Em uma busca rápida pela Rede Social Facebook é possível encontrar mais de dez grupos com o nome Baleia Azul. Não precisa muito para que jovens e adolescentes sintam-se curiosos para descobrir sobre o que se trata o desafio que vai da automutilação ao suicídio. E é para acender o alerta ao fato de que os adolescentes brasileiros estão em contato com o jogo, que escolas da região trazem para as salas de aula o debate sobre o tema.

A moda do jogo virtual surgiu na esteira da estreia do lançamento da polêmica série da Netflix “13 Reasons Why”, que também aborda a temática do suicídio e é com a Comunicação Interna de Prevenção de Acidente e Violência Escolar (Cipave), que a assessora pedagógica da 13ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE), Vanise Marconi, pretende chegar até os alunos. “Precisamos estar inseridos no meio deles. Conhecer o que eles estão buscando na internet, principalmente por termos conhecimento de que há, atualmente, um maior número de suicídios entre jovens brasileiros”, admite Vanise.

Para pertenceram a realidade das crianças e adolescentes, os professores e a direção da Escola Estadual de Ensino Fundamental Maria Goretti criou um programa para trazer à tona debates sobre bullying, depressão, suicídio e vida nas salas de aula.
A professora do 5º ano, Rita da Silva, criou a #ValeAPenaViver e desde o início dessa semana já está trabalhando com os pequenos o porque é tão gratificante estar vivo. “Hoje em dia todo tá desanimado, precisamos dizer mostrar o outro lado para eles. Além de ensiná-los a buscar o estímulo para que as pequenas coisas do dia a dia deem certo, nem que precisemos ir contra tudo e contra todos”, comenta a professora.

O contato entre educador e aluno é fundamental para que a professora conheça cada uma das crianças. “Tenho um relacionamento muito bom com eles. Não deixo que eles fiquem quietos demais, pois sinto que daí há algo estranho. A gente brinca de enterrar tudo que seja ruim e estamos conseguindo”, comemora Rita.

“Eles querem testar os próprios limites e ter poder”

A psicóloga especialista em Teoria, Pesquisa e Intervenção em Luto e Perdas, Franciele Sassi, garante que mais do que nunca, estamos vivendo atualmente em uma sociedade vista como dinâmica, potente, que empodera-se muito e tolera pouco. “Tem-se o pensamento de que quando mais rápidas forem as coisas, melhores elas serão. Esta é a sociedade impaciente em que os jovens vem aprendendo a se tornarem-se adultos, desenvolvendo-se cognitiva e emocionalmente, e facilitando uma série de sintomas que aparecem como forma de expressão de algo que, parte das vezes, não está explícito”, observa.

Franciele salienta que é em meio a esse contexto eufórico e desenfreado, fruto de uma sociedade pressionada a ser e fazer o melhor o tempo todo, que fica nítido observar que, todas as questões que tratam sobre algum tipo de limitação, deficiência ou falta de controle, acabam sendo distanciadas ao máximo como forma de evitar reflexões mais aprofundadas e, com isso, acabam-se criando eventuais angústias. “Isto está muito relacionado à carência do conhecimento social. Basta pensarmos que o jovem está imerso neste turbilhão de estímulos, num importante período de construção da sua identidade e, para sentir-se inserido, está sujeito a submeter-se aos “exemplos” sociais que apresentam um indivíduo de sucesso. E é a partir de jogos, como o da Baleia Azul que eles tentam buscar representações e estereótipos relacionados a um constante “vir a ser”, sempre na busca do “mais””, acrescenta a psicóloga.

Franciele diz não ser possível afirmar que há uma relação direta entre os jovens participantes do Jogo Baleia Azul e a psicose. “Parece-me que a participação em jogos desta modalidade (assim como o acompanhamento de algumas séries televisivas, como também se tem escutado falar ultimamente) está associada, em maior grau, à testagem dos limites da vida, à sensação de controle e empoderamento, sem falar de testar os próprios limites de cada participante, salientando que é possível ultrapassar etapas e vencer os desafios, mostrando-se capaz de fazer”, expõe.

Quando o assunto percorre os corredores das escolas e precisa ser tratado em sala de aula, Franciele salienta ser de extrema importância a preparação adequada para trazer o assunto à tona. “Sobretudo numa sociedade imediatista que corre o risco de fazer interpretações que venham a reproduzir a indiferença social como sintoma”, aponta.

Não apenas o Jogo da Baleia Azul precisa ser discutido com os jovens, segundo a psicóloga. “Mais do que falar sobre o jogo, estamos falando sobre suicídio que não é de hoje que acontece. E, justamente por isso, abranger uma temática tão complexa com o público, que considera os assuntos relacionados à morte e ao morrer como um tabu, não é para qualquer um. É preciso buscar ajuda especializada e, mesmo assim, selecionar alguém que seja sensível a ponto de levar o conteúdo de forma sábia e delicada”, afirma.

É no convívio familiar que os pais e responsáveis conseguirão alertar os jovens aos cuidados com os jogos online. “É importante que os pais estejam atentos aos seus filhos, não apenas em virtude dos modismos sociais que, ao serem lançados de forma exagerada na mídia, na maior parte das vezes sofrem banalização e descaso. É preciso ser presença afetivo-emocional, não apenas fisicamente. Mostrar disponibilidade e acessibilidade para tratar com naturalidade e sabedoria mesmo as questões mais difíceis é fundamental, pois é importante que sejam fornecidas sempre respostas claras, objetivas, que demonstrem conhecimento e segurança, para que também os filhos se sintam capazes de construir suas opiniões”, orienta a psicóloga.

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