Definitivamente fui enquadrada. Não no sentido do Direito para fins de aplicação de pena, que não sou delinquente! Fui classificada, encaixilhada, posta num quadrado com o rótulo “Cara de Pobre”.

Se sou pobre? Bom, nunca passei fome, como é visível a olho nu. E nunca me inscrevi no CU – Cadastro Único – que encaminha as pessoas menos favorecidas aos vários benefícios como bolsa família, bolsa verde, vale gás, desconto na conta de energia elétrica, telefone popular, cartão reforma, vale lazer… Nem carteira de idoso tenho! Minha casa foi quitada com recursos próprios, resultado de muito trabalho. Quando os filhos eram pequenos, o Brasil não era nada

Carinhoso e nunca me forneceu creche.

Salários extras disfarçados em penduricalhos não fazem parte do meu contracheque – nada de auxílios (moradia, saúde, dentista, fisioterapia, alimentação), nada de verbas (paletó, livros e revistas, passagens aéreas, serviços postais, para condomínio, IPTU, serviço de energia elétrica, água e esgoto, locação de imóveis, combustível, serviços de segurança e consultoria) nada de estudos remunerados, acesso gratuito à internet, diárias escorchantes… Opa! Isso não é coisa de ficção?

Então, como ia dizendo antes de mirar nesse pântano institucionalizado, apesar de nunca ter me faltado o substancial, tomo banhos rápidos sem usar a banheira, que me dói desperdiçar água e luz. E também porque não tenho banheira. No trânsito, acelero com reserva, que me mortifica esbanjar gasolina. E porque geralmente estou com o tanque na reserva.

Na verdade pouco importa se faço isto ou aquilo, se minha roupa é de marca ou não. O que me fez refletir é a imagem que passo ao comprar, desde produtos a serviços. Teve uma vez (não única) em que pedi uma peça específica, e a vendedora da loja me disse: “Ah, mas esta é bem cara!”.

Noutra vez, numa farmácia, questionei sobre um medicamento de uso contínuo, como substitutivo de outro que era barato, mas danoso. Adivinhem a resposta: “Mas este é bem caro!”.

O auge dessa maratona psicológica aconteceu na busca de tratamento de certa demanda dolorosa. Sendo várias as opções, sugeri a que me pareceu mais eficaz. E então o profissional argumentou: “Isso é muuuuito caro”.

Foi a gota d’água. Com a pulga atrás da orelha, fui pesquisar o tema. E – vejam só! – existe um estudo realizado pela Universidade de Toronto que concluiu que “a grana ou a falta dela acaba gerando marcas no rosto que são inconscientemente percebidas pelas pessoas”.

Não sei se concordo com essa interpretação porque múltiplos fatores contribuem para tatuar a cara da gente, mas, pelo sim, pelo não, daqui em diante vou apresentar o meu melhor sorriso ao buscar bom atendimento. Ao menos pra garantir o cafezinho.