Cercado por comércios, vinícolas, parreirais e residências, o local mistura a comunidade e o turismo. Justamente por isso, as opiniões sobre melhorias são diversas e diferentes, como a questão do calçamento e da pavimentação asfáltica que gera debate entre moradores e empreendedores

Marcado por suas belas paisagens de parreiras sob montanhas, o local faz parte do Vale dos Vinhedos e conta com um turismo que cresce mais a cada dia que passa. Seus moradores são diversos; muitos cresceram no local e têm lembranças de quando o lugar era simples como qualquer outra localidade. O maior embate que ocorre na Capela é a discussão sobre o calçamento e o asfalto, onde alguns moradores preferem do jeito que está, já outros acreditam que a falta da pavimentação asfáltica prejudica.

Vanilda Gaspareto, 75 anos, é aposentada e cresceu lá. Ela ainda revela que, por estar acostumada com as paisagens, passa a não dar tanta atenção quanto as pessoas que vêm de fora. “O Vale é muito bonito, e acabamos não dando tanto valor, pois somos acostumados com as paisagens, mas quando os turistas vêm, parece que é o céu”, relata.

A aposentada relembra do local durante sua juventude. “Era muito diferente, tudo mato, menos pessoas, não tinha nada disso. Depois que veio o Vale e um começou a arrumar, e o outro também que foi ficando bonito assim. Mudou muito, gosto de como está, mas também de como era”, ressalta.

Nelci Ozelame, 68 anos, é aposentada. Por muitos anos morou em Bento Gonçalves, mas frequentava a localidade quase diariamente já que seus sogros eram de lá. Ela relembra como era. “Muito diferente, era estrada de chão. Minha sogra sofria com bronquite asmática e dizia que não teria a felicidade de ver o local com calçamento, mas felizmente ela pôde ver antes de partir”, rememora.

Nelci Ozelame conheceu o local antes e depois do turismo, por isso, ela avalia quais melhorias são necessárias


Para ela, o local deixa a desejar em alguns aspectos, principalmente no quesito do turismo. “Eles acabam pensando muito em pousadas, e esquecem de lugares onde as pessoas possam comprar comidas rápidas, como cafés… Muitas pessoas param aqui e perguntam onde podem pegar um café rápido. É necessário incrementarem mais na nossa região”, explica. Além disso, para os moradores, ela também acredita que não seja completo. “Não tem muitos comércios, só indo até a cidade. Outra coisa, tem muitas pessoas com mais idade, seria interessante ter um incentivo ao exercício físico. Para me exercitar, preciso ir para a cidade. Então, tudo o que preciso fazer, faço na cidade, e volto para cá. Temos salão, dá para alguém vir e dar aulas para nós aqui”, estimula.

Neida da Silva, 71 anos, é a avó de Simone da Silva, 18. As duas vivem lá há quase duas décadas. Para elas, a localização é especial: são encantadas pela beleza natural que há ao redor. Ambas falam sobre o impasse que ocorre no local. Quem concorda na obra de pavimentação asfáltica e quem prefere o calçamento como está. “Acredito que seria bom o asfalto, porque o calçamento estraga muito os carros e não fica tão bonito. Mas minha avó acredita que iria ficar mais perigoso porque os carros correm muito quando tem asfalto, e no calçamento eles não passam a tantos quilômetros por hora”, explica.

Simone da Silva ao lado da avó, Neida da Silva

Oportunidades no turismo

Paulo Ladandoski aprendeu e se encantou com a esposa a fazer doces típicos, como a uvada

Michele Carraro e o esposo Jorge Paulo Lavandoski tinham trabalhos costumeiros na cidade, moravam na Capela das Almas, mas se dirigiam à Bento, onde passavam o dia. Com o aumento do turismo na localidade e uma vontade de empreender, criaram o próprio negócio. “Nós fazíamos geleias e licores e vendíamos na safra da uva. E por meu pai ter o parreiral coberto aqui atrás, passavam muitos turistas e pessoas pela propriedade. Então, aos finais de semana, já que durante a semana trabalhávamos, produzíamos e vendíamos. A partir disso, as pessoas começaram a gostar muito do local e aceitar o produto”, pontua.

Mas até então, o casal apenas comercializava os produtos em casa, pois não havia um estabelecimento. “Um dia, chegou um senhor com um grupo de jipeiros e ele pediu se podíamos fazer cucas para eles, perguntando se eu sabia. Lembrei das cucas que minha avó fazia, e nesse dia surgiu a ideia de vender esses produtos que são tão tradicionais, carregados de afetividade, que era o que buscávamos com nossos outros doces”, assume.

Michele afirma que o turismo é muito importante para a região, mas que há necessidade de ser bem feito. “Acredito que o turismo teria que ser mais bem pensado, principalmente em termos de futuro, porque muda bastante, inclusive a caracterização do lugar. Muito próximo, cortaram um parreiral que era histórico, e não culpo o turismo. Acredito que falte planejamento. Deveria vir de outras instâncias para direcionar este crescimento”, observa.

Um líder nato

A história da família de Zelavir Giordani, no Brasil, iniciou na Capela das Almas, quando seus bisavós vindos da Itália, estabeleceram-se no mesmo lote em que ele vive até hoje. “É um local muito tranquilo, com ótimos vizinhos, uma comunidade próspera e empreendedora. Temos que trabalhar, assim como em qualquer outro lugar. Comentam por aí que o pessoal do Vale dos Vinhedos é rico, mas não é bem assim. Pura ilusão de quem pensa”, pontua.

Considerado um líder, muito fez para transformar o local, hoje reconhecido mundialmente. “Para isso acontecer, até um plebiscito foi realizado junto à comunidade para definir o nome: Vale dos Vinhedos ou Via Trento. Mas felizmente a opção foi Vale dos Vinhedos”, conta.
Ele é uma figura histórica do lugar, já que esteve desde o início da transformação daquela localidade no Vale. “Batalhei muito aqui com outros moradores para que na época virasse distrito; tinha Monte Belo e Santa Tereza que eram. Na época, dizíamos que éramos cachorros sem dono. Porque diziam em Bento que pertencíamos a Monte Belo do Sul, e lá vice-versa. Então nos reunimos e decidimos formar um distrito”, relembra.

Giordani, hoje, é um dos defensores da pavimentação asfáltica para melhorar o trânsito de veículos, pois o local é referência nacional no que se refere a destino turístico devido a gastronomia, suas vinícolas e belezas naturais. “Nossa luta continua, apesar de algumas pessoas serem contrárias. Estamos unidos em parceria com a Aprovale – Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos, que apoia e defende as iniciativas da comunidade”, reforça.