Em Bento Gonçalves, a média anual de doadores era de 27 em 2019. Em 2020 passou para 90. Este ano, a média está em 79. Final de ano preocupa, pois neste período é comum reduzir o número de doações

Reservar um dia para doar sangue é sinônimo de doar amor ao próximo. O ato, além de manter os estoques estáveis, pode salvar a vida de pessoas que necessitam de transfusões regulares ou que passam por alguma situação de urgência. Por isso, amanhã, 25 de novembro, todo país comemora o Dia do Doador Voluntário de Sangue.

Lucas Schenato Milesi, 34 anos, sabe bem o peso dessa atitude. O jovem é paciente oncológico desde agosto de 2019, porém, com a mudança de protocolo do tratamento, após a evolução da doença, de linfoma para leucemia, precisa de sangue e plaquetas para concluir cada ciclo de quimioterapia.

Os meses em que mais precisou foram junho, julho e setembro deste ano. Para ele, o processo para conseguir o sangue nunca foi demorado. “Estava internado no hospital e sempre que o médico solicitava a transfusão, era feito de imediato”, relata.

Questionado se é possível afirmar que a doação de sangue salvou sua vida, Milesi responde que sim. “O processo de quimioterapia, por vezes, é muito agressivo para o corpo, deixa o organismo debilitado. Então, precisamos de sangue e plaquetas para podermos nos estabilizar novamente”, explica.

Por isso, ele tem consciência e destaca o valor de ter os estoques em dia.  “Acredito que as pessoas tenham muitas dúvidas sobre a doação e também do quanto é importante para um hospital ter estoque de sangue, pois são várias situações em que podemos precisar. Quem necessita fazer a transfusão, não tem tempo de esperar. Doar sangue é ajudar o próximo, é salvar vidas”, afirma.

Sou doador

O joalheiro Fernando Scarton, 51 anos, doou sangue pela primeira vez quando tinha cerca de 20 anos, em Porto Alegre, quando um familiar, que passou por cirurgia, precisou. Anos depois, já em Bento Gonçalves, decidiu tornar-se doador regular. “Foi por meio de um chamamento do próprio hospital, pois o estoque estava baixo. Então, resolvi que poderia fazer algo em benefício de quem precisava. Além disso, via familiares pedindo, por causa de uma cirurgia ou tratamento. Isso acaba comovendo e sensibilizando”, conta.

Entre 2004 e 2010, Scarton doava sangue com frequência, porém, depois começou a reduzir. “Mesmo tendo o posto de coleta aqui, deixei um pouco de lado, muitas vezes por falta de tempo, até certa preguiça, deixava para ir outro dia e acabava passando o tempo”, afirma.

Esse ano, com as campanhas que foram organizadas para abastecer os estoques, o joalheiro decidiu voltar a doar sangue e enfatiza o quão se sente bem com isso. “Na minha avaliação é um ato voluntário, de amor ao próximo, que ajuda a salvar vidas, além de manter os estoques em dia, para alguma emergência, seja uma cirurgia, transplante ou transfusão de sangue. Carrego comigo o ditado de fazer o bem, sem olhar a quem. Isso me fortalece, me enche de esperança”, destaca.

Henrique Nuncio é doador desde 2019

O secretário de Governo, Henrique Núncio doou sangue pela primeira vez no final de 2008. Porém, foi a partir de 2019 que se tornou doador regular. “Quando houve um movimento muito grande da comunidade em querer ajudar na recuperação da Professora Iva, porém quando informávamos que a doação teria quer ser realizada em Caxias do Sul, os voluntários declinavam, pois nem todos tinha disponibilidade de horário para ir ao município vizinho”, afirma.

Desde então, Nuncio percebeu a importância de manter o banco de sangue com bons índices. “Mesmo não tendo um amigo, familiar ou pedido de ajuda para alguém especifico, decidi doar regularmente”, conta.

Para ele, a atitude, além de demonstrar empatia é gratificante. “Sabemos a real necessidade de encontrarmos doadores quando tivermos uma situação muito próxima a nós. Sou do ditado de que antes ajudar, do que ser ajudado, ainda mais quando não custa nada a cada período fazer esse ato de amor”, finaliza.

Cenário em Bento Gonçalves

Embora desde 2018 a cidade não tenha mais posto de coleta, a enfermeira líder da Agência Transfusional do Hospital Tacchini e responsável pelas ações de doação de sangue no município, Ana Paula Lemos, conta que há quase dois anos, desde que trabalha neste setor, reformulou toda campanha, para dar mais visibilidade e engajamento à causa.

De acordo com a profissional, até então, não havia divulgação sobre o deslocamento gratuito que leva doadores de Bento Gonçalves até o Hemocs, em Caxias do Sul. “Criamos, junto ao marketing do hospital, um flyer de divulgação do transporte e os critérios de doação”, conta.

Outra ação institucionalizada foi uma campanha com os pacientes que já foram beneficiados e o quanto isso impactou na vida de cada um. “Bem como depoimentos dos doadores e o que os fez ser doador de sangue”, explica.

De acordo a enfermeira, o resultado dessas mudanças foi muito positivo. “A população conseguiu visualizar que a doação de sangue, como muitos pacientes dizem, proporciona a eles, poderem estar junto a seus familiares por mais tempo”, aponta.

Os efeitos também podem ser visualizados em números. De acordo com Ana Paula, em 2019, a média de anual de doadores era de 27. Em 2020 saltou para 90. Este ano, a média está em 79. “Ainda temos um pouco de resistência, mas já estamos muito melhor. A população, aos poucos, está compreendendo a importância da doação de sangue”, afirma.

Este ano, foram realizados dois eventos na cidade, para aumentar os estoques de sangue. Ambas as ações foram concretizadas em parceria entre o Hospital Tacchini, Prefeitura de Bento Gonçalves e Hemocs. “Como tínhamos uma cobrança da população, precisávamos dar este retorno e aproximar, desmistificar a doação de sangue. Os eventos foram de grande sucesso”, enfatiza.

A situação dos estoques é sempre muito relativa. Esse ano, os meses de julho, agosto e outubro foram considerados os mais críticos. Atualmente a situação é estável. Porém, com a proximidade do final de ano, a preocupação aumenta, pois é o período que costuma reduzir o número de doadores.

Hemocentro Regional de Caxias do Sul

O Hemocentro Regional de Caxias do Sul (Hemocs), de acordo com o Assistente Social, Rafael Moreira é o responsável por abastecer 16 hospitais, distribuídos por toda região nordeste do Rio Grande do Sul, abrangendo ao todo, 49 municípios e cerca de 1,3 milhões de habitantes.

Com o surgimento da pandemia do coronavírus, os procedimentos não urgentes foram interrompidos como estratégia de frear a disseminação do vírus. Esse ano, com a retomada dos procedimentos ambulatoriais, o local passou por meses difíceis. “Enfrentamos, nos meses de setembro e outubro, a pior situação dos estoques do hemocentro de Caxias, culminando no adiamento de alguns procedimentos nos hospitais”, conta.

Para aliviar a situação, Moreira relata que no mês passado foram realizadas duas coletas externas e mais duas neste mês. As ações ajudaram a adequar os estoques neste final de novembro. Entretanto, atualmente, o estado é de alerta para os estoques do tipo sanguíneo O+.

Para operar em condição não critica, o Hemocs necessita, em média, de 1.600 doadores mensais. “Cerca de 20% dos doadores são impedidos na triagem. Então, precisamos de 1.600 candidatos à doação para conseguir efetivar entre 1200 e 1300 bolsas de sangue coletadas”, explica.

A demanda de tipos sanguíneos é muito relativa. De acordo com o assistente social, AB- tem menor estoque, contudo, também tem menor demanda. “Os mais comuns são A+ e O+, juntando os dois, cerca de 72% da população mundial é um desses tipos sanguíneos. Consequentemente são nossa principal demanda, já que quem vai internar tem grandes chances de ser um destes tipos sanguíneos. E o O- é o doador universal, então ele é um tipo sanguíneo muito importante também”, esclarece.

Critério para doação