Na minha percepção, a década que sucedeu Os Anos Dourados foi a década dos Anos Desalentados. Sendo meio nerd e completamente desconectada do mundo da cidade grande, o que eu mais desejava era me integrar ao grupo das bad girls. Para isso, não media esforços.

A primeira coisa era conquistar uma vaga no famoso Livro Preto, onde se lançavam as advertências feitas às meninas mais populares. Mas por mais que tentasse, não conseguia sair do quadradinho imposto pelo colégio feminino interno. Enfim, acabei o curso ginasial sem ver meu nome “selado, registrado, carimbado, avaliado, rotulado” e, consequentemente, sem poder “voar”. Meu Planeta continuou sendo o “Plunct Plact Zum” das invisíveis.

Seguindo o curso normal da época, a vida me levou para o Curso Normal, hoje chamado de Magistério. Ao menos o uniforme seria mais audacioso. A saia plissada, azul-marinho, que arredondava as formas, seria substituída pela saia de machinhos, de cor cinza, que delineava a cintura e quadris. Para quem não tem know-how na área, explico: não se trata aqui de “pega machos”, e sim de “pregas macho”. Mas eram tempos de mudança, e muitos tons de cinza ficaram para trás, inclusive a saia e os sonhos infantis.

Já sem desejos de subversão, acabei subvertendo a ordem. Na verdade, em termos atuais, seria uma coisa tão ínfima, tão irrelevante que não mereceria nem um franzir de sobrancelha. Para os padrões da época, aquilo extrapolou os limites da paciência. Explico:

Um docente estava com dificuldade de ministrar sua aula por causa da indisciplina da turma. Éramos normalistas, em breve, professoras, mas com maturidade questionável. Então o professor queixou-se junto à diretora, que resolveu dar um jeito de uma vez por todas, com punição exemplar a três alunas – eu inclusa – com uma semana de suspensão.

Senti o peso da injustiça. Afinal, só havia feito uma perguntinha durante a tumultuada entrega dos testes escritos, cujas notas deixavam a desejar. Mas eu tinha consciência de que, bem no fundo, o questionamento ocultava uma pitada de malícia. Foi mais ou menos assim: “ Professor, uma prova semestral não deve incluir toda a matéria vista no semestre?” Uma “afronta” dessas, hoje, não faria nem cócegas na suscetibilidade dos professores. Já naqueles primitivos anos sessenta, a frase foi esquartejada, dissecada e teve o DNA analisado, revelando um verdadeiro atentado à dignidade do profissional.

Ao fim e ao cabo, tudo se resolveu. Com essa atitude drástica, a turma se aquietou, e o catedrático pode ministrar suas aulas tranquilamente. Se o fato tivesse sido minimizado, a pressão ia aumentar até o nível do insuportável, quando rompem as barreiras do bom senso, provocando um estrago geral.
É o que falta ao Brasil: punição exemplar.