Adotar uma pessoa é considerado um ato de amor. Também é uma alternativa para que crianças e adolescentes que foram negligenciados ou abandonados pelos pais biológicos, ainda tenham oportunidade de recomeçar e encontrar uma família disposta a dar afeto.

Em Bento Gonçalves, três adolescentes de dezesseis anos estão aptos para a adoção, apenas aguardando a chance de ter um novo lar. Enquanto isso, do outro lado, há 63 candidatos habilitados para realizar o processo de adotar, segundo a Assistente Social Judiciária, Cristina Rosa.

Com o número muito superior de pessoas que querem tornar-se pais de coração, fica o questionamento do porquê esses adolescentes continuam na fila de espera. É que, de acordo com Cristina, não há nenhum pretendente que aceite acolher o perfil deles. “O que inviabiliza, ao menos por hora, a colocação em família substituta por meio da adoção”, afirma.

Além dos adolescentes mencionados, também tem uma criança, de dez anos, em processo de tentativa de aproximação com uma possível família substituta. Entretanto, conforme Cristina, a pandemia do coronavírus tem tornado esse processo mais lento que o habitual.

Abrigo Institucional

O município dispõe de um serviço que oferece acolhimento provisório para crianças e adolescentes que estão afastados do convívio familiar, seja por meio de medida protetiva, por abandono ou porque os responsáveis estão temporariamente impedidos de exercer o papel de cuidado. Portanto, no Abrigo, encontram-se crianças e adolescentes que poderão retornar ao lar de origem ou, na impossibilidade, serão encaminhados para uma família substituta.

De acordo com a coordenadora da Proteção Social Especial, da Secretaria de Esportes e Desenvolvimento Social, Simone Menegotto, no momento em que são acolhidos, os menores de idade passam a residir no serviço por tempo integral. “Sendo assistidos com o cuidado e proteção necessária para o desenvolvimento saudável dos mesmos”, afirma.

Se por um lado as crianças e adolescentes querem apenas encontrar uma família para compartilhar amor, sem se importar com a idade, cor de pele ou demais características dos futuros pais, por outro, os candidatos habilitados para adoção, por vezes são muito seletivos quanto ao futuro filho, tornando o ato de adoção muito mais lento ou até impossível de acontecer.

De acordo com Cristina, crianças que estão na primeira fase de desenvolvimento, geralmente encontram vários candidatos interessados no processo. Porém, quando se trata de uma adoção tardia, não se localizam pessoas que aceitem esse perfil.

Outro fator que costuma causar dificuldades na hora da adoção é a questão racial, segundo Cristina. “A adoção inter-racial é um dos maiores entraves na adoção. Prova disto é que a minoria dos pretendentes aceita adotar crianças negras em Bento Gonçalves”, observa.

Sobre o assunto, Cristina afirma que a situação demanda que a comunidade repense posicionamentos, “quebrando barreiras do preconceito e de discriminação na formação de famílias multirraciais e multiculturais, se reeducando para a diversidade, neste território”, conclui.

Sob o ponto de vista psicológico

O psicólogo do Abrigo Institucional, William Turri, afirma que, embora o número de postulantes à adoção e também de crianças e adolescentes esperando por uma família continue em crescimento, ainda dá para perceber que a adoção no Brasil é um processo que define como sendo “delicado e complexo”.

Turri também destaca que o perfil e a idade seguem sendo grandes desafios para aqueles que poderiam ter um lar, mas que “pela idealização dos pretensos pais, permanecem em serviços de acolhimento institucional. A idade é o principal motivo causador de negativas como preferência daqueles que buscam na adoção uma forma de filiação”, frisa.

Referente a adoção tardia, Turri acredita que a principal resistência se deve pelo medo de adaptação de ambos os lados. “Muitos pretendentes acreditam que estas crianças e adolescentes carregam traços subjetivos para os quais não há possibilidade de manejo ou que não conseguirão lidar com questões que porventura tragam de suas experiências de vida, por serem maiores”, observa.

Embora o psicólogo acredite que cada caso precisa ser avaliado de forma individual, Turri também destaca na adoção tardia o medo da rejeição. “Tanto da criança quanto dos pretendentes à adoção, surge frequentemente. São diversos receios, mistificações e até mesmo preconceitos que precisam ser trabalhados, principalmente, antes que ocorram adoções tardias, para que se ampliem as chances de sucesso”, frisa.