O primeiro encontro não deveria existir. É um saco. Um porre. Quase um momento de tortura, um interrogatório, uma prova do Enem, verdade ou consequência. As pessoas não se abrem, não demonstram como são realmente ou então se abrem demais, causando até constrangimento, porque eu não entendo de política, alguns números do Ibope são interessantes só para você, não parou para pensar nisso? E se não responder a certos questionamentos, vou parecer ignorante?

As pessoas que não se abrem por medo, parecem ser aquelas que mudariam pelo outro, que deixariam seus amigos e o gosto pelo futebol. As que deixariam seus sonhos de lado por um tempo ou para sempre. O fato de não se abrir quer dizer que não dá para ter ideia do que a pessoa gosta ou deixa de gostar, e ela faz questão de não mostrar. Vergonha? Medo? Pode ser que ela ache um primeiro encontro um tanto raso para isso, mas gosto de primeiros encontros regados a informações provindas de longas conversas, nas quais só a gramática, o bom humor e uma foto de perfil podem me fazer ficar interessada.

As que se abrem e, no entanto, querem se adequar a você, concordando com a maioria do que você fala ou não demonstrando aquela velha opinião formada sobre tudo, geralmente são aquelas que não vão querer nada sério com você. Elas querem mostrar o melhor que podem para conseguir o que querem: uma ou algumas noites sem compromisso. Elas não mostram como são verdadeiramente porque é mais complicado ficar esperando entender se o casal tem química ou não, se gostam das mesmas coisas, expor uma opinião e receber uma crítica construtiva, ou quem sabe afastar a crush por algo que disse. Isso tudo não faz parte do monólogo. É muito esforço, já está pagando o cachorro-quente.

Um encontro casual, no sushi ou no barzinho. Ele quer que ela escolha, ela diz que pode ser qualquer coisa, ele insiste, ela pede a bebida, ele finge que concorda. Depois de escolher a bebida e a comida, talvez brindem com a primeira taça. A próxima palavra é sempre uma expressão: “e aí…” “então…”. Aquele um minuto que a gente busca em todas as partes do cérebro um assunto pertinente e desenrolável, que nos valorize, torna-se uma hora. “Política não; trabalho, já falei que tá puxado – aliás, é minha desculpa preferida para não sair de casa; vou pedir sobre o dia dele…ou então se ele mora sozinho, mas e se ele achar que eu já estou pensando coisas pedindo is…”
– Você mora sozinha?
Ufa. E, droga!

A comida chega e eles degustam com a maior delicadeza. Às vezes a intimidade é um pouco maior e, comem com voracidade, rindo de suas manias e estômagos famintos. Eles têm muita coisa em comum – e tanta coisa diferente. Por fim resolvem ir embora, depois das piadas sem graça e da ficha mental quase completa. Se o beijo rolar, vai ser por praxe.

Às vezes não existe segundo encontro, nem segunda chance de analisar a gramática novamente. Simplesmente se desfaz às cinzas, como tudo o que Thanos toca. Será que meu dente estava sujo? Ou fui desclassificada por não saber que a taxa de desemprego subiu para 12,7% em março?