Em 2017, a Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher (Deam) realizou a instauração de mais de 900 inquéritos e encaminhou mais de 1 mil para o Poder Judiciário. Mesmo com o número reduzido de efetivo, os números são positivos.

De acordo com a delegada titular da Deam, Deise Salton Brancher, há um empenho muito grande da equipe para os resultados. Ela comentou, ainda, a efetividade da Lei Maria da Penha e das medidas protetivas. Confirma os principais trechos:

Jornal Semanário: Quais foram os principais resultados obtidos pela Delegacia da Mulher em 2017? Como foi o trabalho?
Delegada Deise Salton Brancher: Nós tivemos cerca de 1,3 mil ocorrências aproximadamente. Metade delas registradas aqui e a outra metade no plantão (na Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento), porque a Deam só funciona em horário de expediente. Instauramos 961 inquéritos, e encaminhamos para o Fórum 1032 inquéritos. Foram realizados 49 mandados de busca e apreensão, com oito armas apreendidas, além de 12 prisões efetuadas. São números próximos aos de 2016, então as estatísticas se mantêm.

JS: O número de inquéritos encerrados é significativo. Que avaliação é possível fazer desse número, até por problemas como falta de efetivo enfrentada pela Polícia Civil?
Deise: Contamos com uma equipe bastante engajada. Temos três policiais e cinco estagiários. Então, quando a equipe está bem engajada, conseguimos ter bons resultados. Com as dificuldades que enfrentamos, conseguimos prestar o melhor serviço possível nas condições que temos, ainda que não seja o ideal.

JS: Em relação aos cumprimentos de mandados, eles se relacionam a que tipos de crimes?
Deise: Normalmente, quando a mulher informa que o indivíduo tem arma de fogo, e que ela está ilegalmente na posse do acusado, pedimos esse mandado de busca, para apreender a arma, encaminhar ao Poder Judiciário e responsabilizar o indivíduo pela posse ou porte ilegal.

JS: Qual a importância das ações conjuntas da Deam com as outras delegacias de Polícia Civil aqui em Bento, que ocorrem com frequência?
Deise: Também por isso conseguimos bons resultados, por conta desse trabalho em equipe. Tanto nós colaboramos com eles, quando há mandados de investigações de outros crimes, como roubos, homicídios e tráfico de drogas, como eles colaboram conosco quando temos a necessidade de demanda. Em algumas ocorrências, é preciso ter uma equipe maior.

JS: Como é o trabalho em conjunto com a Brigada Militar?
Deise: Também contamos com o apoio da Brigada Militar. A patrulha Maria da Penha sempre nos apóia quando solicitamos essa parceria, que é extremamente importante. Até porque a Brigada Militar também integra a rede de enfrentamento à violência doméstica e familiar. Para tentar frear esse ciclo de violência, a lei previu a criação dessa rede, com órgãos que atuam em conjunto. Assim, não fica cada um fazendo seu trabalho. Todos pensam no resultado final e na necessidade de reduzir os índices de violência e, também, de conscientizar a população. Nesse trabalho entram órgãos como a Defensoria Pública, o Poder Judiciário, o Ministério Público, o Instituto Geral de Perícias, a Brigada Militar, a própria Polícia Civil, e até o Conselho Tutelar, em ocorrências com crianças e adolescentes. É uma atuação em grupo.

JS: E como é a atuação com os demais órgãos?
Deise: Com o Ministério Público e o Judiciário, por exemplo, não temos como atuar na parte de execução de tarefas, porque não é atribuição. Mas claro que o trabalho de rede é feito. No momento que temos um caso grave, por exemplo, sei que posso contatar o Revivi (Centro de Referência da Mulher que Vivencia Violência) e falar sobre o caso, para que as coisas corram com celeridade. Esse também é um trabalho de rede importante.

JS: Que avaliação é possível fazer da efetividade da Lei Maria da Penha, passados mais de 10 anos de sua criação?
Deise: A avaliação é extremamente positiva, porque a Lei Maria da Penha permite que a mulher não apenas se reconheça como sujeito de direitos, como ela exerça esse direito. Não adianta nada ter esse direito, se não tiver instrumentos para poder exercê-lo. A lei garante que a mulher seja livre, tenha dignidade sexual. Mas se há alguém que impeça isso, e não há um instrumento legal para fazer cessar essa violação de direitos, nada adianta. Então a Lei veio como um instrumento de exercício de direitos. E isso é extremamente importante.

JS: Discute-se muito a eficácia das medidas protetivas. Qual a sua opinião?
Deise: As medidas protetivas são eficazes, porque na maioria dos casos os homens atendem a ordem judicial e se afastam. Quando ela for ineficaz e o homem não obedecer, a própria lei já diz qual o caminho: a prisão preventiva. Então eu não vejo motivos para dizer que ela não seja eficaz.

JS: Temos, aqui em Bento, casos de medidas preventivas descumpridas?
Deise: Com certeza, há homens no Presídio Estadual de Bento Gonçalves (PEBG) por descumprimento de medidas protetivas. Não sei dizer exatamente quantos são mantidos presos. Por exemplo, temos 12 prisões feitas nossas em cumprimentos de mandados, mas há outras feitas em flagrante pela Brigada Militar (BM). Os números em relação às prisões são diretamente com a Superintendência de Serviços Penitenciários (Susepe) e a administração do Presídio.

JS: Em relação a crimes como estupro, é uma preocupação constante da Deam. Como é o trabalho de prevenção e repressão nesses casos graves?
Deise: A atribuição da Delegacia da Mulher não se restringe à Maria da Penha, ao âmbito doméstico e familiar. Atuamos, também, nos crimes sexuais contra a mulher. Temos vários casos e números consideráveis. A minha preocupação no sentido de ter pouco efetivo é justamente essa, já que para poder trabalhar em crimes graves eu preciso de pessoas focadas nesse tipo de delito. É preciso ter uma atenção especial diante da vulnerabilidade que a vítima se encontra. Não tenho como praxe divulgar ocorrências, até porque a Lei fala que crimes sexuais correm em sigilo. Toda vez que se noticia esse tipo de fato, causa um trauma para a vítima.

JS: Outros delitos também são investigados?
Deise: É importante frisar que temos investigado delitos de pedofilia. Indivíduos que aliciam ou mesmo possuem em seus computadores imagens de crianças em cenas pornográficas. A dica é para os pais tomarem cuidado, olharem as coisas de seus filhos. É necessária essa supervisão, porque é muito grave. Depois que crianças e adolescentes têm suas intimidades divulgadas para o mundo inteiro via rede mundial, para reconstruir auto-estima daquela pessoa é muito difícil.

JS: Existem investigações em Bento sobre isso?
Deise: Sim. E quaisquer informações que as pessoas tiverem a respeito disso podem procurar a Delegacia da Mulher, se identificando ou por meio de denúncia anônima. E essas investigações já apresentaram resultados. Estamos dependendo de provas periciais. Enquanto não temos as provas, tratamos como suspeitos. Após isso, podemos ter acusados efetivamente.

JS: Nas últimas entrevistas, tanto o delegado Arthur Hermes Reguse (titular da DPPA) quando a delegada Maria Isabel Zerman (titular da 1ª DP) apontaram a necessidade de criação de uma Central de Polícia em Bento. Qual a importância isso teria para a Deam?
Deise: O plantão policial não tem estrutura física adequada para atender violência doméstica e familiar ou crimes sexuais. Aqui também não atendemos todas as estruturas necessárias, mas já é muito melhor. Temos o espaço individual para atendimento às crianças, entre outras. Realmente, uma central de Polícia agregaria qualidade ao procedimento e traria mais dignidade para as vítimas.