Se a palavra democracia pode ser traduzida como um meio para a realização dos valores essenciais da convivência humana através da participação dos cidadãos diretamente na gerência dos atos estatais, a decisão dos vereadores de Bento Gonçalves ao rejeitar a ampliação do número de sessões ordinárias na Câmara local, de uma para duas sessões semanais, fez a própria democracia sair perdendo de goleada na votação do projeto ocorrida na segunda-feira, 25.

Por 10 votos contrários, a Câmara ignorou solenemente os apelos populares e simplesmente rejeitou, sem explicações, a proposta encaminhada pelos vereadores Moacir Camerini (PT), que propôs a mudança, e Moisés Scussel Neto (PMDB), co-autor da matéria, que instituía uma segunda sessão semanal para permitir a ampliação dos debates e das representações da sociedade no Legislativo, tão caros à Democracia, escrita assim mesmo, com “D” maiúsculo.

Os princípios da soberania e da participação popular, que conjugados tendem a realização dos valores da igualdade e da liberdade, saem maculados, e mancham a reputação do Legislativo bento-gonçalvense como um todo (é claro que, identificados, a dezena de vereadores que rejeitou a ampliação do número de sessões deve sofrer dano maior à própria imagem). Depois da votação, podemos concluir com infelicidade que aqui convivemos com uma “quase democracia”. Não resta dúvida de que há obediência ao princípio da soberania, com eleições diretas dos representantes, em homenagem pelo menos aparente ao mandamento de que todo o poder emana do povo. Todavia, o segundo postulado, que determina o exercício do poder pelo povo, o da participação popular, não foi até hoje implementado, e, ao contrário, é cada vez mais rechaçado, como comprova a infeliz decisão do Legislativo local.

Se a democracia quer significar a efetiva participação do povo nas decisões e destinos do Estado, ela se traduz na ideia de que o povo é o verdadeiro titular do poder, mesmo que ele seja exercido através de representantes eleitos. Porque são esses representantes que devem se submeter à vontade popular, e não o contrário, como se vê por aqui, claramente, neste episódio. Em suma, os vereadores adotaram uma posição que está na contramão dos anseios da população que ora representa ou, mais grave ainda, vai de encontro aos desejos da sociedade que lhes elegeu. Mas, se o povo está apto a eleger seus representantes, fiscalizar sua atuação e participar cada vez mais da elaboração e execução dos programas públicos, não saberia exigir dos vereadores o cumprimento das regras democráticas ou, mais que isso, exigir de seus representantes que trabalhem de acordo com o entendimento de seus eleitores?

Somente assim será possível dar plena eficácia aos postulados democráticos tão importantes inseridos na chamada Constituição Cidadã promulgada em 1988 e vigente até os dias de hoje, 25 anos depois.