O produtor de vinhos naturais Eduardo Zenker, de Garibaldi, teve toda sua produção bloqueada pela Secretaria de Agricultura do Rio Grande do Sul na quinta-feira, 8 de junho, com a justificativa de irregularidades sanitárias e ausência de registro. A questão traz à discussão as dificuldades, custos e burocracia que envolvem o processo de vinificação e comercialização da bebida.

Enquanto Zenker pode ser interpretado como um curioso e inquieto produtor, que busca resgatar métodos de vinificação antigos, a legislação ainda não abrange completamente os vitivinicultores pouco mais aventureiros como ele. Outro fator que complica a relação dos produtores com a legislação é a impossibilidade de enquadrar vinícolas no Simples Nacional.

Atualmente, os vinhateiros caseiros podem ser englobados na lei que regulamenta a produção do vinho artesanal ou colonial. Apesar da legislação possibilitar a produção apenas com o CPF, as vendas se limitam às feiras específicas ou na propriedade do produtor.

Zenker entende que a lei, de forma geral, não incentiva a produção artesanal e um registro de CNPJ acarreta em custos elevados para quem mantém um negócio de menor porte. “Somos penalizados pela burocracia. Quando percebemos, o tamanho da produção não paga o custo, esse é o grande problema”, argumenta. Ele observa que com o Simples, a carga tributária cai consideravelmente e facilita os processos.

Na França é parecido

O Brasil busca se consolidar no mercado mundial de vinhos, mas a legislação ainda limita os produtores independentes, sobretudo em aspectos financeiros. De acordo com Zenker, o empecilho com o Ministério da Agricultura se refere a todas as despesas necessárias para a regulamentação. “As adequações em si não são um problema”, expõe.

O produtor natural conta que no ano passado esteve na França e que seus métodos de vinificação não são diferentes daqueles adotados pelos vinicultores do país europeu. “Eu produzo o vinho da mesma forma que eles e o vinho francês entra aqui legalmente. Como pode?”, questiona.

Segundo a assessora jurídica do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), Kelly Bruch, que fez doutorado na França, existe regulamentação e fiscalização no país em questão, porém, a burocracia é menor. “Isso não quer dizer que é de qualquer jeito”, afirma.

Ela observa que a legislação é restritiva tanto para vinícolas de maior como de menor porte. Segundo Kelly, ainda é necessário mudanças legais para auxiliar as vinícolas. “É uma luta todo dia”, ressalta.

A assessora jurídica explica ainda que, infelizmente, pelo fato de Zenker elaborar um vinho com valor agregado, ele acaba se enquadrando na mesma legislação das vinícolas tradicionais, e não na lei do vinho artesanal ou colonial. “Ele entra na legislação que vale para as outras vinícolas pois não se enquadraria na lógica do produtor familiar”, observa.

Por que vinho natural?

No entendimento de Zenker, quase todos os vinhos são naturais, mesmo aqueles produzidos pela indústria em grande escala. Segundo ele, a diferença é a utilização de leveduras nativas ou indígenas, que torna o vinho característico da região. “Não tem a ver com o adjetivo ‘natural’, mas é um conceito que envolve pessoas ligadas à terra, com produção pequena e que não visa somente a lucratividade”, explica.

Ele argumenta que faz vinho brasileiro, por isso, a levedura que fermenta a bebida está no ambiente e na casca da uva. “É um vinho muito sensível, tem que levar ele com muito cuidado, qualquer contaminação arruína porque não tem produtos (para correção) para dar suporte”, aponta.

Simples deve valer a partir de 2018

A sanção do Projeto de Lei Complementar (PLC) 25 regularizou a adoção do Simples Nacional para vinícolas, microcervejarias e produtores de cachaça artesanal a partir de 2018. Com isso, a carga tributária sobre as empresas de menor porte do setor vinícola deve ter uma redução de aproximadamente 55%.

O projeto foi sancionado pelo presidente Michel Temer em outubro de 2016 após ser aprovado por unanimidade pela Câmara dos Deputados. Segundo informações do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), a liberalização da legislação deve permitir que haja mais ofertas de produtos no mercado e mais produtores serão formalizados. Além disso, a instituição pontua que a medida contribui para a permanência das famílias no interior e consolidação do enoturismo.

A instituição estima que 90% das vinícolas do Rio Grande do Sul e Santa Catarina são micro e pequenas empresas, ou seja, que respondem ao critério para se enquadrar nas normas do Simples. A assessora jurídica do órgão, Kelly Bruch, aponta que a tributação atual é muito pesada para todas do setor. “Nesse sentido, é proibitivo abrir uma empresa no Brasil”, afirma.

Eduardo Zenker, que teve a produção bloqueada, esperava a regulamentação do Simples para deixar sua vinícola de acordo com a legislação. “Assim vai viabilizar minha produção no tamanho em que ela está, porque com o dinheiro que eu pagaria impostos eu posso pagar as despesas fixas”, observa.