Coisa admirável é a música! Para metade da população, em cujo grupo me encontro, ela funciona como um carburador: gera combustão e liga o motor. (Ah! Sei. Com o advento da injeção eletrônica, o dispositivo foi pra escanteio. Mas o princípio é o mesmo). Para a outra metade, é o futebol que acende o pavio, que, inclusive, está sempre próximo a um barril
de pólvora.
Comigo funciona assim: o ritmo bateu no ouvido, e já sei se vou gostar ou não. Mas preciso ouvi-lo de novo, para que me entregue completamente. Na terceira ou quarta vez, o coração – ou o cérebro – se rende. E a paixão rola…
Se eu estiver sensibilizada ou fragilizada, maior é a chance de a música me ganhar. E o surpreendente é que as sensações originais provocadas por certas composições musicais tendem a se repetir, independentemente do contexto em que estarão acontecendo. Um exemplo disso é o tema de “Zorba, o Grego”, filme lá de “1.500”, que ainda hoje me faz levitar, tal é o arrebatamento que me provoca.
Nestes tempos “líquidos”, em que as canções que invadem os espaços têm letras pobres, frases curtas ou monossilábicas, com ideias explícitas e de mau gosto, encontrei, numa incursão pela Internet, algo sólido como a rocha: de Pedro Abrunhosa, “Quem me leva os meus fantasmas”.
Foi amor à primeira vista aumentado a cada nova escuta, pelo tanto que revela da natureza humana na sua essência. Ainda não decidi se gosto mais da interpretação do autor ou de Maria Bethania, ambos perfeitos em suas características. Ela, com uma voz clara e profunda de oceano; ele, com uma rouquidão ora doce ora doída de cachoeira.
Não dá pra resistir… Segue um trechinho da letra-poema:
“Aquele era o tempo
Em que as mãos se fechavam
E nas noites brilhantes as palavras voavam
E eu via que o céu me nascia dos dedos
E a ursa maior eram ferros acesos…”
“Quem me leva os meus fantasmas?
Quem me salva desta espada?
Quem me diz onde é a estrada?
Quem me leva…”

Me deleitei já nos dois primeiros capítulos. A saga do guri contada com o lirismo da boa escrita é comovente. Muito mais que uma obra autobiográfica, “LONGA TARDE NO PAIOL” nos proporciona uma leitura singular, ilustrada com imagens memoráveis. Vale a pena fazer esta incursão pela história do piá Idalino e vida de MOISÉS LUIZ MICHELON.