequenos expressem suas próprias inquietações…