A questão do fuso horário é complicada. Essa mudança mexe com o metabolismo, com o humor, com o sono, com a digestão, com tudo. A gente perde a noção de tempo, especialmente quando se faz várias conexões para chegar ao destino. É tipo ônibus pinga-pinga, numa escala maior. Se na ida, horas são tragadas pelos diferentes fusos, na volta, elas são devolvidas, o que parece tornar a viagem mais longa ainda.

Felizmente, no nosso caso, foram voos sem turbulência, com exceção da reta final: de Campinas a Porto Alegre. Dizem que o fenômeno é típico da colisão de duas correntes de ar, fria e quente, mas eu desconfio de que se trata de falta de manutenção das aerovias… Culpa do Bolsonaro, que não mandou fechar os buracos negros.  

Chegando em casa, passei dias com um pé em Nárnia, outro aqui. Pudera! Toda vez que ligava o ar condicionado, eram as turbinas do avião que estavam esquentando, e quando acionava o Air Fryer, dava-se a decolagem. Então fechava os olhos e me deixava levar pela sensação de estar nas alturas. Já a zona de turbulência aconteceu mesmo ao dirigir meu meio de transporte – ou o poder público ajeita os paralelepípedos acotovelados assimetricamente ou tenho de trocar os amortecedores do meu carrinho. O que não seria uma ideia totalmente maluca…

Voltando à viagem, não há como negar que Veneza é a cidade mais bela do mundo. Mas, mesmo num lugar tão especial, zoeiras acontecem.  Lembram quando falei da primeira lição, que era “não brinque com autoridades alfandegárias”? Pois a segunda emplacou com “não olhe para vendedores ambulantes, porque eles te fisgam e não te largam mais”.  

Pois então. Estávamos bebericando um cappuccino quando uma mulher imensa, ostentando uma tonelada de badulaques, percebeu a menina do meu olho pousada no azul de um colar. Ela veio com tudo, com seu sorriso grande, com sua simpatia desmedida e proposta indecorosa: quarenta e cinco euros. “No, no, no”, falei. De repente ela quis saber quanto eu pagaria. Ergui as duas mãos, pensando que a afastaria devido à discrepância de valores. Mas aquela figura bizarra permaneceu aí, baixando cada vez mais, até chegar aos dez euros que eu incautamente havia oferecido. Quando recusei – até porque as “pedras” eram de plástico – a simpatia dela virou agressão verbal.  No centro das atenções, fui socorrida pelo meu patrocinador, que “honrou a palavra”. A “terrorista” saiu resmungando alto e, com certeza, procurando outra turista ingênua pra aplicar o golpe.