Clacir Rasador

O outono é o vento que traz o perfume do inverno, que logo se aproxima. Pode até parecer poético, mas não para quem passou ou logo mais irá passar frio sob um teto de lona ou enxergando pelas largas frestas de uma casa de madeira.

Aliás, o astro-rei que me desculpe, mas não tenho lembrança alguma do dia em que mais experimentei o poder de seus raios.

Contudo, por outro lado, resta congelada, em minha memória, aquela madrugada gélida em um ônibus sem ar-condicionado, cortando os campos de cima da serra, pintados de branco geada pelas mãos da natureza – e isso que tudo era, literalmente, passageiro.

Mas, infelizmente, para muitas pessoas, essa realidade não é de passagem.

Casas precárias de madeira ou, ainda, pequenas barracas de fina lona, sem qualquer infraestrutura, se “encondem” entremeio à rala vegetação à beira da rodovia, rumo à vizinha Veranópolis, porém, ainda deste lado das Antas, na capital do vinho.

A história não escrita, mas sabida e contada pelos respeitáveis cabelos brancos, seja nos cafés mais caros ou nos botecos mais simples, revela que a omissão e, até mesmo, a vergonhosa estratégia politiqueira para angariar votos, “ergueu” “loteamentos” totalmente irregulares que, heroicamente, chegaram às margens das rodovias, pois alguns se esgueiraram barranco acima.

Esse espinhoso assunto, que fere a sociedade como um todo, mas, em especial, as pessoas que lá vivem, ou, melhor dizendo, sobrevivem, se trata, a meu ver, de um dos grandes desafios e prova de gestão pública responsável do Poder Público, em especial do Executivo, mas com imprescindível auxílio do Legislativo e Judiciário.

A propósito, sem a pretensão de invadir a demandada pauta legislativa, todavia, enquanto os vereadores corretamente se debruçam a estudar se a implantação de projetos hoteleiros milionários irão ou não descaracterizar o nosso original Vale dos Vinhedos, lá da outra banda da cidade, sem pedir qualquer licença ou alvará, casebres, pequenas palafitas secas, frutos de uma invasão à beira da rodovia, caracterizam sem dúvida um grave problema social ao olhar sem filtro, inclusive do almejado, concorrido e crítico bolso do turista.

A eventual falta de um plano estratégico em tais casos e/ou a demora em tratar o assunto logo nas primeiras formações em tais invasões,  diga-se, sempre tendo por foco a assistência social ao ser humano – jamais, no entanto, por meio da  política imperdoável e degradante do assistencialismo – não somente  fomentará novas invasões, bem como – não é de hoje – alimentará a criação de oportunistas, fake-defensores da causa dos mais necessitados, cuja solução simplista e irresponsável é ‘deixar assim’ para ver como fica o que já se sabe pior ficará.

Simplista, insensível e talvez hipócrita seja igualmente condenar a busca de novas oportunidades; que atire a primeira pedra quem não almeja um futuro melhor para si e para os seus.

Contudo, a cuccagna do progresso pendurado nas árvores que já foi provada pelos nossos imigrantes italianos se trata de mera e cara ilusão.

Sim, aos que necessitam de caridade, os valores Cristãos trazidos além-mar seguem enraizados, entretanto, a árvore da caridade não dará muitas colheitas por essas terras, se não for enxertada pela semente do trabalho, pois é esta que, provadamente, fez no passado e faz no presente, dignamente, o melhor futuro.