Um dia perfeito pressupõe uma noite perfeita, não é verdade? Nem sempre! Talvez as forças do Universo puxem o freio do prazer para que o equilíbrio das emoções mantenha a humanidade na linha.

Mas vamos ao ponto. Benício, orgulho da vovó (papai e mamãe não são isentos pra falar), em sua independência de dar inveja aos marmanjos, não quer ajuda para nada, a não ser um eventual “colinho” para alcançar algum objeto guardado estrategicamente no alto das prateleiras.

Sabe tudo este meu xodó. De super-heróis a dinossauros. De submarinos a helicópteros. De ataques a resgates. De verdades a mentiras. E, obviamente, do Grêmio campeão ao Inter perdedor.

Diferentemente de mim que, com quatro anos, só reconhecia a cara feia dos adultos quando fazia xixi na cama.

O baixinho não coleciona medos. Já eu, além dos pavores infiltrados no meu inconsciente pela indução consciente dos adultos, ainda ficava remoendo o Pai Nosso, oração obrigatória desde a tenra idade, com medo do tal “mala” de quem a gente tinha que se livrar. E, paradoxalmente, só quando me desfiz daquela bagagem irracional, é que descobri que o velho do saco existia mesmo.

Dito isso, vamos à noite que precedeu o dia incrível em que meu netinho aprendeu até a limpar o bumbum com perfeição.

Dez e meia. Todos na cama, com uma lassidão gostosa apagando os sentidos – nada como uma taça de vinho pra relaxar. Às onze, o pai roncava, a mãe ressonava, e o filho dormia. O único ser vivo acordado era um pernilongo sedento, que seria responsável por outra lesão alérgica no baixinho.

Silêncio absoluto. Só o tempo fazendo inaudível tic-tac… Às três da madruga, hora maligna, uma melodia insana vinda de longe acordou o pai, que logo percebeu que não era de tão longe assim…

Saía das paredes do quarto dos brinquedos. A mãe também acordou. Ambos arregalaram os olhos. Mudos de espanto, ergueram-se na cama que nem suricatos e assim ficaram até a “coisa” parar de cantar com sua voz medonha. Parece que só pegaram no sono quando a claridade começava a abrir frestas no céu.

Ouvi dizer que, no dia seguinte, todas as tralhas falantes passaram pelo raio X do casal. E as pilhas retiradas. Mais uma noite dessas, e teriam que chamar o padre Quemedo.