Há certo tempo debatem-se os contrastes de Bento Gonçalves. Se por um lado somos privilegiados, com uma beleza invejada pelo resto do continente, uma cultura rica em essência e profundidade, além sermos uma das cidades no topo da tabela de renda per capita, por outro, temos áreas periféricas com problemas complexos e cada vez mais entranhados. Bairros como Zatt, Eucaliptos, Conceição, Ouro Verde e Municipal têm sofrido severamente com ação de bandidos, dificuldades estruturais e de acessibilidade, além de terem características únicas, que afetam a aproximação com órgãos e entidades da cidade.

Entretanto, também há certo tempo comenta-se que o poder público tem falhado fragorosamente na área assistencialista. A pasta, com um dos menores orçamentos entre o secretariado municipal nos últimos 10 anos, é responsável por um leque gigantesco de atribuições, que vão desde a acolhida de pessoas em vulnerabilidade social, até a área de habitação e dignidade humana. E, sem surpresas, quando a demanda é excessiva, alguma coisa sempre fica desassistida.

Descer até o final da rua Lajeadense, ou mesmo à ponta extrema do bairro, é um desafio tanto para os nervos quanto para as pernas. Embora a via tenha recebido diversas obras de pavimentação e escoamento nos últimos quatro anos, bastam apenas alguns passos para um cenário completamente diferente. Em contraste com a imponente obra de uma vinícola ao fundo, entre o chão de terra batida e os incontáveis entulhos de lixo espalhados entre becos e paredes de madeira rudimentar, dezenas de pessoas dividem a fé entre uma intervenção do poder público e a calmaria da natureza, pois, a cada nova chuva, suas casas podem ser tomadas por esgoto e dejetos vindos do Arroio Pedrinho, há poucos metros de distância.

Não há como simplesmente abandonar cidadãos à sorte

Desde 2012 os moradores esperam para que um projeto, apresentado pelo ainda então governo de Roberto Lunelli (in memorian), saia do papel. A proposta consistia basicamente em recolocar estas pessoas em uma área mais elevada do bairro, em um local cedido pelo Executivo. Sete anos se passaram e, no dito terreno, apenas uma placa, jogada em meio a mata, sinaliza onde fora depositada a confiança na palavra da administração.

A assistência aos mais pobres, especialmente aos que se encontram em situação de miserabilidade, é uma obrigação e até um dever dos nossos governantes. Merecem elogios, assim, todas as iniciativas dos poderes públicos na área social, principalmente aquelas voltadas para matar a fome dos indigentes e criar condições para eles se inserirem no mercado de trabalho.
Isso, porém, deve ser feito sem demagogia e sem intenção de tirar proveitos políticos, mas, verdadeiramente, para atender as emergências resultantes de uma péssima organização social que enseja a existência de milhões de excluídos dos direitos básicos das pessoas, entre os quais o da moradia digna.

O caminho para um futuro socialmente mais justo para o nosso município começa sim, por maior desenvolvimento econômico e menor assistencialismo. Mas não há como simplesmente abandonar cidadãos à sorte. A política de assistência social bem executada e planejada possibilita a emancipação do sujeito, o torna capaz de se posicionar e dá autonomia, e isso, infelizmente, é raro de se ver.