Dia de pagamento é um dia muito especial. A gente não cansa de ficar tão feliz nesse dia, e olha que é todo o mês isso. Você ainda nem terminou de assinar o contracheque e já estufa o peito. Dia de pagamento é dia de ir retirar os ‘pila’ no caixa eletrônico no final do expediente, colocar o carro no estacionamento do shopping, ir no mercado comprar tudo aquilo que você nunca come para validar o estacionamento (mas não porque você não tem dinheiro para o estacionamento, é tudo uma desculpa em círculo vicioso). É dia de não se preocupar. De gastar todos os trocados da carteira sem mesquinhez. É cinco para estacionar, quatro para um chiclé, três para uma rapadura no sinal.

Olha, NADA por dois reais, muito barato.

Dia de pagamento é dia de pedir comida em casa ou sair, sem se preocupar. É dia de matar aquela vontade de comer sushi, pizza ou tacos. É dia de comprar aquela blusa que você viu na vitrine enquanto estava indo pagar uns boletos, porque pelos seus cálculos, vai sobrar.

Um dia depois do pagamento é dia de acordar e sentir-se rico, sem se preocupar. É dia de pensar o que faríamos com o salário se não tivéssemos contas. E se eu fugisse para as Bahamas? Nesse dia eu faço mil planos, e os primeiros cálculos entre crédito e saldo devedor, começam sutilmente a não bater.

Dois dias depois do pagamento é dia de somente viver, sem comprar nada e sem se preocupar. É um dia que simplesmente nos sentimos ricos e não precisamos gastar para saber disso. Somente respiramos com prazer, aquele ar que nos vem mais purificado, aquela sensação de carteira cheia. Aconselho a aproveitar muito bem esse dia.

Você ergue a cabeça e segue em frente, não porque é forte, mas porque não tem opção.

Três dias depois do pagamento é dia de pagar as contas, sem se preocupar. É dia de agradecer por ter como pagar sua casa, seu carro, seu alimento. Mas bem lá no fundo, confesso, fico pensando que entre pagar e não pagar, bem que eu poderia não precisar estar pagando NÉ. Dissipe esse pensamento logo e pegue a calculadora, pois aqueles cálculos devem estar muito errados.

Quatro dias depois do pagamento é dia de fazer o rancho, sem se preocupar. Dia de colocar comida na mesa, de reabastecer os armários, de trocar a esponja da pia, de voltar a usar amaciante. Aquele valor que ia sobrar simplesmente desaparece. Como a comida aumentou, não é?

Cinco dias depois do pagamento é dia de continuar pagando boletos, com certa resistência, mas sem preocupar. Dia de “esquecer” a marmita em casa e gastar R$40 em “potatche” para comer durante o dia. Adeus R$40 e adeus dieta.

Seis dias depois do pagamento é dia de se preocupar. Dia de sortear os últimos boletos, de descobrir como vai viver com R$80, dia de olhar no calendário e ver que há tão pouco tempo você era um magnata do petróleo. É dia de não se conformar que SÓ SE PASSARAM SEIS DIAS. Isso não sai da sua cabeça, mas você a ergue e segue em frente, não porque é forte, mas porque não tem opção.

Se você não se identificou com nada disso, você é privilegiado sim.