Na década de 70, nos países de primeiro mundo, a reciclagem começou a tomar conta nas residências e instituições públicas e privadas. Separar o lixo em reciclável (reaproveitável) e orgânico (que não pode ser reutilizado) passou a ser uma prática considerável, fazendo com que muitas pessoas encontrassem na reutilização de resíduos, tanto na sua forma original, como realizando mudanças em seus estados físico, físico-químico ou biológico, uma forma de sobrevivência.

Em Bento Gonçalves, há cerca de 20 anos, a coleta seletiva de lixo iniciou pela área central e, com o passar do tempo, se expandiu para os bairros e até pelo interior do município. Porém, é comum ouvirmos de muitos cidadãos que “não adianta separar os resíduos”, que a prática não é comum em suas casas e, pior, termos até locais públicos em que a separação não é realizada corretamente.

Comuns são também as denúncias de que a empresa que realiza a coleta seletiva recolhe “tudo junto”, desanimando as pessoas que têm o costume de armazenar e descartar corretamente resíduos orgânicos, recicláveis, vidros e óleo de cozinha usado.

Na última semana, nas redes sociais, um vídeo chamou atenção. Num condomínio do Bairro Progresso, o caminhão com prensa da empresa RN Freitas, que realiza a coleta através de processo licitatório desde 2005 e tem contrato em vigor até agosto de 2023, parou ao lado dos recipientes de armazenagem e, os funcionários, jogaram tudo junto, deixando os moradores do entorno, mais uma vez, perplexos.

Vizinha do condomínio, uma moradora que não quer se identificar, ficou indignada com a situação. “Acredito que todas as pessoas conscientes, que querem colaborar com o meio ambiente, separam o lixo. Na maioria dos prédios existem as lixeiras para o reciclável e o orgânico e, mais recentemente, até para vidros, visando facilitar o trabalho de quem vive disso. Eu não entendo o porquê de os coletores recolhem tudo misturado”, diz.

A cidadã ressalta que presenciou a cena inúmeras vezes, não só no prédio onde reside, mas nos edifícios vizinhos. “De tão indignada, fiz um vídeo e postei na rede social, pois nesse dia foi pior. Misturaram o lixo orgânico com vidros, sendo que estavam devidamente separados nas lixeiras. É lamentável esse tipo de atitude, já que se fala tanto em proteção ao meio ambiente. Assim acabam prejudicando as recicladoras que dependem desse produto que é desperdiçado. Espero que o órgão responsável tome uma atitude com urgência”, frisa.

Ela diz ainda que não adianta denunciar diretamente aos responsáveis, pois eles sempre têm “uma justificativa para sair por cima”. Em conversa com o Secretário do Meio Ambiente, a moradora salienta que ele disse que não é a empresa que está errada, e sim as pessoas que depositam o lixo no dia errado. “Mas se as lixeiras estão separadas, é só pegar o lixo do dia”, exclama, finalizando: “A gente já faz a nossa parte de separar e colocar cada qual na sua devida lixeira. Eles que façam a deles de recolher no dia em que compete”.

O gerente da RN Freitas em Bento Gonçalves, Everton Luís Lopes de Fraga garante que esta não é uma prática normal, mas se os resíduos não estiverem corretamente separados, vai tudo junto mesmo. Além disso, no caso citado, especificamente, Fraga afirma que por duas quartas-feiras seguidas não foi realizada a coleta de vidros no referido bairro, fazendo com que a lixeira ficasse “transbordando” e, inclusive, vidros fossem depositados no chão, ao lado do recipiente apropriado. “O motorista foi notificado, porque não pode fazer isso. Porém, ele estava pensando na segurança das pessoas que passam pelo local, tanto que recolheu apenas a parte que estava no chão e que estava impedindo o fechamento da lixeira, deixando o restante para a coleta de vidros”, frisa.

Ainda conforme o Gerente, Bento Gonçalves é uma cidade em que a população no geral é bastante consciente no que diz respeito à separação dos resíduos. “Melhorou muito nos últimos anos, tanto que esta cidade está três vezes acima da média nacional quando o assunto é reciclagem. Enquanto no Brasil 9,8% dos resíduos são reaproveitados, nossa média aqui chega a 30%”, comemora.

Problemas na área central e no corredor gastronômico

Fraga ressalta que a área central do município é uma das mais problemáticas quando o assunto é coleta seletiva. “No que diz respeito ao comércio, ainda há o costume de colocarem tudo no fim do expediente na rua, tanto orgânico, quanto reciclável. Fomos instruídos a não deixar lixo sobre as calçadas, até porque em caso de chuva, ou mesmo com catadores e animais soltos pelas ruas, tudo pode ser espalhado de uma hora para outra e sujar todo o entorno. Então, o caminhão passa e os funcionários levam tudo”, comenta.

Outro problema citado por ele diz respeito ao corredor gastronômico (Rua Herny Hugo Dreher e Av. Planalto). “Sofremos muito com os restaurantes. Eles colocam tudo junto, sobras de comidas, embalagens. Até materiais de construção já encontramos no lixo reciclável, em períodos de reforma dos estabelecimentos”, lamenta o gerente.

Ele lembra que, no Centro, por exemplo, a coleta de resíduos recicláveis e de vidro ocorre de segunda à sexta-feira, a partir das 7h da manhã, ao passo que os orgânicos são recolhidos de segunda a sábado, a partir das 18h. “O que posso dizer é que as reciclagens estão com bastante material, inclusive com dificuldade de encontrar mão-de-obra. Atualmente são nove empresas que funcionam em Bento, para onde levamos, diariamente, cerca de 35 toneladas de resíduos por dia. Destas, cinco são descartadas novamente após a triagem. Mas este montante (35) poderia ser ainda maior se cada residência e cada estabelecimento fizesse a sua parte”, finaliza.

O que diz o SEGH

A diretora executiva do Sindicato Empresarial da Gastronomia e Hotelaria e presidente do Conselho Municipal de Turismo, Márcia Ferronatto, afirma não ter conhecimento da situação. Ela diz ainda que já foram realizadas campanhas no passado abordando o tema e que irão propor uma reunião dos associados com a Secretaria do Meio Ambiente a fim de esclarecer e intensificar a importância da separação do lixo.

O que diz a CDL

O presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL), Marcos Rogério Carbone, afirma se solidarizar com a problemática. “Nos colocamos à disposição para contribuir com a divulgação de materiais informativos e de conscientização que venham a ser desenvolvidos pela Prefeitura ou empresa prestadora do serviço de coleta no município. Inclusive fizemos isso há cerca de um mês. Mas é de fundamental importância que toda a comunidade observe com atenção aos horários de cada tipo de coleta para que esse serviço possa ser realizado com o máximo de eficiência”, comenta.

O que diz o Sindilojas

O presidente do Sindicato do Comércio Varejista (Sindilojas), Daniel Amadio, enfatiza que foi realizada uma campanha há pouco tempo, com distribuição de material informativo. “Também realizamos uma reunião, a convite do Secretário do Meio Ambiente, buscando esta conscientização. Muitos lojistas têm contato direto com catadores, que buscam o material, mas estes não têm horário, complicando, inclusive, o fluxo do trânsito”, diz. Amadio sugere, ainda, que a RN Freitas coloque os dois caminhões juntos para fazerem a coleta no mesmo horário, visando evitar esse tipo de situação, principalmente na área central.

O que diz a Secretaria do Meio Ambiente

O secretário Municipal de Meio Ambiente, Claudiomiro Laurindo Dias faz um apelo. “Precisamos muito da conscientização da população. Há anos pedimos à comunidade que dê a destinação correta dos resíduos. Todos os locais têm dia exato para cada tipo de coleta. Se o cidadão descartasse no dia certo isso não aconteceria. A empresa tem que limpar, até porque se deixam alguma coisa para trás, o povo reclama! Estamos pegando firme na educação ambiental, mas mesmo assim, está difícil. Só mesmo a conscientização da população pode nos ajudar a resolver isso”, enfatiza.