Terceiro milênio. Baratas, únicas sobreviventes do holocausto nuclear, deslizam pelos arquivos de aço buscando evidências às suas teorias. Uma barateca (barata de biblioteca) abre um volume empoeirado e lê alto:
-“Homem, do latim homine, significa qualquer indivíduo pertencente à espécie animal que apresenta maior grau de complexidade na escala evolutiva”.
O grupo gargalha em internês: kkkkkkkkkkk. A NERD aguarda um minuto e continua a leitura:
-“Também se define como o único animal mamífero de posição normal ou vertical, capaz de linguagem articulada, constituindo entidade moral e social” – completa a descendente da personagem de Kafka.
-“Posição vertical”? – exclama uma baratinha, já com as antenas apontando para a adolescência – Meu tatatatatatatatatatatatatatatatatata…
-Tá, tá, desembucha, minha filha! (Baratas velhas não têm muita paciência com “aborrecentes”).
-Bom, eu queria dizer que meu tatata…ravô contava que os homens viviam mais na horizontal que na vertical…
-É porque seu tatata…ravô morava num motel – retruca uma baratona, mostrando suas asas pintadas com mais de cinquenta tons de cinza.
-Tive um parente distante que foi pisoteado. Isso significa que os humanos ficavam de pé – deduz outra.
-Eles viviam sentados, numa boa! – garante uma barata tonta, referindo-se a certa classe de gente.
A mais crítica envereda para outros caminhos:
-“Entidade moral e social”? Fala sério! E ainda tinham o peito de cantar “É mentira da barata…”
-Bom, nisso estavam certos… Ou será que você usa sapatos de veludo, colega? – intervém a tonta.
-Chega de boataria! Vamos ao que interessa: classificar essa espécie bizarra que foi extinta por conta própria e nos deixou um Planeta árido, estéril, seco, improdutivo, solitário… tudo por arrogância, ganância, estupidez, irresponsabilidade, imbecilidade…
Com tanta negatividade – e radioatividade – alguns dos minúsculos cérebros começam a “viajar”… Então, uma barata saudosista tira lá, da cartola, um “clássico” de mil anos atrás e cantarola:
-“Caraca, ‘muleke’, que dia, que isso/ põe um pagodinho, só pra relaxar…”
-Que barato! – exclama outra, enquanto cheira algo parecido com inseticida. Gases se tornaram comuns depois da explosão.
De repente, um baratão de Itu, com raízes em Corumbá, cidade do Mato Grosso do Sul, Brasil, que também virou fumacinha, dá um rasante de matar de inveja às outras baratas. Afinal, não é qualquer uma que sabe voar! Autorizado pelo seu porte – tamanho de uma memorável lata de cerveja – o grandão determina qual é a verdade:
-Homem, ser obscuro dotado de massa cinzenta inútil, cujo macho só se ergueu nas patas traseiras para espiar a fêmea.
-E a fêmea? – pergunta uma baratinha precoce – Por que se ergueu?
E o baratão chauvinismo responde:
-Possivelmente para usar saltos.
As baratas gargalham. Apesar de tudo, a raça humana era mesmo engraçada!