No maior desafio de suas vidas, pequenas atitudes no dia a dia fazem o paciente sentir-se com mais energia e força de vontade para buscar sua melhora

Somente quem passa pelo tratamento contra o câncer de mama pode apontar as dificuldades vividas diariamente. Desde os enjoos constantes, cansaço, resultado das sessões de quimioterapia, a perda do cabelo, considerada por muitas, o momento mais difícil, até a aceitação. Entre todas as dores do tratamento, trabalhar a autoestima nessas situações pode ser um remédio infalível e peça fundamental no processo de recuperação.

Seja pela utilização de perucas, lenços ou bandanas, as pacientes em tratamento contra o câncer buscam, através desses acessórios, um meio de se sentirem mais belas e fortes para encarar de frente o desafio de superar mais um obstáculo. No entanto, o que é visto a olho nu, muitas vezes é apenas um pequeno pedaço de toda a situação enfrentada por essas mulheres.

Durante o curso, Édina aplicou a técnica em pele sintética, antes de iniciar os trabalhos em pessoas

Muitas delas, em decorrência da agressividade do tumor, precisam realizar a chamada mastectomia radical, que consiste na retirada das mamas como forma de prevenção. No lugar, uma cicatriz, que marca mais uma etapa da caminhada para vencer a doença. Com o intuito de amenizar a situação e devolver a autoestima das pacientes, Édina Lodi, micropigmentadora, designer de sobrancelhas e maquiadora, moradora de Garibaldi, viu através do seu talento, a possibilidade de ajudar quem precisa.

Com a técnica de micropigmentação, ela pode reconstruir a auréola do seio de quem teve câncer de mama. No local é realizado o redesenho da parte da mama perdida ou lesada por conta do procedimento cirúrgico. Uma soma que resulta em ajuda para quem precisou passar pela doença.

De acordo com Édina, a ideia em se capacitar para realizar este tipo de trabalho surgiu após ver várias mulheres que tiveram câncer de mama perderem parte da autoestima, em decorrência da retirada dos seios. “Muitas mulheres se sentem menos femininas e menos seguras de si ao se olharem no espelho, após a perda da mama, da auréola e através das cicatrizes deixadas pelo câncer”, revela.

Édina Lodi, micropigmentadora

Ela explica ainda que o trabalho é feito através da micropigmentação, que consiste em implantar (pintar) pigmentos na derme, assim como a tatuagem. “O pigmento é concentrado apenas na camada superior da pele. Na técnica usamos o efeito tridimensional para redesenhar as auréolas e mamilos das pacientes. A durabilidade é de mais ou menos um ano”, explica.

A jovem, que já concluiu o curso específico para o trabalho, ainda não começou com os atendimentos em Garibaldi. Ela aguarda ansiosamente a finalização do espaço onde pretende trabalhar e ajudar muitas mulheres a terem sua autoestima novamente elevada. “Gratidão enorme em saber que posso fazer a diferença na vida delas com a reconstrução de auréolas”, garante.

Cada paciente tem o seu tempo de aceitação

Autoestima. Palavra que pode ter uma força decisiva para quem está na luta contra a doença que, segundo estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca), deve atingir até o final do ano mais de 66,2 mil novos casos, o equivalente a uma taxa de incidência de 43,74 casos por 100 mil mulheres. Além de promover a melhor aceitação de cada nova etapa, o atendimento psicológico deve ter foco no fortalecimento de recursos internos do paciente, como a confiança e autoaceitação de seu atual momento.

A psicóloga Karen Mattiello Rovella, que trabalha com pacientes que seguem em tratamento contra o câncer em Bento Gonçalves, enumera os benefícios deste sentimento para quem está enfrentando a doença. Ela explica que manter a autoestima elevada é de suma importância durante o processo do tratamento oncológico. “Quando a mulher consegue recuperar ou não perder sua autoestima devido à perda do cabelo e outras mudanças físicas que o tratamento ocasiona, o enfrentamento se torna mais positivo e a capacidade de se adaptar (resiliência) à esta nova realidade se torna menos doloroso emocionalmente.

Mas segundo a profissional, não é tarefa fácil cultivá-la diante deste diagnóstico, tampouco durante o tratamento. É importante frisar que os pacientes não devem, em hipótese alguma, se culpar por terem dificuldades em manter sentimentos positivos. “O processo de aceitação na maioria dos casos é lento, pois quando falamos em mudanças tão significativas que um tratamento oncológico causa do corpo da mulher, precisamos entender que ela necessita lidar com não apenas uma, mas várias alterações em pouco espaço de tempo”, explica. “Vão desde a perda do cabelo, todos os efeitos colaterais da quimioterapia, radioterapia e também a possibilidade de se sentirem mutiladas quando há necessidade e mastectomia unilateral, bilateral ou total”, pondera.

Karen Mattiello Rovella, psicóloga

Conforme Karen, cada mulher tem suas próprias ferramentas para conseguir adaptar-se às adversidades que ocorrem. “Esse ‘tempo interno’ é diferente do tempo cronológico, do relógio. É imprescindível que possamos compreender isso e também respeitar o nosso tempo, elaborando todas estas mudanças sem pressa, se olhar com carinho, se acolher, e buscar ajuda quando se percebe não conseguir enfrentar sozinhas este momento”, observa.

Outro ponto fundamental para a recuperação dos pacientes que estão em tratamento contra o câncer de mama é, sem dúvida, o acolhimento. Não só o familiar e do círculo social mais próximo, mas de médicos, enfermeiros e demais envolvidos diretamente no processo de cura. “Durante o tratamento oncológico percebemos a ‘dor total’, ou seja, não é apenas o adoecimento do corpo físico que ocorre, mas também o psicológico, social e espiritual. Há a perda da fé, muitas vezes o diagnóstico de depressão e também o afastamento das atividades laborativas. O acompanhamento psicológico, neste momento, tem como principal objetivo oferecer um espaço de acolhimento e escuta para a partir disso está mulher possa se sentir capaz e preparada para ressignificar sua vida, sua existência”, garante.

Entre as dicas apresentadas, Karen aconselha que as pacientes compreendam que, apesar da situação, elas continuam sendo mulheres, com suas qualidades e personalidades. “O câncer é apenas uma fase da sua vida, ele não define você, mas pode auxiliá-la a olhar a vida de um ângulo diferente, e quem sabe mais especial? Pois através desta vivência você tem a possibilidade de se redescobrir como uma nova mulher”, afirma.