A produção doméstica em Bento Gonçalves enfrenta obstáculos climáticos e uso de agrotóxicos, mas a diversidade floral e a demanda crescente oferecem grande potencial de crescimento
No dia 20 de maio, é celebrado o Dia Mundial das Abelhas, destacando a relevância desses insetos para a polinização e a produção de alimentos.
O Brasil possui um clima diversificado e uma rica flora que, em combinação com a presença da abelha africanizada, oferece um grande potencial para a apicultura. Atualmente, a produção anual de mel no Brasil é de aproximadamente 41.594 toneladas. No entanto, com a exploração mais eficiente das floradas silvestres e das áreas disponíveis, essa produção pode ser significativamente aumentada, com a possibilidade de duplicar ou até triplicar os volumes atuais.
O Rio Grande do Sul foi responsável por 15% do total da produção de mel do Brasil, com nove mil toneladas produzidas no ano de 2022, segundo pesquisa mais recente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Das pouco mais de 100 mil propriedades rurais que se dedicam à apicultura no país, 37 mil ficam no estado. O valor da produção brasileira de mel é de cerca de R$ 1 bilhão.
No estado, a apicultura está passando por um processo de reestabilização da cadeia produtiva devido as últimas catástrofes. No ano passado, em torno de 10% da população de abelhas foi dizimada pelas enchentes. Em torno de 35 mil a 50 mil colmeias foram perdidas e a chamada florada de primavera foi comprometida. A tentativa de recuperação, com a florada de outono, foi afetada com as enchentes de maio de 2024.
A reestabilização requer a colaboração de todos os atores envolvidos: fornecedores de insumos, apicultores, entrepostos, instituições de ensino, entidades de classe, empresas, indústria e mercados. Um exemplo dessa iniciativa é o Projeto de Lei nº 27/2017, coordenado pela Secretaria de Agricultura, Pecuária e Irrigação (Seapi), que instituiu o Programa Estadual de Incentivo à Apicultura e Meliponicultura. Este programa visa desenvolver a apicultura no estado, oferecendo apoio aos produtores e promovendo práticas sustentáveis.
Importância das abelhas
As abelhas são fundamentais para a polinização de inúmeras plantas e flores, desempenhando um papel crucial na manutenção da biodiversidade. Além disso, elas produzem mel e própolis, produtos valiosos para a saúde humana. O consumo regular de mel e própolis fortalece o sistema imunológico e promove o bem-estar geral, contribuindo para uma alimentação saudável e apoiando práticas sustentáveis.
O papel fundamental dessas pequenas criaturas acontece nos bastidores do funcionamento do meio ambiente. Ao contrário de outros grupos de insetos, tanto as abelhas adultas, quanto suas larvas e pupas, alimentam-se exclusivamente de recursos florais. Por isso, para suprir sua necessidade alimentar, as abelhas visitam uma grande variedade de flores, colhendo o pólen (fonte de proteína) e o néctar (fonte de carboidratos para elas e de produção do mel nas espécies que o fazem).
As abelhas também são indispensáveis para a produção de alimentos. Mais de 3/4 das espécies utilizadas pelo homem na agricultura dependem da polinização para uma produção de qualidade e quantidade significativas. Elas auxiliam o cultivo das culturas de maracujá, melancia, acerola, melão, pêra, ameixa, pêssego, abacate, goiaba, tomate, café e canola. Até flores como os girassóis são altamente dependentes da polinização por abelhas.
Em Bento Gonçalves, a produção de mel é predominantemente doméstica, destinada ao consumo próprio. A falta de indústrias de beneficiamento limita a comercialização do mel localmente. Estima-se que existam cerca de 800 colmeias, divididas entre abelhas com ferrão e sem ferrão (meliponídeas). “A nossa escalada aqui de produção é pequena. É amadora, ou doméstica, apenas para um consumo próprio, nós não temos aqui nenhuma indústria de beneficiamento”, revela o Extensionista Rural, Neiton Bittencourt Perufo.
As principais dificuldades enfrentadas pelos apicultores incluem a intoxicação dos enxames por agrotóxicos, principalmente inseticidas organofosforados, e as condições climáticas adversas que afetam a coleta de néctar e pólen. O uso indiscriminado de agrotóxicos é outro problema grave, pois pode causar a morte de enxames inteiros. Produtos químicos, quando aplicados de forma inadequada, afetam a capacidade neurológica e de deslocamento das abelhas, contaminando os enxames e reduzindo a produção de mel. “As principal dificuldade enfrentada aqui pelos agricultores é a intoxicação de enxames por produtos, muitas vezes utilizados na agricultura. Estes são produtos que não têm registro para as culturas, principalmente inseticidas organofosforados que o pessoal acaba muitas vezes utilizando, e como a abelha pode voar até 3km, acaba se contaminando e levando para o enxame assim também matando o enxame”, conta Perufo.
O clima é um grande dificultador da produção de mel no município. Porém, segundo Perufo, dificilmente as pragas afetam os enxames. “Quase todas as espécies que temos aqui são adaptadas à nossa região. Então dificuldades ocorrem, quando acontecem eventos climáticos, o que dificulta a saída das abelhas para ir a campo. Dificilmente alguma praga exterminou enxames aqui. As abelhas são muito protetoras, possuem uma organização muito bem estruturada, elas conseguem evitar qualquer entrada de insetos, traças, formigas”, explica.
As instituições tentam alertar os produtores rurais que devem ter a conscientização de que a polinização das abelhas ajuda nas suas produções. “As pessoas que moram na cidade, eles devem ter essa ciência, na proteção e pela importância que as abelhas têm. Principalmente na produção de alimentos, sabemos que algumas frutas necessitam das abelhas para ter produção, isso ocorre devido a necessidade de polinização cruzada, que acontece com algumas plantas emitem flores masculinas e flores femininas e quem faz o transporte do pólen que está na flor masculina para o ovário que está na flor feminina é a abelha, as pessoas tem que se conscientizar sobre a grande importância desse ser vivo”, ressalta.
Manejo e Extração de Mel
O manejo adequado das colmeias é essencial para garantir a qualidade do mel. É importante que os apicultores utilizem equipamentos adequados, como macacão, avental, touca e álcool 70% para higienização das mãos e ferramentas. Durante a extração, 80% dos quadros devem estar operculados (cobertos por cera) para garantir uma boa colheita. Após a desoperculação, os quadros são colocados em uma centrífuga, onde o mel é extraído, filtrado e decantado para remover os resíduos de cera. O mel deve ter menos de 20% de umidade para ser considerado de alta qualidade.
Para promover a apicultura, iniciativas de educação e treinamento são fundamentais. A Emater oferece cursos em apicultura em seu centro de treinamento em Montenegro, e eventos também são realizados em colaboração com o Instituto Federal e a Embrapa. Essas atividades ajudam a capacitar novos apicultores e a disseminar práticas sustentáveis na produção de mel.
O mercado para produtos apícolas no Brasil é promissor, com uma demanda crescente por mel e outros derivados. A diversidade floral do Rio Grande do Sul, incluindo plantas como eucalipto, citros e outras frutíferas, contribui para a produção de mel de alta qualidade. No entanto, a ausência de agroindústrias legalizadas para a comercialização de mel na região de Bento Gonçalves indica uma oportunidade de mercado não explorada. “Existe uma demanda crescente por mel e outros produtos apícolas, pois temos um grande polo de consumidores na região”, conclui Perufo.