Em Monte Belo do Sul, há uma variedade de empreendimentos, daqueles que a família toda coloca a mão na massa e colhe junto as vitórias

A pequena cidade de Monte Belo do Sul conta com um comércio bastante familiar. Pessoas que além do laço sanguíneo, decidem repassar, muitas vezes, aquilo que aprenderam com as antigas gerações. Se tornando uma tradição, é passado o conhecimento de avós para filhos e até mesmo netos, desta forma transformando, acima de tudo, o trabalho em união. Até mesmo daqueles que iniciaram seu negócio sozinhos, mas no futuro, quem sabe, possam passar o conhecimento também para seus filhos.

Cláudia Maria Rasador, de 48 anos, é uma das proprietárias da Karol Modas, e filha de Noeli Rasador, 68, fundadora da loja. Entre elas, há também mais uma irmã e filha, Caroline Rasador, de 38. Além do número 10, há uma outra ligação entre elas que é a loja que as três mantém juntas. Cláudia conta como iniciou. “A gente veio do interior, lá da rua Capela do Rosário. Minha irmã nasceu com deficiência visual e a mãe então começou a trabalhar com o comércio. Portanto, fazem 38 anos que vendemos roupas e algumas outras peças, mas que viemos para centro de Monte Belo faz uns 28”, explica.

Karol Modas é uma das únicas lojas da cidade, e lá tem tudo, desde itens de moda e também para mesa, cama e banho. Para completar, aos fundos do espaço, há um salão de beleza. Ela também explica que apesar de a cidade ser pequena, os negócios estão bons. “A gente vende bem, dá para sobreviver. Porque a vida está difícil para todo mundo em nosso país, e nós estamos aqui de portas abertas. O nosso melhor mês, por exemplo, é em maio, quando é comemorado o dia de Nossa Senhora do Caravaggio, além do final de ano, por conta das festas. Então, sinceramente, não tenho do que reclamar”, considera Cláudia.

Claudia Rasador fez a vida através do comércio, junto da família

Mas, às vezes, o comércio é o início da tradição em família. Cláudia Girotto tinha uma promessa consigo mesma: iria criar o próprio negócio aos 30 anos. E foi assim que surgiu a Fiori Floricultura. A casa azul, construída com madeira e um jardim com muitas flores, chama atenção de qualquer um que passa. Cláudia conta como iniciou o processo de concretização de seu sonho “Prometi para mim mesma que colocaria o meu próprio negócio, era um objetivo. Quando fiz, então, o meu trigésimo aniversário, realizei este sonho. Sou apaixonada por flores, pela delicadeza dos presentes e decidi abrir uma floricultura. Hoje, aos 33, faz três anos que estou com ela e, graças a Deus, a cada dia crescemos mais”, relata Cláudia.

Aos 30 anos, Cláudia Girotto realizou o sonho de ter seu próprio negócio

As delícias da nona

Já imaginou, quem sabe, um restaurante no porão, trazendo no cardápio todas as receitas da vovó? Preservar a tradição daqueles que amamos é um belo gesto de manter eternizado aquelas pessoas não somente nos corações, mas em vida. Álvaro e Flávia Manzoni decidiram perpetuar as receitas da nona da melhor forma: no porão da casa onde ela as fazia. “O espaço é bem legal, porque aqui era a casa da Nonna Metilde, a matriarca da família. O nome é em homenagem a ela, e a gente está aqui há 20 anos, sempre com o mesmo cardápio, que é a sequência colonial, bem o que ela cozinhava. Então, nós pensamos nele para manter a tradição do que as nonas faziam. Por conta disso, todas as massas são produzidas aqui, como os raviólis e capeletis”, explica Flávia sobre o funcionamento do restaurante.

Há duas décadas, no município, o turismo recém iniciava, e a cidade ainda não estava preparada para recebê-los. E foi então que surgiu o pensamento de criar o restaurante. “A ideia foi do Álvaro, meu marido. Ele começou a pensar porque o Vale dos Vinhedos estava começando a surgir e em Monte Belo não tinha nada. O turista vinha até aqui e tinha só um hotel que não abria final de semana”, explica.

Flávia Faccin Manzoni mantém a tradição da culinária da Nonna Metilde

Conforme ela, o espaço levou cerca de cinco anos para ficar pronto. “Até porque nós tentamos preservar o porão parecido com o que era. Claro, fizemos algumas reformas, mas a ideia foi manter o local onde o nono fazia os vinhos e a nona produzia o queijo, então, eles tinham essa tradição da colônia. E, justamente por ser um local tradicional, vem muito turista aqui e são eles que basicamente alavancam o lugar. O melhor período é o inverno, porque é alta temporada”, relata a sócia-proprietária.

Espaço mais tradicional

Além do turismo, muitos espaços para os moradores também são pensados. Por conta disso, o casal Mauro Fantin e Marcia Ozekoski decidiu abrir um empreendimento que servisse comida não tão tradicionalmente italiana, mas bastante brasileira. “Eu trabalhei com comércio mais de três anos, já tinha cuidado de outros restaurantes e vi bastante defasagem de locais para almoçar. Conversei com minha mulher, a sala onde estamos ficou disponível e abrimos o Ernesto Restobar, que carrega o nome do meu avô”, comenta Fantin.

Poderia ser arriscado abrir um restaurante em uma cidade pequena, onde praticamente 80% das pessoas moram no interior, mas o casal foi em frente. “Vai fazer dois anos que estamos aqui, e o movimento para o tamanho do município é bem além do esperado. O meu público é mais para moradores da cidade, 90% dos meus clientes do meio-dia de segunda a sexta, são pessoas de empresas que estão trabalhando na cidade ou de moradores”, relata.

Por conta disso, ele mantém um preço não tão turístico e, é claro, com uma comida menos elaborada. Preferi manter meu público da semana, um almoço com um valor mais em conta, até mesmo para não deixar o pessoal daqui não ter onde almoçar com preço mais acessível”, finaliza o dono.

Produção de vinho

Monte Belo é muito conhecida por suas uvas, e também pelas vinícolas espalhadas pela localidade. Adelar Canossa e Sheila Canossa são pai e filha, juntos nutrem um sonho que vem desde os mais antigos da família. “A gente iniciou a Vinícola Caturetã desde a nossa primeira safra, em 2002, e foi só com uva da propriedade mesmo, as notas inclusive eram feitas a mão. Hoje em dia é tudo feito pelo computador, mas naquela época a gente ainda não conseguia”, relembra. “O pai começou em 1996, no porão de casa. Ele aprendeu a fazer vinhos com o meu avô, as rolhas eram colocadas manualmente, tinha que esquentar elas e coloca na garrafa, nesse tempo eu os ajudava, ficava entregando-as para o meu pai”, complementa.

Sheila Canossa, da Vinícola Caturetã

O sonho que iniciou há muitos anos, começou a dar frutos no final da década de 90, quando, na própria casa, foram instaladas pipas. “Tinha duas, três pipas em cima de casa, e foram construídos mais cômodos, para que pudesse usar a parte de baixo. Só que as vendas começaram a ir muito bem, e ele optou por construir a vinícola. Em 1999 a gente começou a trabalhar no terreno onde o empreendimento está localizado, mas foi somente em 2002 que tivemos a primeira safra da vinícola, funcionando onde é hoje”, relata Sheila.

Com o crescimento e importação dos vinhos para outros estados, mais portas foram se abrindo para esta família. “Desde 2019 nós passamos a trabalhar com vinhos engarrafados, antes nós trabalhávamos apenas com uva em granel e garrafa pet. Nós temos a nossa própria plantação de uvas, mas hoje, com a quantidade que estamos fabricando, tivemos que comprar de outros produtores também. Por exemplo, este ano produzimos por volta de 400 mil litros. A nossa capacidade é de 700 mil e todo esse vinho fica estocado até o engarrafamento. Portanto, somos uma vinícola familiar mesmo, o máximo que terceirizamos é a colheita da uva, porque é muita quantidade, mas toda a produção do produto final é feita por nós”, finaliza Sheila.

Fotos: Renata Carvalho