1964. O Presidente JOÃO GOULART, que tinha acentuadas tendências de esquerda, presidia o país sucedendo ao demissionário Presidente JÂNIO QUADROS, um irresponsável. Foi eleito num fenômeno político qual BOLSONARO, mas que frustrou as expectativas da nação e mergulhou o país numa convulsão social gravíssima, incontrolável. BRIZOLA, Governador do Rio Grande, bradava por mais energia por parte de JANGO, divergia de seus métodos de gestão mas era solidário. A esquerda estava no poder mas não tinha o poder. Eu era jovem, 23 anos, de certa forma alinhado às elites de Bento com as quais eu convivia de forma feliz e realizada. Não gostava de ver a bagunça em que meu Brasil estava mergulhado, torcia por uma solução. Veio então o que eu chamo de “movimento revolucionário”, opinião minha, para equacionar o problema da convulsão social. Os militares, ao tomarem o poder, se respaldaram politicamente na Arena, partido de direita, hoje PP, e partiram para cima dos “bagunceiros” esquerdistas, “de quinta e luz alta”, como diria o Frizzo. A Arena deitou e rolou. Enquanto Tancredo Neves, (Avô do Aécio) e chegado às ligas camponesas, insuflava a esquerda também monitorada por estudantes (UNE) e lideranças sindicais, a direita da Arena, sugeria, denunciava, condicionava a ação dos militares. Essa ação política-militar semeava medo, eu tinha medo, porém o meu país voltou a ter paz, uma paz reprimida, imposta, mas uma paz.

Em 1969, fui candidato a Vereador pelo MDB, partido do meu avô, que era Getulista, Brizolista e Giorgista. Embora meus amigos fossem de famílias notoriamente de direita, pela condição familiar e por ter sido honrado pelo apadrinhamento do Deputado Aristides Bertuol e do médico Ervalino Bozetto, aceitei o convite. O convite da Arena veio 30 dias depois, lá no Posto Auto Motor (revenda Wyllis) onde eu trabalhava como técnico contábil. Já havia aceito o do MDB. Ganhamos a eleição na apuração da última urna, de Santa Tereza, dos trezentos votos fizemos 290, ganhamos a eleição por 240 votos. No MDB fiz 484 votos, o quarto mais votado. Na Arena, Darcy Pozza fez também em torno de 480 votos. Fato interessante é que entre eu e ele tivemos 480 votos anulados pois os eleitores votavam em CAPRARA-ARENA, e em POZZA-MDB. Éramos fisicamente parecidos, diziam. Esses votos nulos elegeriam outro vereador. Seis meses de exercício de Verança (gratuita, por determinação do movimento revolucionário) e, depois, o exercício do cargo de Secretário Municipal de Governo.

Um belo dia estava eu no meu Gabinete, que ficava à esquerda na frente da Prefeitura, dei uma espichada nas pernas, olhei pela janela e vi estacionar, em local proibido, um jeep do exército, ocupado por um motorista, um cabo e um Capitão. Estranho, pensei, voltei para o meu birô ao trabalho. De repente, batidas na porta, eu atendi e lá estava o Capitão com sua imponência, me comunicando que eu sofreria, por ordem do Ministério do Exército, Terceira Região, Porto Alegre, um inquérito militar. Ele me requisitou dois birôs, acesso ao banheiro e água, isso tudo na minha sala, quer dizer, minhas ações passariam a ser monitoradas. Começaram a trabalhar e, eu, a não trabalhar mais, não dava. Eles tinham uma lista de 40 lideranças da cidade para ouvir no inquérito, que durou 47 dias. Uma coisa inacreditável, pensava “onde foi que eu errei”? Eu era um rapaz querido, simpático, com muita opinião própria (havia controvérsias), coisa de Sagitariano, mas, vem cá “sai de minha aba Capitão”! Foi assim o meu inferno zodiacal. Como “quem não deve não teme”, fiquei firme, porém angustiado, pesaroso. Finalizado o inquérito, que contou com minha assessoria e interesse, o Capitão me chamou e disse, simplesmente: “olha Doutor, conclui o inquérito, vou dar o meu parecer e devo lhe dizer que ele vai lhe inocentar, não constatei nada desabonatório ou contra os interesses a segurança nacional e, mais, vou indiciar os delatores”. E começou a me mostrar as peças do inquérito, sem mostrar os depoimentos das lideranças, não sem antes dizer: “não costumo fazer isso”. O meu carisma de bom rapaz havia conquistado o Capitão “sempre chove na horta das pessoas de bem”. O Ministro BUZAID (o terrível), com base em alguns recortes do Semanário (não mandaram o jornal inteiro, só recortes) determinou o fechamento do Jornal e a cassação dos direitos políticos por 10 anos. E enviou o despacho para o Ministro do Exército para a execução. Este, respondeu ao Ministro que “não era autoridade dele resolver pela cassação e sim do Exército, ato que deveria ser precedido por um inquérito militar”. E assim se fez.

O Moro do mal (Buzaid) se ferrou e eu me safei. E lá se foi o Capitão, com minha benção, não dei a ele umas garrafas de vinho, como é do meu estilo, com medo do “alto lá, esteja preso por tentativa de suborno”. Tempos depois veio a sentença do Juiz Militar de Porto Alegre: “ABSOLVIDO”, “com méritos”, a observação é minha porque meus acusadores haviam sido denunciados talvez por danos a honra e dignidade do réu. Estou me lembrando agora dos meus tempos de criança quando eu disparava: “Bem feito”! “Bem feito”! “Bem feito”! Não sei se disse ou pensei. A partir do inquérito, injustiçado, os meus cabelos brancos, que eram um ou outro e eu arrancava com uma pinça, floresceram todos. Hoje estão modernos, alinhados, pois até elas estão pintando o cabelo de branco num modismo que eu não gosto. Desse inquérito e absolvição, veio a inacreditável “folha positiva negativa”. Eu fui, tempos depois, buscar uma negativa para me habilitar ao concurso de promotor público e me deram a tal da certidão “negativa positiva”, na qual constava que eu havia sofrido um inquérito militar mas havia sido absolvido. Minha incomodação com isso não parou por aí mas eu me confortava ao lembrar que “a minha era positiva-negativa” mas a deles (delatores) também.

Sobre o assunto é bom lembrar que, na Argentina, dois ex Presidentes da Ditadura estão na cadeia e que através do “movimento da Praça de Maio”, mães e avós ainda estão procurando filhos e netos desaparecidos. No Brasil, militares e, militantes da esquerda terrorista, foram anistiados pelo Congresso que representa o povo brasileiro. Polêmica inútil se o Exército festeja o movimento ou se Dilma festeja o fato de ter sido assaltante e terrorista e não ter sido presa, ninguém vai ser punido. O Exército agora fez a coisa certa. Participa, colabora, monitora de perto e deixa claro, ao menos pela palavra do General Eduardo José Barbosa, que o “inimigo” é o Supremo Tribunal Federal, “Ditadura de Toga” sentenciou. Dei uma parada, olho para fora, vejo o vale do meu Barracão, vejo su lá Pinta (P. Bandeira), o Vale Buratti, todos encobertos pelas nuvens brancas do mau tempo, volto para a Gabrielle, vejo que está “chorando” pelo meu drama pessoal. Mas eu brado para os meus botões: “Deus é nosso Pastor, nada nos afetará, somos do bem, tamo junto”. Bye.