Habituados à rotina de escândalos, revelados a cada fase da operação Lava Jato – na qual os políticos são apontados como os principais transgressores – e após os escândalos que envolveram pelo menos duas das maiores empresas privadas brasileiras, ambas no ramo frigorífico: a JBS e a BRF, as quais, segundo investigações da Polícia Federal, desempenham o papel de protagonistas em fraudes alimentícias, muitos imaginaram que os ventos turvos da corrupção cessariam, ao menos temporariamente, no cotidiano brasileiro. Contudo, novamente fomos surpreendidos com o desfecho de novas irregularidades. Desta vez o epicentro do escândalo é a própria Bento Gonçalves, ou melhor, os estabelecimentos comerciais da Capital do Vinho.

Com desfecho digno de beliscão na pele de incrédulo, visto tamanha proporção do resultado da ação conjunta liderada pelo Ministério Público de Bento Gonçalves, foram apreendidas 20 toneladas de alimentos vencidos, impróprios para consumo ou sem procedência, em sua maioria carnes diversas, em vários mercados e pontos de venda da cidade. Se já é difícil mensurar a quantidade de carne removida em espaço físico, imagine combater a rede de falcatruas que possivelmente há tempos coloca produtos duvidosos no mercado. O resultado: três pessoas presas.

Claro que há a possibilidade de funcionários públicos e terceiros envolvidos, pois uma irregularidade dessa natureza não ocorreria sem esse concurso. Prova disso são os diversos relatos na manhã seguinte ao primeiro dia de operações sobre os “descartes” apressados de produtos possivelmente vencidos de redes supermercadistas para atrapalhar a ação da Promotoria. Um fiasco municipal. Mas desta vez será muito difícil que os empresários envolvidos possam argumentar, como muitos fazem na Lava Jato, terem sido “obrigados” a fazer parte da estrutura da corrupção ou seriam impedidos de algo.

Infelizmente, vive-se uma situação em que não se sabe em quem confiar. De positivo, verifica-se ser cada vez mais difícil que os crimes fiquem impunes. De negativo, além de toda a carga já exposta, fica a nova crise de confiança que o consumidor terá ao escolher produtos em gôndolas e açougues.

O prejuízo está consolidado. Agora, é fundamental que a questão seja tratada em sua devida dimensão. Os estabelecimentos de Bento Gonçalves precisam retomar a rota de credibilidade, dando tratos legais a quem cometeu crimes e irregularidades, mas salvaguardando os que fizeram (e fazem) o seu trabalho da maneira como determinam as regras sanitárias.